Após cinco meses da invasão das tropas russas na Ucrânia, o conflito segue sem perspectiva de um possível acordo e abala economias e relações diplomáticas em diferentes pontos do planeta. Entre as pautas mais debatidas estão os impactos da política energética russa na geopolítica do continente europeu.
Para o pesquisador José Késsio Floro Lemos, a eclosão da guerra irá acelerar, na Europa, o processo de redução da dependência do gás natural proveninete da Rússia. Tanto o gás natural como o petróleo representam uma fonte importante de recursos para o país de Vladimir Putin. “Substituir os recursos energéticos da Rússia passou a ser um compromisso concreto da Europa no médio e longo prazo. A Europa quer e precisa retirar esse poder de barganha das mãos de Moscou. Em contrapartida, os russos vão redirecionar seus recursos energéticos provavelmente para o continente asiático”, explica o doutorando em relações internacionais pelo PPGRI San Tiago Dantas (Unesp, Unicamp e PUC-SP) e pesquisador visitante na Universidade de Kent (Inglaterra). “Isso provocará uma reestruturação do comércio energético global, que deverá causar mudanças importantes na ordem internacional, como a conhecemios hoje”, afirma o pesquisador ao Podcast Unesp.
Em seu doutorado, com financiamento da Fapesp, Késsio investiga as relações da Rússia com os países do espaço pós-soviético na questão energética, e as formas como o país tem usado esses recursos como ferramenta de poder, seja turbinando suas receitas por meio da exportação do petróleo e do gás natural, seja para coagir ou mesmo manipular as decisões políticas dos países dependentes dos recursos energéticos russos.
A Rússia é hoje o terceiro maior produtor de petróleo do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da Arábia Saudita. Desde que o presidente Vladimir Putin ordenou o ataque à Ucrânia, no final de fevereiro, o preço do barril do petróleo disparou. Nesse sentido, essa guerra já prejudica claramente a economia global, com o encarecimento de alimentos e do petróleo, reforçando a inflação.
Esse aumento dos preços foi impulsionado principalmente pelas preocupações que a Rússia gera no mercado. Além da dependência do continente europeu do gás natural e do petróleo produzido pelos russos, o território ucraniano também é passagem de diversos gasodutos que abastecem os europeus. Neste cenário, há um temor de que sanções dos Estados Unidos e de outros países do ocidente pudessem interromper a oferta de petróleo russo.
Késsio aponta que o conflito já levou a algumas consequências imortante de ordem geopolítica, como a reaproximação dos Estados Unidos de seus aliados europeus e o fortalecimento da OTAN, ações que o pesquisador avalia como bem sucedidas até o momento por parte dos norte-americanos. “A guerra na Ucrânia é um ringue de uma batalha muito mais ampla. O grande conflito da atualidade é a disputa entre EUA e China”, aponta o doutorando. “Acredito que Washington tenha visto na guerra da Ucrânia uma oportunidade para reconfigurar relações de poder, e assim tornar o ambiente internacional menos favorável aos interesses chineses”.
Ouça a entrevista de Késsio ao Pod Mundo e Política, do Podcast Unesp:
Imagem acima: consequências do bombardeio em Kharkiv, na Ucrânia, em março de 2022. Crédito: Depositphotos