“A vida é arte do encontro”, já dizia Vinicius de Moraes em “Samba da benção”, um de seus maiores sucessos. Esses encontros que mudam vidas podem envolver outras pessoas, mas também os próprios talentos, potenciais e vocações. Para a argentina Xime Monzón, a parceira que proporcionou esse encontro transformador foi a gaita.
“Nasci numa família de músicos, meu pai tocava violão e tinha uma banda. Desde pequenina eu cantava com ele, mas de forma espontânea e sem ambições profissionais. Já adulta, eu cantava numa banda, e um músico me disse para tocar algum instrumento. Quando ouvi a canção “Karma Chameleon”, do cantor inglês Boy George, pirei no som da gaita. Decidi ir atrás do instrumento”, lembra. “Por volta de 2006, quando disse ao meu pai que queria ser gaitista, ele questionou. Disse que era muito difícil e tal, mas eu insisti. Comecei a estudar gaita aos 27 anos, com os gaitistas Pablo Brotzman e Adrian Jiménez. Desde então, tenho uma relação especial com esse instrumento. A gaita me proporcionou a profissionalização musical e turnês pela Europa, entre tantas outras coisas lindas que ocorreram em minha vida”, diz ela.
Xime conta que sua formação musical era bem diversificada, passeando pelo bolero, chamamés, tango e rock, entre outros estilos. À época, o blues não fazia parte do seu cotidiano. “Certa vez, meu professor Pablo Brotzman me deu um CD com gravações de diversos artistas de Chicago. Havia Muddy Waters, James Cotton e tantos outros grandes nomes da gaita no blues. Achei fantástico, fiquei encantada, e comecei a me aprofundar no blues.”
Transitar por esse universo musical sendo mulher foi um desafio, ela relata. “Trata-se de um cenário onde a grande maioria é formada por homens. Tive que ir abrindo meu caminho, me posicionando, me apresentando em locais importantes. Entretanto, tem algo interessante nisso. Por si só, o fato de ser uma mulher tocando gaita já chama a atenção. Sinto que as pessoas reagem assim: ‘Opa, tem algo de diferente ali no palco’. Hoje, temos várias garotas tocando gaita, mas, sem dúvida, eu abri espaço para novas meninas também conquistarem seus lugares. Recebo muitas mensagens de homens e mulheres que elogiam e acompanham meu trabalho, mas vale destacar que tudo é resultado de muito estudo e força de vontade.”
Seu forte vínculo com o Brasil se estabeleceu por meio de outro grande gaitista: Flávio Guimarães, músico do grupo Blues Etílicos. “Certa vez, recebi um convite do Flávio, que considero um dos maiores gaitistas de blues, para realizarmos um show e um workshop de bate-papo com o público. Eu não falava uma palavra em português, mas fui. Ali teve início essa relação. Fizemos shows no Sesc Vila Mariana, e em tantos outros lugares especiais”, conta.
Em 2016 a relação com o Brasil se expandiu, pois seu álbum My Harp My Soul foi lançado pelo selo brasileiro “Chico Blues Records”, um dos mais tradicionais do gênero aqui no país. “Foi outro movimento intermediado pelo Flávio. Ele me apresentou ao Chico e tive a honra de ter meu álbum lançado por este relevante selo”.
Dentre suas apresentações internacionais destacam-se shows do México no Legendary Bar Ruta 61 e no Salva Blues International Festival, em Guanajuato. No Chile, tocou no 3º Festival Blues and Beer em Lago Ranco, e em seu país realizou repetidas turnês pela Patagônia. Também protagonizou diversas turnês pelo Brasil, apresentando-se em eventos como o Bourbon Festival Paraty no Rio de Janeiro, o Canoa Blues em Canoa Quebrada, o Mississippi Delta Blues em Caxias do Sul, e o BB Seguridade em Brasília e em São Paulo. Também se apresentou no Festival Internacional de Blues na sala Zitarrosa, em Montevidéu, e em vários países europeus. Além disso, é endorsee da prestigiosa marca de gaitas Seydel.
Com uma carreira sólida, Xime Monzón conseguiu se firmar como uma das harmonistas mais atuantes da atualidade e uma referência da gaita do blues, capaz de transitar por diferentes países e regiões graças a sua simplicidade, carisma e requinte musical.
Confira a entrevista completa no Podcast Unesp.