Grandes religiões não são monolíticas, e isso permite que possa haver diálogo entre elas, diz estudioso da Unesp

Professor Ivan Esperança Rocha, da Faculdade de Ciências e Letras do câmpus de Assis, discorre sobre o espaço das práticas religiosas na atualidade, analisa suas origens históricas e debate a intolerância nesta edição do podcast Prato do Dia

Especialista nos estudos sobre religiões, em especial judaísmo e cristianismo, o professor Ivan Esperança Rocha, da Faculdade de Ciências e Letras (FCL), do câmpus de Assis da Unesp, sugeriu dias antes de ser entrevistado pelo podcast Prato do Dia que os participantes da conversa assistissem ao filme de 2021 “Missão: alegria em tempos difíceis” (tradução da Netflix para “Mission: Joy – Finding Happiness in Troubled Times”), um documentário que detalha a amizade entre o arcebispo anglicano Desmond Tutu, morto no final de 2021, e o atual Dalai Lama, ambos agraciados com o Nobel da Paz nos anos 1980. 

“O que achei mais interessante neste documentário construído com o Desmond Tutu e com o Dalai Lama é que os dois sorriem durante toda a gravação. Parece que isto é o segredo. Ou seja, é preciso fazer a humanidade sorrir com todas as suas opções”, diz o docente.

Para Ivan Esperança Rocha, a religião, seja qual for, pode ser definida como uma proposta em busca de respostas e/ou soluções para questões que estão em um patamar não alcançado pela razão e, nesse sentido, as práticas religiosas sempre cumpriram um papel fundamental na história –e ainda cumprem para o homem contemporâneo. Como exemplo, o professor remete-se ao ideário da Revolução Francesa. No final do Século 18 e no decorrer do Século 19, predominou o pensamento de que o racionalismo construiria a paz entre os homens, o que foi desmentido com a eclosão da primeira e da segunda Guerra Mundial e também da Guerra Fria ao longo do século passado. 

“O racionalismo não resolveu o problema do homem. (…) A ciência foi extraordinária, particularmente neste mundo pandêmico em que ela nos trouxe soluções importantíssimas para garantir a vida ao redor do mundo, mas não resolve todos os problemas. O sentimento, a alma têm um papel fundamental que não se pode perder. Não podemos perder de vista aquilo que Dalai Lama e Desmond Tutu colocam, que é o sorriso na nossa cara”, afirma.

O docente da Unesp, que é cofundador da Associação Brasileira de História das Religiões (ABHR) e um dos coordenadores do Núcleo de Estudos Antigos e Medievais da Universidade, fez mestrado em Ciências Bíblicas em Roma, no Pontifício Instituto Bíblico, uma instituição de ensino superior da Santa Sé administrada por padres jesuítas. Foi lá que teve aulas com Carlo Maria Martini, que se tornaria cardeal e se apresentaria anos depois para suceder o Papa João Paulo II no Conclave de 2005. Um dos representantes da ala mais progressistas da Igreja Católica, Martini viu seu grupo ser derrotado pela ala mais conservadora na escolha do cardeal Joseph Ratzinger, o Papa Bento XVI. Deste lugar de fala própria à ala mais progressista da Igreja, Ivan Esperança Rocha destaca a importância das garantias constitucionais vigentes, tanto no Brasil quanto na Itália, para o combate a manifestações de intolerância religiosa e o exercício democrático.

“A liberdade religiosa deve ser um direito, que está consignado na nossa Constituição, garantido no nível municipal, estadual e federal com o envolvimento da sociedade civil, que tem que lutar e garantir esta liberdade. Porque, quando eu cerceio a liberdade religiosa, eu abro brecha para cercear outras liberdades, como aquela que foi cerceada durante o período da ditadura militar”, disse o professor da Unesp durante o podcast.

Ivan Esperança Rocha está finalizando a tradução para o português de uma das obras de Flávio Josefo, autor judeu que viveu no primeiro século do cristianismo e é a principal fonte histórica não bíblica para entender aquele momento histórico e o contexto que envolve o Novo Testamento, parte da Bíblia Cristã escrita depois de Jesus. A íntegra desta edição do Prato do Dia, disponível na mídia abaixo, pode ser ouvida também na plataforma Podcast Unesp, bem como nos tocadores Google Podcasts, Spotify e Deezer.