O plenário do Senado iniciou, em 26/2, o debate sobre a obrigatoriedade da aplicação da vacina contra a covid-19 em crianças de idades entre 6 meses e 5 anos, a partir de 2025. O anúncio de que a imunização contra o coronavírus vai ser incorporada ao calendário vacinal do Programa Nacional de Imunizações (PNI), feito pelo Ministério da Saúde em dezembro passado, fez com que o senador Eduardo Girão (CE), líder do partido Novo no Senado, apresentasse o requerimento para a realização de uma sessão de debate sobre o assunto.
A solicitação foi subscrita por outras autoridades políticas como o líder do PL na casa legislativa, senador Carlos Portinho (RJ), o líder do Podemos, senador Oriovisto Guimarães (PR), a líder do PP, senadora Tereza Cristina (MS) e pelo líder do PSDB, senador Izalci Lucas (DF), e aprovada pelo Plenário da instituição.
O tema da obrigatoriedade das vacinas para menores de idade já estava aquecido desde que, no começo de fevereiro, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (NOVO), anunciou que crianças não vacinadas poderiam continuar frequentando normalmente a rede pública de ensino no estado. Atualmente, não há exigência da vacinação, mas os gestores das escolas de MG solicitam a apresentação do cartão de vacinação aos pais como medida de sensibilização. O governador não explicou se se referia especificamente à vacinação contra a covid-19, ou também a outro imunizantes. Dois ministros do Supremo Tribunal Federal instaram Zema a explicar suas declarações.
Na audiência no Senado, o senador Girão ponderou que a obrigatoriedade das vacinas e a institucionalização de programas de vacinação em escolas também vêm sendo objeto de proposições legislativas no Congresso Nacional. Para ele, é necessário um amplo debate acerca da vacinação infantil, bem como o esclarecimentos sobre riscos e possíveis danos, que, muitas vezes, ainda são desconhecidos. A sessão também contou com a participação da ministra da Saúde, Nísia Trindade. Os senadores irão ouvir ainda a posição de outros profissionais da área, como médicos, farmacêuticos, virologistas e pesquisadores.
De acordo com dados do Vacinômetro do Ministério da Saúde, 3,7 milhões de crianças entre seis meses e quatro anos receberam a primeira dose da vacina, iniciada para essa faixa etária no final de 2022. Porém, o número cai para 769,3 mil, quando são consideradas as três doses (esquema vacinal completo).
Segundo nota técnica emitida em janeiro deste ano pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), entre a população brasileira menor de 19 anos, as maiores taxas de mortalidade por covid-19 são registradas entre os menores de um ano (4,3 mortes por 100 mil habitantes). Para as crianças de 1 a 4 anos, a taxa é de 0,6 por 100 mil. Apesar disso, a Fiocruz destaca que apenas 22,2% das crianças entre três e quatro anos foram vacinadas com duas doses anticovid.
Gabriel Berg de Almeida, professor da Faculdade de Medicina de Botucatu, diz que, embora a obrigatoriedade da vacinação contra covid esteja sendo debatida, vale relembrar que o Brasil já há vacinas que obrigatórias para crianças desde 1975, quando foi criado o Programa Nacional de Imunização. São pelo menos 18 vacinas obrigatórias para crianças, incluindo a BCG para tuberculose, a vacina contra febre amarela e a vacina contra tríplice viral, dentre outras.
“Estas vacinas estão inclusas no calendário infantil e são obrigatórias. Pais que não levarem seus filhos para se vacinarem, podem, inclusive, ser penalizados com multas, sanções e benefícios sociais. É importante ressaltar que essas vacinas são essenciais para evitar as infecções graves e os óbitos por doenças que são imunopreveníveis nessa faixa etária”, diz.
Ele diz que a introdução da vacinação contra covid-19 na lista daquelas obrigatórias será inestimável. E acha que o debate no Senado pode ser importante para estimular pais a vacinarem suas crianças, porque nesta faixa etária os índices de cobertura vacinal estão extremamente baixos,
“A relevância deste debate é enorme, pois a covid-19 foi a doença imunoprevenível que mais levou a óbito crianças e adolescentes no último ano. E em 2024, por exemplo, a gente teve mais óbitos por coronavírus [entre crianças] do que por dengue. E isso tendo em vista o surto de dengue que estamos atravessando”, diz.
Ele diz que muitas pessoas têm a impressão de que a covid é mais leve em crianças e adolescentes, porque elas possuem um sistema imunológico mais adequado para combater o vírus. “Mas, na ausência de vacina, isso não é verdade. Sem vacina, essas crianças estão suscetíveis à infecção, e a morrer pela doença. E para a sociedade como um todo, a vacinação para essa faixa etária é benéfica porque temos o efeito rebanho, e ocorre a redução da circulação do vírus”, diz.
O docente diz que, após o carnaval, os índices de casos de covid cresceram tanto em São Paulo como no Brasil como um todo. O cenário de festejos e aglomerações favorece uma circulação maior do vírus. E há uma nova variante circulando dentro e fora do Brasil, que apresenta transmissibilidade mais ampla. O resultado foi um aumento do número de casos, e também de quadros graves e de óbitos.
“Existem as ondas de contágio, e creio que veremos mais, a partir de agora. Temos uma doença que está se tornando endêmica, ou seja, está em circulação constante. Haverá períodos em que o número de casos vai aumentar, seja por conta da maior aglomeração de pessoas ou da circulação de novas variantes. É o que acontece todos os anos com outras infecções respiratórias, como a influenza, por exemplo”, diz. Ele explica que esse cenário era esperado, e defende que sejam adotadas medidas apropriadas a partir do monitoramento contínuo do número de casos.
“A vacina da covid vai entrar no calendário vacinal anual, assim como acontece com a vacina de influenza. E, a cada período de maior transmissibilidade, a gente vai precisar de um novo reforço, de uma nova vacinação, Então, hoje, a recomendação é que as pessoas recebam pelo menos um esquema completo de vacina, com uma dose de reforço que seja da vacina bivalente”, diz.
Pesquisas conduzidas na Unesp
O docente também aborda alguns dos projetos e iniciativas envolvendo a covid-19 que estão sendo desenvolvidos no campus da Unesp em Botucatu.
“Há vários projetos. Isso inclui desde a identificação da variante que está em circulação aos efeitos sobre os pacientes. Estudamos os pacientes internados para tentar entender o que levou a desenvolverem um quadro grave, ou até um óbito. Houve um grande estudo de vacinação realizado em Botucatu e continuamos analisando esses dados”, diz. “De forma geral, a Unesp teve um papel pioneiro durante o período de pandemia, que abrangeu variados projetos de pesquisa, projetos de extensão e o ensino sobre a covid dentro da universidade. Creio que a Unesp continua tendo um papel pioneiro e inovador, e sendo uma liderança dentro do Estado de São Paulo e no Brasil.”
Veja a íntegra da entrevista abaixo.