O Itamaraty em fins de janeiro informou à direção da Organização Europeia para Pesquisa Nuclear (CERN, na sigla em francês), sediado em Genebra, na Suíça, que o governo brasileiro irá concluir a tempo os procedimentos burocráticos necessários para que o país possa tornar-se membro-associado do laboratório. A associação começou a ser negociada ainda em 2012. Ano passado, a direção do CERN havia comunicado ao governo brasileiro que o mês de março de 2024 constituiria a data limite para a conclusão dos procedimentos burocráticos, caso contrário a candidatura não seria mais considerada. Embora a aprovação de dois acordos internacionais necessários para efetivar a adesão tenha ocorrido no Senado e na Câmara dos Deputados ainda no fim de 2023, ainda falta a promulgação da Presidência da República.
O CERN é mundialmente famoso por abrigar o maior acelerador de partículas do mundo, o Large Hadron Collider. Desde 2006 o Brasil possui um acordo de colaboração com o laboratório, e diversos pesquisadores brasileiros colaboram com experimentos conduzidos no acelerador.
Professor do Instituto de Física Teórica da Unesp, o físico Sérgio Novaes participou da primeira comissão responsável pelo processo de adesão. Ele também está à frente do São Paulo Research and Annalysis Center (SPRACE), centro de pesquisa que conduz o processamento de parte dos dados gerados nos experimentos do LHC. Em entrevista à Rádio Unesp, ele analisou as possibilidades que podem surgir a partir da nova condição de país-membro, pela qual o governo brasileiro pagará anualmente US$ 12 milhões.
“Diria que, do ponto de vista da pesquisa, a condição de membro associado não implicará muitas mudanças”, diz. Ele explica que todos os dados gerados pelo acelerador já são livremente compartilhados entre os pesquisadores de diversos países e instituições, “de Harvard à Unesp”, que colaboram nos experimentos. “Mas o trabalho que é feito a partir dos dados recebidos depende da competência de cada grupo”, diz.
Mas, para além da colaboração científica, o Brasil passará a ter o direito de participar das licitações para aquisição do material necessário para manter ativo o gigantesco LHC, que tem 27 km de circunferência, o que inclui a possibilidade de oferecer equipamentos, softwares etc. A participação nestas licitações pode ajudar no desenvolvimento da indústria de alta tecnologia no Brasil, além de abrir caminhos para a transferência de expertise para nosso país.
“Por meio desses contratos de licitações, há até a possibilidade de que o Brasil recupere os US$ 12 milhões que paga pela condição de membro-associado”, diz Novaes. Esse cenário favorável, porém, só poderá vir a se concretizar se os gestores de ciência e tecnologia do país, bem como os empresários, demostrarem iniciativa. Essa proatividade é essencial para identificar quais as demandas de produtos e serviços que o CERN apresenta hoje, um quadro bastante variado que vai desde obras de engenharia civil envolvendo a construção de túneis até a produção de componentes eletrônicos. O passo a seguir envolverá facilitar a aproximação das empresas brasileiras com a Instituição europeia. “Será preciso gerenciar tudo isso. Porém, se nada for feito, o país ficará apenas como espectador, e não obterá nenhum outro benefício”, diz.
Para escutar a íntegra da entrevista com o físico Sérgio Novaes à Rádio Unesp, clique aqui.
Imagem acima: a Esplanade des Particules, no CERN, onde ficam as bandeiras dos países que são membros da organização. Crédito: Brien Maximillien, 2018, CERN.