Reforma tributária deveria ser acompanhada de retomada do crescimento econômico, diz José Murari Bovo ao podcast Prato do Dia

Para estudioso do sistema tributário, melhor caminho passa por deixar de lado taxação de grandes fortunas e criar maior número de alíquotas progressivas em impostos sobre renda e patrimônio, além de simplificar a tributação sobre o consumo.

No Artigo 153 da Constituição Federal de 1988, que versa sobre sete impostos cuja instituição é de competência da União, o único que não saiu do papel, pois em mais de três décadas nunca foi regulamentado, foi o imposto sobre grandes fortunas. O IGF, como é mais conhecido por quem estuda a matéria, voltou à pauta na campanha presidencial do ano passado, puxada pelo programa apresentado pelo então candidato Ciro Gomes, e hoje faz parte, mesmo que de forma tímida, do xadrez discutido em torno da reforma tributária, anunciada como prioridade pelo governo Lula na área econômica.

Sociólogo, o professor José Murari Bovo, da Faculdade de Ciências e Letras do câmpus de Araraquara (FCLAr), tem entre os seus temas de pesquisa o federalismo fiscal e é um conhecedor do contexto de injustiça tributária que existe no Brasil, país em que o consumo é mais tributado do que a renda ou o patrimônio. No atual cenário de aprofundamento do debate sobre qual seria a melhor reforma tributária para o país, apesar da previsão constitucional, o IGF não é o caminho mais indicado para alcançar maior equidade tributária, segundo o docente, que defende uma saída mais próxima ao bordão usado pelo ministro da Fazenda Fernando Haddad: “pobre no orçamento e rico no Imposto de Renda”.

“Não sou a favor porque há muitos problemas para a criação do IGF, entre eles, por exemplo, o potencial da arrecadação, que é muito pequeno”, diz Bovo, defendendo a instituição de mais faixas de alíquotas no Imposto de Renda. “A melhor alternativa é você taxar progressivamente o patrimônio e a renda das pessoas via aumento das alíquotas do Imposto de Renda. O número de alíquotas é muito pequeno hoje e não atende ao princípio da progressividade”, afirma o professor ao podcast Prato do Dia.

Além de mudanças no Imposto de Renda, Bovo entende também que há espaços para a aplicação da lógica da progressividade em tributos sobre o patrimônio, como o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD), que incide sobre heranças e doações. Ressalta ainda que dois pontos são “fundamentais” para o sucesso de uma reforma tributária: a redução das alíquotas de impostos indiretos, como o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), e um projeto de retomada do crescimento econômico do país. 

Nesta quinta-feira, 2 de março, o IBGE divulgou o resultado do PIB (Produto Interno Bruto) de 2022, que ficou em 2,9% no ano. No quarto trimestre do ano passado, entretanto, o PIB ficou negativo (caiu 0,2%), um indicador de desaceleração da atividade econômica. “É imprescindível que qualquer mudança do sistema tributário seja acompanhada por um projeto de retomada do crescimento econômico do país. Porque aí você tem o aumento da renda nacional, o aumento de emprego, você tem uma economia crescendo e tem mais o que tributar. Fazer uma reforma tributária numa situação de desaceleração ou de redução de crescimento é complicado”, frisa José Murari Bovo.

A íntegra desta edição do Prato do Dia, disponível na mídia abaixo, pode ser ouvida também na plataforma Podcast Unesp, bem como nos tocadores Google Podcasts, Spotify e Deezer.