Entre as tendências no campo das pesquisas envolvendo a produção de alimentos, tem crescido o interesse pelas chamadas proteínas alternativas. O objetivo deste novo segmento é desenvolver maneiras mais sustentáveis para assegurar à humanidade o acesso ao consumo de proteínas sem depender da criação ou do abate de animais. Muito conhecidos já são os chamados produtos plant-based, que incluem leites vegetais e proteínas a base de plantas. Mas um artigo que gera mais admiração, e alguma polêmica, é a carne cultivada, também chamada de carne celular.
A produção da carne cultivada envolve um arranjo de células animais que são colocadas em um meio de cultura rico em nutrientes e cultivadas em biorreatores que simulam o ambiente natural do corpo do animal. Ao se multiplicarem, essas células formam o tecido muscular e resultam em carne apta ao consumo, sem a necessidade de abater animais. O objetivo é entregar um produto final idêntico à carne convencional em sabor e composição, mas com impactos ambientais reduzidos.
No Brasil, as pesquisas em torno das proteínas alternativas têm avançado com o apoio de instituições públicas, como a Embrapa Suínos e Aves, que anunciou em janeiro que está conduzindo estudos para desenvolver carne de frango cultivada em laboratório, e empresas privadas, como as gigantes do setor alimentício BRF e JBS, que têm colocado a carne cultivada em seus horizontes. Apesar dos avanços dos estudos, ainda há muitos desafios a enfrentar. Neste episódio do podcast “Prato do Dia”, Juliane Leutz, médica veterinária e presidente do Alt Protein Project UNESP, uma iniciativa universitária dedicada à divulgação de pesquisas sobre proteínas alternativas, falou sobre o assunto.
Cofundadora do BrasilProtAlt, grupo dedicado à pesquisa e promoção de proteínas alternativas no Brasil, a pesquisadora explica que a principal dificuldade no desenvolvimento da carne cultivada atualmente é promover ganho de escala a fim de reduzir custos. Embora já seja ofertada em alguns restaurantes, nenhum deles fica no Brasil. “O objetivo é possibilitar que o produto seja acessível a toda a população. A longo prazo, os pesquisadores estão fazendo tudo o que é possível para que ele se torne escalonável e mais barato. Mas, neste primeiro momento, acredito que essa seja a realidade, pois o meio de cultivo ainda é caro”, diz ela. O consumo dessas carnes está regulamentado em países como Singapura e Estados Unidos, mas no Brasil ainda não há qualquer iniciativa neste sentido.
Juliane Leutz diz que o produto se destina a atender um público formado por pessoas que apreciam carne mas, por razões de saúde, sustentabilidade e até bem-estar animal, desejam reduzir seu consumo. Estudos indicam que os públicos vegano e vegetariano podem apoiar a pesquisa, mas não estão propensos ao consumo. “Esses grupos apoiam a pesquisa”, diz Leutz, “mas sabem que a carne cultivada é carne”.
Aspectos culturais também criam resistências à aceitação das proteínas alternativas, com críticos ainda questionando o sabor e a qualidade nutricional. Juliane afirma que, apesar de processadas, as carnes cultivadas são ricas em proteínas, fibras e vitaminas e também estão no centro de investimentos de pesquisas e desenvolvimentos biotecnológicos focados em melhorar a sua qualidade. “O céu é o limite”, diz a pesquisadora.
De acordo com Leutz, o Brasil tem um enorme potencial para liderar a produção de proteínas alternativas, como a carne cultivada. Com vastos recursos naturais, resíduos da agroindústria e pesquisadores de excelência, o país reúne as condições ideais para desenvolver esse segmento. “Temos tudo para dar certo”, afirma.
Ouça o episódio completo do podcast Prato do Dia sobre proteínas alternativas no player abaixo ou na sua plataforma de streaming favorita.