Considerado um dos grupos mais influentes da música instrumental brasileira, o Azymuth ficou conhecido pela fusão sonora inovadora de ritmos brasileiros e improvisação jazzística. Em 2025, a banda liderada atualmente pelo contrabaixista Alex Malheiros celebra 50 anos do seu primeiro LP, que ajudou o trio a alcançar o reconhecimento internacional.
Lançado em 1975 pela Som Livre, o álbum, que leva o nome do trio, conquistou o público e a crítica especializada com as faixas icônicas, como Linha do Horizonte, Manhã e Faça de Conta. A união de elementos de jazz, samba e bossa nova presente no trabalho de estreia ajudou a definir o som produzido pelo grupo ao longo da carreira e influenciou gerações de músicos e fãs.
Alex Malheiros explica a origem do grupo e o contexto em que ele foi formado. “Naquela época, eu e o Mamão (Ivan Conti) fomos trabalhar na Polygram a pedido do Roberto Menescal. Entretanto, nós três (Malheiros, Conti e José Roberto Bertrami – idealizadores do grupo) já éramos conhecidos como músicos de estúdio e já tínhamos gravado e acompanhado nomes relevantes da música brasileira como Raul Seixas, Elis Regina, Rita Lee, Odair José, dentre outros. Em 1973, o Marcos Valle foi convidado para fazer a trilha do documentário de Hector Babenco e Roberto Farias, O Fabuloso Fittipaldi, e convenceu o produtor Armando Pittigliani a chamar a gente para acompanhá-lo na gravação. Marcos fez as músicas e o Bertrami os arranjos. Os diretores do documentário insistiram para que utilizassem a canção Azimuth, que havia sido lançada em 1969 [no álbum Mustang Cor de Sangue, de Marcos Valle]. Como Marcos tinha contrato com a Odeon, ele não poderia ser creditado como autor do álbum [que seria lançado pela Philips Records]. A solução sugerida foi creditar o álbum ao trio, ou seja, que a gente adotasse como nome o título da canção de Marcos Valle e Novelli. Aí nós fomos pedir também ao Menescal, que concordou de imediato. A parceria com Marcos Valle ainda rendeu mais um disco, lançado no mesmo ano (Previsão do Tempo), e aí despertou a nossa grande parceria com o Marcos Valle que dura até hoje”.
Nos anos seguintes, o trio continuou a excursionar e gravar com grandes nomes da música popular brasileira, como Clara Nunes, Hyldon, Belchior, João Nogueira, Tim Maia e a Banda Veneno, do maestro Érlon Chaves. Em 1974, participaram da trilha sonora da novela O Espigão com a canção Pela Cidade. No ano seguinte, gravam um disco no estúdio Havaí e o oferecem a várias gravadoras. Quem comprou os acetatos para lançar o LP Azimüth foi a Som Livre. A Rede Globo aproveitou o novo lançamento de sua empresa irmã e incluiu a canção Linha do Horizonte, que abria o álbum, na trilha sonora da novela Cuca Legal. Puxado pela canção, o álbum vendeu muito bem.
“Esse primeiro disco autoral, que completa 50 anos, a gente fez com dinheiro nosso e recursos próprios. Havia um forrozeiro, dono do Estúdio Havaí, que devia uma grana pra gente pelo fato de termos gravado um disco pra ele. Aí foi tipo uma permuta: ele disse, usa aí a área do estúdio para vocês gravarem como forma de pagamento. E era um estúdio muito bom. Então gravamos, levamos para o João Araújo (pai do Cazuza), que era diretor da Som Livre, e gravamos nosso primeiro álbum chamado Azimüth“, recorda Malheiros. “A música Linha do Horizonte atingiu um sucesso muito grande, uma explosão que tocava em todos os lugares. Ficamos extremamente conhecidos, aquela coisa das pessoas abordarem a gente nas ruas, algo imensurável. A gente virou pop. Tenho que admitir que a música é muito boa. Em celebração à data e a nossa amizade, o Marcos Valle e o Paulo Sérgio decidiram fazer uma música nova e em breve vamos gravar”.
No mesmo ano, o trio participou da trilha sonora da novela Pecado Capital, com a canção Melô da Cuíca que, lançada em compacto no mesmo ano, fez sucesso nacionalmente. Em 1977, o grupo lança o segundo álbum, agora pela WEA, intitulado Águia Não Come Mosca, beneficiado pelo fato de Voo sobre o Horizonte ter estourado na trilha sonora da novela Locomotivas, alçando bons números de venda.
De lá para cá, mais de 30 LPs foram gravados pelo trio. Ao longo dos anos, o som do Azymuth ganhou novas gerações de fãs por meio de suas turnês na Europa e nos Estados Unidos, e por conta de remixes produzidos por destacados DJs e produtores, entre eles: Roni Size, DJ Nuts, DJ Spinna, DJ Ron Trent, DJ Venom, Theo Parish, Kenny Dopp, 4 Hero, Jazzanova, entre outros.
Suas músicas são majoritariamente instrumentais, variando desde o samba até o funk, numa espécie de jazz fusion. O estilo costuma ser chamado pelos integrantes do trio de “samba doido”. Seus principais sucessos são Linha do Horizonte, Melô da Cuíca, Saltos das Sete Quedas e Voo sobre o Horizonte – no Brasil -, além do grande sucesso internacional Jazz Carnival.

Carreira internacional
O estilo autêntico e requintado do grupo chamou a atenção de Claude Nobs, o diretor do Festival de Jazz de Montreux, que resolveu convidá-los para participar da edição de 1977, o que fez do Azymuth a primeira banda brasileira a tocar no prestigiado festival suíço. A boa repercussão da apresentação levou trio a uma turnê norte-americana ao lado de Airto Moreira e sua esposa, a cantora Flora Purim, que cruzou os EUA de costa a costa. A turnê acabou rendendo um contrato com a Milestone Records, selo dedicado ao jazz pertencente à gravadora norte-americana Fantasy Records. Assim, em 1979, lançam Light as a Feather trazendo a canção Jazz Carnival. Lançada em compacto no mesmo ano, a música se tornou um sucesso, atingindo a 19ª colocação na parada britânica em janeiro de 1980 e vendendo 250 mil cópias na Europa.
O sucesso do álbum de estreia na nova gravadora permitiu que o grupo lançasse uma série de álbuns ecléticos e influentes pela Milestone na década seguinte, levando a uma carreira internacional bem estabelecida nos mercados dos Estados Unidos e da Europa. Pela mesma gravadora, os três membros tiveram oportunidade para gravar álbuns solos. Em 1989, dois fatos marcam a carreira da banda: o fim do seu contrato com a gravadora Milestone e a saída de Bertrami. Assim, Alex Malheiros e Ivan Conti recrutam Jota Moraes para o lugar de Bertrami, e os três assinam com a gravadora Íntima Records, pela qual gravaram dois álbuns: Tudo Bem – dedicado a Chico Mendes, que tinha sido assassinado naquele ano – e Curumim.
Em 1994, a explosão do acid jazz colocou novamente o Azymujth sob os holofotes. Bandas identificadas com o novo gênero, como Jamiroquai, Brand New Heavies e Incógnito, cultuavam o som do trio brasileiro. Não demorou para que a gravadora Far Out Recordings, de Joe Davis, a quem eles já conheciam desde 1989, oferecesse um contrato para o grupo, novamente com Bertrami e Malheiros nas gravações.
Dessa forma, a partir de 1996 começam a sair os discos pela nova gravadora, como Carnival, Woodland Warrior, Pieces of Ipanema, Before We Forget e Partido Novo. O Azymuth experimenta então uma ressurgência, especialmente na Inglaterra e no resto da Europa. Uma das principais razões desse novo interesse pelo grupo deve-se aos remixes de suas canções por importantes DJ’s da cena eletrônica europeia.
Em 2008, lançam Butterfly que é universalmente aclamado pela crítica especializada como seu melhor trabalho pela Far Out. Em 2011, lançam Aurora, seu último trabalho de inéditas. No ano seguinte, no dia 9 de julho faleceu Bertrami, após não resistir a uma internação para tratar uma falência hepática. Após um breve hiato, decidem continuar a carreira, a princípio convidando Fernando Moraes para assumir os teclados em um tour na Europa e, ao voltar ao Brasil, convidando Kiko Continentino para substituir Bertrami.
“Tenho incontáveis lembranças boas no universo da música. Aliás, sou muito grato aos meus pais por terem me permitido caminhar pela estrada da música, desde lá com um contrabaixo improvisado, os bailes, mas claro, em especial a oportunidade que tivemos de viver pelo Azymuth, se apresentar no Festival de Jazz de Montreux, tocar em estúdios onde gravaram músicos como Beatles, Miles Davis dentre tantos outros momentos, inclusive esse que vivemos agora celebrando 50 anos do nosso primeiro álbum. É um grande orgulho ser o último dos moicanos que carrega essa bela bandeira chamada Azymuth”.
Confira abaixo a entrevista completa no Podcast MPB Unesp:
Na imagem acima: o contrabaixista Alex Malheiros, líder do grupo Azymuth (Crédito: Divulgação)