Antes de reutilizar um material, é fundamental caracterizá-lo e compreender a sua composição físico-química para fazer uma gestão adequada de forma a inseri-lo de volta à cadeia de produção. Além de ambientalmente necessário, este trabalho, que requer conhecimento científico aprofundado, ganha cada vez mais importância econômica, em especial para a construção civil, setor que gera resíduos sólidos variados, como tijolos, lajotas e blocos, e com alto potencial de reutilização.
Essa é uma das áreas de pesquisa da nova estrutura do Laboratório de Caracterização e Gestão de Resíduos Sólidos (LCGRS), inaugurada no dia 22 de junho pela Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Unesp, no câmpus de Presidente Prudente. O laboratório estuda tipos de resíduos industriais e urbanos pensando no reaproveitamento para incorporação nos materiais que são usados pelo setor da construção civil. Sob coordenação do professor Silvio Rainho Teixeira, professor da FCT, o laboratório conta com a participação de alunos e docentes das áreas da física, química e geografia. A presença multidisciplinar contribui tanto para a atuação socioambiental quanto para o aspecto técnico envolvido na caracterização dos materiais analisados.
A função principal do laboratório é conhecer os aspectos físico-químicos dos resíduos sólidos e identificar as suas possibilidades de agressão à população e ao meio ambiente –subsolo e águas do lençol freático, por exemplo. A partir dessa análise, o projeto consegue melhorar a gestão do resíduo e avaliar as chances de reutilizá-lo na forma de matéria-prima. No setor de construção civil, o laboratório trabalhará com resíduos industriais e produtos cimentícios. A partir da areia de fundição descartada, por exemplo, podem ser produzidos blocos de concreto para pavimentação.
“Para aproveitar o resíduo, precisa saber o que tem nele, não pode usá-lo para qualquer coisa. Por isso o nome do laboratório: se não caracterizar, não consegue fazer uma boa gestão”, ressalta o professor Silvio Rainho Teixeira.
Parceria com Ministério Público Federal e Estadual
A nova instalação do laboratório é pioneira na região e objetiva prestar serviços a empresas da região e atender a solicitações de pesquisadores da Unesp e de outras instituições de pesquisa. A construção da estrutura que abriga o laboratório foi viabilizada com o apoio do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPE-SP) e do Ministério Público Federal (MPF), por meio de recursos financeiros provenientes de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), acordo extrajudicial realizado entre a Cesp (Companhia Energética de São Paulo), o MPF e o MPE-SP, dentro da modalidade de projetos socioambientais.
O laboratório está equipado com um espectrômetro de fluorescência de raio-X, que identifica a maior parte dos elementos da tabela periódica presentes em uma amostra e estabelece proporções, faz a difratometria de raio-X, analisando a composição química do elemento encontrado na amostra, e possui também um equipamento de análise térmica aquece a amostra para permitir uma visualização de suas reações, como perda de umidade, perda de água na estrutura e transformação de fase.
No prédio, estão localizados outros três projetos que também utilizarão a infraestrutura recém-inaugurada: o Laboratório de Águas, Águas Residuais e Reúso, coordenado pelas professoras Rosane Freire Boina e Marcela Prado Silva Parizi; o Núcleo de Apoio à Gestão de Resíduos Sólidos Urbanos, dirigido pelo docente Antônio Cezar Leal; e o Laboratório de Materiais Cerâmicos, coordenado pela professora Agda Eunice de Souza Albas.
Mesmo idealizado como um centro de pesquisa, o LCGRS também está envolvido com as dimensões de ensino e extensão. Como o professor Silvio Rainho Teixeira já trabalhou próximo à Cooperativa de Trabalhadores de Produtos Recicláveis de Presidente Prudente, em parceria com o Ministério Público do Trabalho, o laboratório está envolvido em um subprojeto do programa “Coleta seletiva e de rede de reciclagem solidária” e desenvolve um estudo de propostas de tratamentos de recicláveis para aumentar o valor de venda desses materiais, com o objetivo de elevar a renda dos catadores de recicláveis de cooperativas de dez cidades da região.
“O laboratório é fundamental nas pesquisas, todos precisam dessas análises. Os nossos alunos utilizam direto (os equipamentos) e pesquisadores de outros grupos e programas de pesquisa também”, diz o docente.
Antes do estabelecimento da atual estrutura, os pesquisadores precisavam pagar pelas análises ou recorrer à Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), uma parceira do laboratório. Apesar de estar no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Materiais, que envolve dez unidades universitárias da Unesp, o LCGRS agora tem potencial para atender a um público mais abrangente e assim aumentar o número de colaborações acadêmico-científicas.
Apesar do foco na parte físico-química, um dos propósitos do laboratório é informar sobre a importância de descartar corretamente, conhecer e separar os resíduos para reciclagem — há alguns anos, foi distribuída uma cartilha educativa em Presidente Prudente sobre o tema e também já foram feitas ações de conscientização para educar os catadores sobre os riscos do trabalho.
Foto acima: Laboratório de Caracterização e Gestão de Resíduos Sólidos (LCGRS). Crédito: arquivo pessoal.