Entrelaçar a música urbana ao cancioneiro brasileiro, apimentando a mistura com elementos da cultura baiana raiz e tecnologias sonoras como samplers e loops. Esse é o mote da obra da cantora, compositora, instrumentista e produtora Livia Nery.
Nascida em Salvador, Lívia cresceu num ambiente em que a música era um entretenimento familiar. “Meus pais eram do interior da Bahia e não havia músicos profissionais na família, mas ouvíamos muita música bacana. Meu pai gostava de Fagner e dos músicos cearenses. Ele também tinha um gravador de fitas e registrava a gente cantando em casa. Já minha mãe gostava de Villa-Lobos. Além disso, ouvíamos os baianos Caetano Veloso, Gilberto Gil, Moraes Moreira, Gal, músicos afros da Bahia, Olodum… E também músicas do carnaval de Salvador e a cantoria do interior baiano. Foi realmente uma miscelânea sonora”, relembra Livia.
Apesar de ter realizado iniciação musical e estudado piano ainda criança, Lívia mergulhou no universo musical mais tarde, após se formar em jornalismo e atuar em rádios. Criou um grupo e se apresentou em inúmeros espaços culturais da sua região. “Foi uma bagagem muito importante na minha trajetória, pois ganhei a noção de como atuar no palco e me relacionar com o público. Também aprendi a criar minhas composições e desenvolvi meu estilo de tocar agregando elementos sonoros, como o uso dos samplers e loops que deixavam minha música diferenciada naquela época”, conta.
Seu primeiro EP, “Vulcanidades” (2017), teve a produção assinada por ela e Rafa Dias (ÀTTØØXXÁ), e foi reproduzido como um trabalho singular, além de lhe render o prêmio de melhor intérprete feminina do Prêmio Caymmi daquele ano. “Vulcanidades teve um feedback muito positivo. A faixa título é uma das minhas canções mais acessadas até hoje nas minhas plataformas e no meu Youtube”, diz.
O passo seguinte foi o álbum de estreia “Estranha Melodia” (2019), que recebeu elogios e proporcionou uma reverberação ainda mais ampla de crítica e público. Produzido por ela e pelo conhecido músico e produtor paulistano Curumin, o álbum foi gravado no Red Bull Studio, em São Paulo e lançado pelo selo do BaianaSystem, a primeira edição fonográfica do coletivo. Na trajetória artística de Livia Nery, a obra ergue a bandeira da música como condutora das viagens da artista.
“Antes de iniciar as gravações, eu já tinha algumas conexões em comum com o Curumim. Meus amigos, Russo e Tatiana já trabalhavam com ele. Nesse caminhar, enviaram algumas faixas minhas para ele escutar. Em 2018, fui para São Paulo e quando tive a oportunidade de encontrá-lo pessoalmente ele já conhecia minhas músicas e tinha uma ideia do meu trabalho. Então, ele topou assumir a produção, mas no frigir dos ovos a gente produziu junto. Pparticipei minuciosamente de todo o processo das gravações, da mixagem etc.”
Em busca de sua assinatura artística, Lívia já mergulhou em laboratórios e investigações em projetos como PULSO, uma residência artística na Red Bull Station, e Super Violão Mashup, no qual assumiu, ao vivo, a manipulação eletrônica de um violão em projeto no Oi Futuro.
Como produtora, trabalhou com Letrux e Luisão Pereira. Em 2021, produziu o disco do seu conterrâneo Ronei Jorge, “Irmã”. No palco, já passou por espaços e festivais prestigiados como Coquetel Molotov, Festival Radioca, Circo Voador e projeto Coro de Rua. Outra faceta sua é a atuação como mentora artística, conduzindo oficinas de loop station, Produção Musical em Ableton Live e Live PA, a maioria delas com recorte de público-alvo de mulheres cis e pessoas trans.
Atualmente, Lívia juntou forças com o grupo instrumental baiano Bagum e com o rapper Vandal para um show conjunto da música contemporânea soteropolitana para diferentes regiões do país.
Confira a entrevista completa no Podcast MPB Unesp.
Crédito da foto: Alan dos Anjos