Há 50 anos o Brasil perdia um dos seus principais personagens no campo da música e da cultura: o flautista, saxofonista, compositor, arranjador e maestro, Pixinguinha. Para pesquisadores e estudiosos da área, o músico carioca teve um papel fundamental na formação da música popular brasileira e contribuiu diretamente para que o choro encontrasse uma forma musical definitiva.
Pixinguinha nasceu Alfredo da Rocha Vianna Filho, em 4 de maio de 1897, no Rio de Janeiro. Filho do músico Alfredo da Rocha Vianna, funcionário dos correios, flautista e que possuía uma grande coleção de partituras de choros antigos, o garoto negro aprendeu música em casa, fazendo parte de uma família com vários irmãos músicos, entre eles o China (Otávio Vianna), com quem tocou junto por um bom tempo. Foi China quem conseguiu o primeiro emprego para o garoto, que começou a atuar profissionalmente aos 14 anos na noite carioca, mesma idade que compôs seu primeiro choro. Ainda na infância, ganhou da avó o apelido de “pizindim”, que logo virou Pixinguinha.
Segundo o musicólogo e professor especialista em música e cultura popular do Instituto de Artes da Unesp, Alberto Tsuyoshi Ikeda, alguns grupos foram fundamentais na ascensão do músico. “Primeiramente Pixinguinha integrou o famoso grupo Caxangá, em 1914, ao lado de músicos como Donga e João Pernambuco. A partir deste grupo, foi formado o conjunto Oito Batutas, muito ativo a partir de 1919”, diz. O “Oito Batutas” se tornaria o primeiro grupo musical brasileiro a conquistar reconhecimento internacional. Entre as inúmeras viagens realizadas, em janeiro de 1922 eles foram convidados a tocar em Paris, por um período de um mês. Entretanto, a temporada parisiense foi estendida para seis meses devido ao grande sucesso que fizeram por lá. Em particular, as notícias da época fazem referência ao sucesso que o jovem menino Pixinguinha fez como flautista nessa turnê. “O grupo foi o primeiro modelo de um conjunto instrumental sólido formado por excelentes músicos, na sua maioria negros, que obteve consagração nacional e internacional”, relata Ikeda.
Já na década de 1930, foi contratado como arranjador pela gravadora RCA Victor, criando arranjos que ganharam notoriedade na voz de cantores como Francisco Alves, Mário Reis e Carmen Miranda. No fim da década foi substituído na função por Radamés Gnattali. Na década de 1940 passou a integrar o regional de Benedito Lacerda, passando a tocar o saxofone tenor. Algumas de suas principais obras foram registradas em parceria com o líder do conjunto. “Essa parceria foi um tanto estranha. Pixinguinha já tinha composições populares registradas apenas em seu nome e que posteriormente ganharam o nome do Benedito. Não sei se Pixinguinha foi benevolente com o parceiro ou se o mesmo pagava pelas parcerias nas composições”, indaga o professor.
Entre as polêmicas que marcaram sua trajetória estão as críticas que recebeu por algumas obras famosas de sua lavra, tais como os choros famosos Carinhoso e Lamentos, acusados de apresentarem uma inaceitável influência do jazz. Hoje em dia, a percepção é que talvez estas composições fossem avançadas demais para a época. A questão de o quanto Pixinguinha sofreu influência do Jazz, e quanto influenciou os jazzistas, até hoje levanta embates.
Imortalizado como compositor por obras que se tornaram clássicos do cancioneiro, como “Rosa”, “Vou vivendo”, “1 x 0”, “Naquele tempo” e “Sofres porque Queres”, Pixinguinha foi autor, na verdade, de mais de mil composições, de diferentes estilos. Na verdade, sua obra é tão vasta que não se sabe ao certo o número de canções que ele deixou. Mas esse legado transformou seu nome em sinônimo de música brasileira de qualidade. “Como diria Vinícius De Moraes ele era “São Pixinguinha”, diz Ikeda. “Creio que seu maior legado para a cultura brasileira é a sua imagem: uma boa pessoa, personalidade de referência, músico genial e virtuoso, compositor prodígio, exímio arranjador e grande difusor da música popular brasileira. Aliás, ele criou os alicerces da música brasileira. Então, esse apelido carinhoso de “São Pixinguinha” vem mesmo diante de tão grande respeito, admiração e veneração que se tem por sua personalidade, inclusive na atualidade. Ou seja, 50 anos após sua morte sua obra segue muito viva.”, enaltece o pesquisador da Unesp.
Pixinguinha passou os últimos anos de sua vida em Ramos, bairro que adorava. Morreu em 17 de fevereiro de 1973 na igreja de Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, quando seria padrinho em uma cerimônia de batismo do filho de um amigo. Foi enterrado no Cemitério de Inhaúma. O episódio reforça o aspecto mítico que envolve o ícone musical “São Pixinguinha”.
Confira a entrevista completa com o professor Alberto Ikeda no Podcast abaixo.
Imagem acima: reprodução.