Em 7 de agosto de 1942 nascia na cidade de Santo Amaro da Purificação, Bahia, um dos sete filhos do casal formado por José Telles Velloso, funcionário do governo estadual, e sua esposa Claudionor Viana Telles Veloso, conhecida como Dona Canô. Desde cedo já se sabia que o garoto seria artista, mas não necessariamente músico. Talvez sua sensibilidade de criança já apontasse para uma trajetória vitoriosa ao lado de outros artistas, contribuindo para conduzir a música brasileira para alguns dos mais elevados patamares no planeta. Por isso, o Brasil celebra este mês os oitenta anos de Caetano Emanuel Viana Teles Veloso, ou Caetano Veloso.
Personagem singular da cultura brasileira e da América Latina, desde o dia 7 passado Caetano se juntou a outros dois ícones da música brasileira e parceiros de vida no clube dos octogenários: Gilberto Gil e Milton Nascimento. Eis uma trindade ímpar que enobrece e orgulha o país.
Compositor, cantor, violonista, escritor e ativista político brasileiro, Caetano foi líder do movimento tropicalista no fim dos anos 60, cuja proposta visava mesclar tradições nacionais e tendências estrangeiras, e ajudou a moldar a cultura nacional. Desde então, inclusive durante o período da Ditadura militar, o multiartista baiano se manteve como um personagem relevante na produção e nas reflexões sobre a cultura brasileira. Reconhecido também no cenário internacional, chegou a ganhar um Grammy no ano 2000 e foi homenageado na edição latina da cerimônia, com o prêmio de Pessoa do Ano em 2012.
Para destrinchar sua formação artística, é necessário destacar o impacto que ele sofreu pelo contato com a bossa nova e em especial João Gilberto. Também inspirou-se em outros ícones como Dorival Caymmi, mas sempre reconheceu em João Gilberto um “mestre supremo”, que iluminou a tradição da música brasileira e abriu caminho para futuras inovações e gerações.
Apesar dos problemas com o governo durante o período da Ditadura militar, que lhe valeram dois anos de exílio em Londres, o compositor baiano consolidou uma obra multifacetada, aberta tanto a influências internacionais quanto à releitura de estilos e ritmos brasileiros. Sua popularidade cresceu de forma significativa também fora do Brasil na década de 1980, atingindo América Latina, Europa, África e Ásia. Seus discos lançados nos Estados Unidos também ajudaram a conquistar um público bem amplo.
Durante as comemorações do aniversário de Caetano, outro grande artista brasileiro, Arnaldo Antunes, fez uma homenagem em suas mídias sociais apresentando uma poesia intitulada “Kaetano”, a qual reverberou de forma significativa no meio artístico e entre os seguidores do músico. O autor da obra é o professor de poesia e arte do Instituto de Artes da Unesp em São Paulo, Omar Khouri.
“Kaetano é uma obra que criei em 1975. Trata-se de uma carta de baralho, um Rei de Espadas, que representa Caetano, um leonino polemista. Sempre o considerei um rei da cultura e da música brasileira”, conta. “Me apropriei de uma foto de Thereza Eugênia, que fazia parte de um catálogo de um show da Gal Costa na época, uma espécie de folheto. Reproduzi e distribui para poucos amigos, mas o trabalho foi publicado na revista MUDA, em 1977. Ao saber que o Arnaldo usou esse material para homenagear Caetano, fiquei positivamente surpreendido. Na verdade o Arnaldo o recuperou para mim. Sou muito grato a ele, figura relevante da MPB”, diz.
Koury vê no baiano “um personagem raro, que enobrece o país”. “Caetano Veloso é um artista que surge a cada cem anos. Ele contribui para que a gente pense o Brasil. Como poucos outros grandes artistas, ele tem um projeto Brasil; ele pensou a nação com soluções, com menos desigualdade, mais justiça social e sem totalitarismos enganosos. Além disso, é uma figura das mais importantes e com penetração no mundo latino hispânico”, diz. “Caetano chega aos 80 anos em plena atividade e com qualidade artística, aliás, essa é a marca da sua carreira”, analisa.
Exímio conhecedor de Poesia Concreta, Omar explica que a relação de Caetano com o estilo poético é relevante e complexo. “O interesse do Caetano pelo concretismo floresceu no início de sua carreira. Na verdade, ele se encantou com a prática poeta e teórica do concretismo. Desde o início, Augusto de Campos e Décio Pignatari admiravam Caetano. O Augusto escreveu bastante sobre ele e teve experimentações verbais no Caetano. Destaco duas leituras feitas por Caetano de poemas do Augusto nos anos setenta: ‘Dias dias dias’ e ‘O Pulsar’. Ele também teve contato com Haroldo de Campos. O Haroldo se hospedou na casa londrina de Caetano e Gil no início dos anos setenta.”
Confira a íntegra da conversa do Podcast Unesp com o professor Omar Khouri no link abaixo.
Foto acima: acervo pessoal.