Aline Vessoni e Fabio Mazzitelli
No Artigo 153 da Constituição Federal de 1988, que versa sobre sete impostos cuja instituição é de competência da União, o único que não saiu do papel, pois em mais de três décadas nunca foi regulamentado, foi o imposto sobre grandes fortunas. O IGF, como é mais conhecido por quem estuda a matéria, voltou à pauta na campanha presidencial do ano passado, puxada pelo programa apresentado pelo então candidato Ciro Gomes, e hoje faz parte, mesmo que de forma tímida, do xadrez discutido em torno da reforma tributária, anunciada como prioridade pelo governo Lula na área econômica.
Sociólogo, o professor José Murari Bovo, da Faculdade de Ciências e Letras do câmpus de Araraquara (FCLAr), tem entre os seus temas de pesquisa o federalismo fiscal e é um conhecedor do contexto de injustiça tributária que existe no Brasil, país em que o consumo é mais tributado do que a renda ou o patrimônio. No atual cenário de aprofundamento do debate sobre qual seria a melhor reforma tributária para o país, apesar da previsão constitucional, o IGF não é o caminho mais indicado para alcançar maior equidade tributária, segundo o docente, que defende uma saída mais próxima ao bordão usado pelo ministro da Fazenda Fernando Haddad: “pobre no orçamento e rico no Imposto de Renda”.
“Não sou a favor porque há muitos problemas para a criação do IGF, entre eles, por exemplo, o potencial da arrecadação, que é muito pequeno”, diz Bovo, defendendo a instituição de mais faixas de alíquotas no Imposto de Renda. “A melhor alternativa é você taxar progressivamente o patrimônio e a renda das pessoas via aumento das alíquotas do Imposto de Renda. O número de alíquotas é muito pequeno hoje e não atende ao princípio da progressividade”, afirma o professor ao podcast Prato do Dia.
Além de mudanças no Imposto de Renda, Bovo entende também que há espaços para a aplicação da lógica da progressividade em tributos sobre o patrimônio, como o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD), que incide sobre heranças e doações. Ressalta ainda que dois pontos são “fundamentais” para o sucesso de uma reforma tributária: a redução das alíquotas de impostos indiretos, como o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), e um projeto de retomada do crescimento econômico do país.
Nesta quinta-feira, 2 de março, o IBGE divulgou o resultado do PIB (Produto Interno Bruto) de 2022, que ficou em 2,9% no ano. No quarto trimestre do ano passado, entretanto, o PIB ficou negativo (caiu 0,2%), um indicador de desaceleração da atividade econômica. “É imprescindível que qualquer mudança do sistema tributário seja acompanhada por um projeto de retomada do crescimento econômico do país. Porque aí você tem o aumento da renda nacional, o aumento de emprego, você tem uma economia crescendo e tem mais o que tributar. Fazer uma reforma tributária numa situação de desaceleração ou de redução de crescimento é complicado”, frisa José Murari Bovo.
A íntegra desta edição do Prato do Dia, disponível na mídia abaixo, pode ser ouvida também na plataforma Podcast Unesp, bem como nos tocadores Google Podcasts, Spotify e Deezer.