Especialista em relações internacionais da Unesp avalia cenário inicial de invasão russa da Ucrânia

Hector Saint-Pierre diz que ataques parecem priorizar instalações de comando, controle e inteligência do exército ucraniano, e pondera que eventuais sanções econômicas internacionais já se revelaram ineficientes no passado para brecar o expansionismo de Putin.

Após anúncio feito pelo presidente da Rússia, Vladimir Putin, durante a noite passada, as forças armadas russas deram início nesta madrugada a um ataque contra a vizinha Ucrânia. Diversas explosões foram registradas em diferentes cidades, inclusive a capital Kiev e outras localidades situadas fora das áreas separatistas do Donbass.

Desde o início da crise entre os dois países, o atual momento é o mais grave.

A Presidência da Ucrânia emitiu uma nota nesta quinta-feira, 24/2, alertando para o início dos ataques russos e relatando a morte de mais de 40 soldados ucranianos e cerca de 10 civis.

Durante pronunciamento televisivo feito ontem à noite, Putin disse que o objetivo da intervenção era proteger os guerrilheiros separatistas que ocupam o Leste da Ucrânia. Mas o próprio exército russo confirmou que os ataques estavam sendo feitos contra bases militares e centros administrados por Kiev.

Héctor Luis Saint-Pierre, especialista em segurança internacional e coordenador-executivo do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da Unesp, avalia a invasão das tropas russas na Ucrânia e diz que a postura das lideranças gera muitas dúvidas sobre a realidade do cenário.

Saint-Pierre explica que os ataques iniciais russos têm seguido o padrão já estabelecido nesse tipo de operação, buscando destruir os centros de comunicação, controle e inteligência. Sem estas instalações, o exército ucraniano perderia capacidade de comunicação e de comando, o que minaria enormemente sua capacidade de resistência.

“Minha impressão é que o ataque deve se concentrar na região do Donbass. Se o exército russo entrar na Ucrânia por ali, ele pode envolver as tropas ucranianas na província e exigir sua rendição”, comenta.

O mandatário não falou em uma eventual ocupação de todo o território da Ucrânia. Mas Putin destacou que quem interferir no país vizinho pagará as consequências e ainda acusou os Estados Unidos de terem ultrapassado a linha vermelha ao não atenderem os pedidos feitos pelo governo russo para que a Ucrânia se comprometesse a não aderir à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

Já o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, afirmou que a ação russa ocorre em larga escala. Ele disse que o cenário é de guerra e várias cidades ucranianas estão sob ataque. E que o mundo deve parar Putin.

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, declarou que Putin escolheu uma guerra premeditada que levará a uma catastrófica perda de vidas humanas e sofrimento, e que o ataque é injustificado. Através das redes sociais, ele anunciou que “o mundo irá responsabilizar a Rússia por suas ações”, numa referência à adoção de sanções econômicas internacionais que vem sendo anunciada pelos EUA e por alguns de seus aliados ao longo da semana.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, afirmou que esse é o momento mais triste do seu mandato e apelou a Putin: “Em nome da humanidade, leve de volta as tropas russas. Esse conflito deve parar agora. O que é claro é que essa guerra não tem sentido e viola os princípios da Carta da ONU”.

Héctor Luis Saint-Pierre lembra que as sanções que os Estados Unidos estão buscando articular podem chegar a envolver boa parte da comunidade internacional que comercializa com a Rússia, afetando esses países. “Sanções econômicas foram aplicadas no passado, após a anexação da Crimeia pelos russos em 2014, e não deram em nada. Aliás, esta guerra mostra isso”, diz.

Ouça a íntegra da entrevista clicando abaixo.

Foto acima: Aviões Sukhoi SU-35, da Força Aérea Russa, voando em formação em 2019. Crédito: Deposit Photos.