Unesp reestrutura instituto para potencializar apoio a pesquisas em ciências do mar

IEAMar Peter Christian Hackspacher viabiliza uma nova infraestrutura para pesquisa para a Universidade, com equipamentos multiusuários descentralizados e articulados com temas de estudo desenvolvidos em seis câmpus universitários diferentes.

Sete anos depois de sua inauguração, o Instituto de Estudos Avançados do Mar (IEAMar) da Unesp foi apresentado novamente à comunidade científica na última quarta-feira, 19 de abril, em São Vicente, litoral paulista, após uma completa reestruturação que adaptou o seu modelo de funcionamento à estrutura multicâmpus da Universidade e viabilizou uma nova infraestrutura para pesquisa, com equipamentos multiusuários descentralizados e articulados com temas de estudo desenvolvidos em seis câmpus universitários diferentes.

O IEAMar agora está distribuído em seis polos, localizados em Bauru, Registro, Rio Claro, Presidente Prudente, São José dos Campos e São Vicente. Em São Vicente fica a sede do instituto, concebido para estimular o avanço científico interdisciplinar voltado para a exploração do ambiente costeiro de forma sustentável. Com mais de 7.000 quilômetros de faixa litorânea, o Brasil tem um potencial de exploração da biodiversidade oceânica que levou os cientistas a batizarem esta fronteira de pesquisa de “Amazônia Azul”.

Com investimentos iniciais em torno de R$ 35 milhões, a maior parte deles desembolsados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o IEAMar foi inaugurado em 2016, mas sofreu com a crise econômica que atingiu a Universidade no final da década passada. Cerca de R$ 20 milhões foram executados só na atual gestão, após a reorganização do instituto em polos e a recuperação da capacidade institucional para investimentos. O IEAMar agora leva o nome do professor Peter Christian Hackspacher, coordenador executivo que mais contribuiu para pôr de pé a unidade complementar, falecido em novembro de 2021 e homenageado na reinauguração.

“A concretização do IEAMar é uma grande conquista”, afirma o reitor Pasqual Barretti. “Era um projeto difícil de ser executado por ser inédito, por seu tamanho, pelo grau de excelência, porque tem que reunir uma série de pesquisadores e o formato descentralizado ajudou muito isso. Esta gestão, a pró-reitoria de pesquisa e o MCTI foram muito parceiros e proativos. Infelizmente, o professor Peter não está aqui com a gente. Certamente, se estiver em algum lugar, está muito feliz de ver o seu sonho concretizado”, diz o reitor.

Atualmente, o IEAMar tem seus primeiros servidores técnico-administrativos e bolsistas, além reunir 20 docentes da Unesp credenciados para utilizar os equipamentos, que incluem espectrômetros de massas de alta resolução (detectam, identificam e quantificam moléculas de interesse), cromatógrafos (fazem a separação de compostos químicos) e aparelho de ressonância magnética nuclear (ajuda na caracterização de biomoléculas), entre outros. Hoje, há 46 projetos principais em andamento nos polos do IEAMar, com o envolvimento de 12 programas de pós-graduação da Universidade e também com a participação de pesquisadores de outras instituições.

De acordo com a coordenadora executiva do IEAMar, professora Gabriela Ramos Hurtado, o redesenho do instituto levou em consideração as linhas de pesquisa dos polos. “Foram definidas as linhas em que cada polo atuaria e como cada polo poderia conversar com os demais, um complemento entre as linhas (de pesquisa)”, explica a pesquisadora, citando como exemplo os trabalhos que gravitam em torno das mudanças climáticas e da biodiversidade dos oceanos. “Fizemos um ajuste do plano de trabalho e reorganizamos os equipamentos com a aprovação do MCTI”, diz. Segundo a docente, o parque de equipamentos instalado nos polos do instituto custaria hoje cerca de R$ 100 milhões para ser adquirido, em razão da alta do dólar –na última década, a cotação da moeda norte-americana saiu do patamar de R$ 2 para os atuais R$ 5.

Concepção do instituto

A história do Instituto de Estudos Avançados do Mar da Unesp começou em 2010, após um entendimento do então reitor Herman Voorwald com o ministro da ciência e tecnologia da época, o físico Sérgio Rezende. A vice-reitora Maysa Furlan e a pró-reitora de pós-graduação Maria Valnice Boldrin, que atuavam como assessoras na Pró-Reitoria de Pesquisa, trabalharam no projeto inicial do IEAMar e envolveram na discussão o professor Peter Hackspacher, do câmpus de Rio Claro, chamado de “visionário”.

“A internacionalização do Instituto de Estudos Avançados do Mar veio com a figura do Peter. Ele tinha muita colaboração com a Alemanha. Percorri com ele a Alemanha quase de norte a sul, divulgando o centro e buscando parcerias. Foi um momento especial que trouxe muitas perspectivas”, lembra a vice-reitora Maysa Furlan. “A ciência não tem fronteiras. Com a expertise de unidades em diferentes regiões do estado, a Unesp foi capaz de propor um grande projeto para estudar a Amazônia Azul. Temos muito a explorar”, diz a docente.

As lembranças carinhosas do professor Peter Hackspacher tornaram a cerimônia de reinauguração do IEAMar bastante emotiva. Estavam presentes na solenidade os irmãos do docente, Fritz e Catarina, e o filho mais novo, Hans Hackspacher. “É engraçado que o meu pai tinha um certo receio de que aquilo que fez em vida não tivesse continuidade depois que morresse. Tinha esse receio e hoje a gente está aqui para comprovar que era só uma paranoia dele. Todo mundo aqui está reunido por este mesmo ideal e pela memória dele. Mostra que ele estava bem enganado, e isso é bem legal”, diz o filho Hans, de 32 anos, que nasceu em Rio Claro e acompanhava o pai no câmpus quando era criança. “O IEAMar era a outra família dele. Sempre deu o máximo pela profissão, pelo ofício. Esta dedicação que tinha pelo trabalho resultou nisso que a gente está vendo aqui, uma grande homenagem e todo mundo reconhecendo o peso que ele tinha na comunidade científica”, afirma.

Segundo a professora Gabriela Hurtado, que por anos foi a substituta de Peter Hackspacher na coordenação executiva do IEAMar, foi o pesquisador que hoje dá nome ao instituto que abriu caminho para a Unesp integrar o Programa de Geologia e Geofísica Marinha (PGGM), uma rede de cooperação científica com colaboradores vinculados a diversas instituições e liderada pela Marinha e pelo Serviço Geológico do Brasil. O PGGM tem 54 anos e participantes de 28 instituições, dentre as quais a Unesp. 

Gabriela Hurtado já participou de duas expedições do programa e diz que o IEAMar pode contribuir muito para as incursões em alto-mar, citando o conjunto de espectrômetros de massa instalado no Instituto de Geociências e Ciências Exatas (IGCE) do câmpus de Rio Claro. Segundo ela, são equipamentos únicos no país. “O que eu estou chamando de central isotópica é um conjunto de equipamentos de alta resolução com uma configuração única. Juntos, só tem lá”, afirma a pesquisadora

Década dos oceanos

A coordenadora executiva do IEAMar lembra que o instituto se reestruturou tendo em mente também a Década dos Oceanos, denominação instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU) para o período entre 2021 e 2030 para chamar a atenção da comunidade internacional para o uso sustentável dos recursos marinhos, um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU. “Os grupos de trabalho instalados pelo MCTI vêm para mostrar quais são as demandas reais que temos no Brasil, as linhas de pesquisa para as quais os institutos de pesquisa devem convergir”, diz.

Para o pró-reitor de pesquisa da Unesp, professor Edson Cocchieri Botelho, a distribuição do IEAMar em seis polos vai ajudar tanto no compartilhamento dos equipamentos multiusuários quanto no desenvolvimento dos próprios câmpus, facilitando a iniciação científica de estudantes e também a formação de grupos de pesquisa. “Esta estratégia de ter seis câmpus aproxima mais (a infraestrutura de pesquisa) não só dos câmpus já bem estruturados, mas também de câmpus menores que estão nas proximidades”, diz o pró-reitor de pesquisa. “(O câmpus de) Registro, por exemplo. Tem um laboratório do IEAMar e está conseguindo fazer com que os pesquisadores não só consigam uma maior inserção na pós-graduação, mas também na produção científica, e na publicação de artigos. Na verdade, é um conjunto de ações que acaba sendo beneficiado por este tipo de estratégia”, afirma.

Em uma das regiões mais pobres do Estado de São Paulo, a Faculdade de Ciências Agrárias do Vale do Ribeira integra o câmpus de Registro, um dos cinco consolidados na atual gestão, no final de 2021. O polo local do IEAMar tem cerca de R$ 5,5 milhões em equipamentos multiusuários que já mudaram a dinâmica das atividades de professores e estudantes, de acordo com a professora Patrícia Soares Santiago, vice-coordenadora executiva do IEAMar. “Foi uma grande mudança para os docentes (de Registro) a chegada de equipamentos deste porte. Agora há muito mais possibilidades de pesquisa na própria unidade. É uma quebra de paradigma dentro da Unesp”, resume a pesquisadora.

Imagem de abertura: pró-reitor de pesquisa Edson Botelho, vice-reitora Maysa Furlan, reitor Pasqual Barretti, Capitão de Mar e Guerra Alessander Felipe Imamura Carneiro, pró-reitor de planejamento estratégico e gestão Estevão Kimpara e coordenadora executiva do IEAMar Gabriela Hurtado (esq. para a dir.) – Fotos de Fabio Mazzitelli / ACI Unesp