Podcast Prato do Dia explora os desafios da segurança pública no Brasil

Entrevistado no novo episódio do podcast, o jornalista e pesquisador Bruno Paes Manso aborda a complexa dinâmica entre religião e violência nas periferias das grandes cidades, tema de seu novo livro. E defende que, para superar os desafios na área de segurança pública, o país deverá também repensar a atuação das forças de segurança. “A violência policial é a irmã siamesa da corrupção policial”, diz.

Após décadas de ações ineficazes no combate a violência urbana, a questão da segurança pública está no topo da lista de preocupações dos brasileiros. Problemas como altas taxas de homicídios, o domínio do crime organizado sobre o sistema prisional e a consolidação do pacto entre as milícias e os atores políticos atravessaram governos de todas as vertentes ideológicas sem encontrarem qualquer resposta mais contundente por parte dos governantes. Neste processo, a violência se tornou um dos fatores-chave a moldar nosso cotidiano, com impactos especialmente devastadores sobre as populações das periferias brasileiras.  

Em entrevista ao podcast Prato do Dia, o jornalista, professor e pesquisador Bruno Paes Manso, mestre e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo, explora a complexa relação entre crime, violência e religião no Brasil. Autor de “A República das Milícias”, ganhador do Prêmio Jabuti em 2021, ele está publicando um novo livro intitulado “A Fé e o Fuzil”, no qual reconta a história dos últimos cem anos do país a partir da ótica do desenvolvimento econômico e dos problemas sociais associados, e investiga as mudanças que se seguiram na esfera das crenças religiosas e no crescimento da criminalidade.

Narcomilícia evangélica

Durante entrevista a um programa de televisão em 11 de março, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes mencionou a existência de uma narcomilícia evangélica em atividade no Rio de Janeiro. Paes Manso observou este grupo em primeira mão, durante suas pesquisas, e explica que a combinação, que pode parecer insólita, é uma demonstração do uso do discurso religioso como ferramenta para estabelecer autoridade, poder e obediência. No fim, serve como instrumento de legitimação da violência.

O autor diz que tanto igrejas evangélicas quanto facções criminosas no Brasil têm crescido intensamente nas periferias do país devido a sua capacidade de se adaptarem às mudanças no cenário político e social das periferias, onde as lacunas deixadas pelo Estado tornaram a vida das populações cada vez mais frágeis, desamparadas e caóticas.

Ele avalia também os problemas de segurança associados à ação das forças de segurança, passando por temas como corrupção estatal, letalidade policial e a formação das milícias. Manso destaca que uma polícia que registra altos índices de mortes geralmente está operando de forma descontrolada, sem supervisão das autoridades ou do poder executivo, destacando o fato de que desde 2018, as polícias têm liderado o ranking de maior número de mortes no Brasil.

“Uma polícia que mata muito pode vender esse poder na cena criminal: o poder sobre a vida e a morte das pessoas. Ela vende isso para uma facção rival, e acaba entrando no cenário do crime. A violência policial é a irmã siamesa da corrupção policial”, diz. Em suas pesquisas, ele descreveu detalhadamente o surgimento e a disseminação das milícias em diversas estruturas organizacionais do país, fato que atribui à falta de ações eficazes do Estado diante da crise na segurança pública. “Por um lado, se tem um mercado importante de armas e segurança privada, então tem muita gente ganhando dinheiro com isso. De outro, você tem uma mentalidade de enxergar a política como guerra. Então, não há mais aquela ideia de um governador democrático, que vai governar para todo mundo e pensar em soluções para criar um país mais justo”, diz.

Mentalidade de confronto entre o bem e o mal

Esta perspectiva de uma “luta do bem contra o mal” é outra contaminação do discurso religioso que alcançou a cena da segurança pública. Paes Manso diz que desde meados de 2018, as redes sociais têm desempenhado um papel significativo na disseminação dessas narrativas, que exploram o medo e a insegurança da população, principalmente em função de fatores de vulnerabilidade socioeconômica. O resultado é uma mentalidade confrontacional que intensifica os desafios enfrentados na segurança pública ao impulsionar a busca por soluções para problemas através da violência.

“Eu acho que a gente não vai conseguir entender esse processo sem pensar no fenômeno das redes sociais. A gente vê o fenômeno da luta política e do crescimento do bolsonarismo, que vem com o discurso de uma espécie de guerra do bem contra o mal. É esse discurso, essa crença, que justificam o conflito e que dão um peso maior para a sua causa, que justifica sua bandeira, sua luta.”

A entrevista completa com o jornalista Bruno Paes Manso está acessível na mídia abaixo, assim como na plataforma Podcast Unesp e nos reprodutores de podcasts Spotify, Deezer, Google Podcasts e Amazon Music Podcasts.