A alquimia da interpretação em benefício da arte. Eis um dos motes que norteiam a obra de Leila Pinheiro, uma estrela do primeiro escalão da música popular brasileira.
Intérprete, compositora e pianista, Leila iniciou seus estudos de piano aos dez anos de idade. Aos vinte, abdicou da faculdade de Medicina e apresentou seu primeiro espetáculo, Sinal de Partida, em outubro de 1980, em Belém, sua cidade natal. Em maio do ano seguinte, passa a residir na cidade do Rio de Janeiro e gravou seu primeiro LP de forma independente, com produção de Raimundo Bittencourt.
“Aí você vai querer saber como um disco independente pode ter um timaço de músicos. Primeiro, eu sonhei alto. Acho que todos temos que pensar nossos projetos de vida de maneira grandiosa. Em segundo, eu exigi. Já que é para fazer, quero os melhores. Eu estava lá para isso, para me tornar uma artista de ponta”, relembra Leila.
Posteriormente, em 1984, excursionou com o Zimbo Trio em shows fora do país. Porém, o divisor de águas na trajetória ocorreu mesmo em 1985, quando ganhou o prêmio de cantora-revelação no Festival dos Festivais, da TV Globo, onde defendeu o samba Verde (Eduardo Gudin e José Carlos Costa Neto) que se tornou seu primeiro sucesso radiofônico.
Desde o início da sua carreira, Leila teve ao seu lado músicos da grandeza do maestro Tom Jobim, do cantor e compositor Chico Buarque, do violonista Toninho Horta, do guitarrista americano Pat Metheny e dos também pianistas e compositores Francis Hime, Ivan Lins e João Donato. Além do compositor, arranjador e produtor musical, Roberto Menescal, o qual se tornou um grande amigo. “Tive a sorte de me tornar amiga dos meus ídolos. Mas também atribuo essa possibilidade à qualidade do trabalho que sempre busquei apresentar. Sempre fui muito decidida e dedicada à minha profissão e ao meu aprimoramento artístico”, diz Leila.
O CD “Benção, Bossa Nova” (1989) celebrou as três décadas da bossa no Brasil e no Japão, juntando Leila e um de seus principais criadores, Menescal. A obra ganhou proporções inimagináveis. “Apesar da sua enorme relevância, a concepção deste álbum foi a mais fácil de todas. Repentinamente, o Menescal chegou em casa e disse que teve um convite da Polygram japonesa para fazer o disco e que eu seria a intérprete que gravaria as faixas (risos). Aí ele escolheu 30 canções e eu outras 30. Desse crivo, cerca de 18 coincidiam”, conta. “Com a produção e os arranjos do Menescal, o processo foi facilitado pelo nosso entrosamento e pelos formatos de medley bem costurados, que são uma característica dele. Gravamos em 15 dias. Numa paulada só. Muito rápido para um processo de um disco”. Segundo Leila, nessa fase, a Bossa Nova estava em baixa no Brasil. “Eu entrei em pânico quando ele me disse que o disco seria lançado aqui no país. Mas ele apostou a casa dele que o trabalho despontaria. A estreia foi no RJ, durante os dias de carnaval. De cara, foi um estrondo. Sucesso total. Em seguida, excursionamos dois anos pelo Brasil e também no exterior. Alí foi o start da minha carreira no Japão, que existe até hoje”, relata.
Já “Coisas do Brasil” (1993), produzido pelo pianista César Camargo Mariano, e “Catavento e Girassol” (1996), com as parcerias de Guinga e Aldir Blanc, são outras excelentes referências quanto às escolhas e parceiros da intérprete. Em seus 41 anos de exímia carreira, completados em outubro de 2021, gravou 23 CDs e três DVDs, tendo acumulado relevantes premiações interpretando o cancioneiro brasileiro clássico, apresentando novos compositores e fazendo releituras de sucessos populares de todos os gêneros em seus álbuns, além de shows nos quatro cantos do mundo.
Leila é uma das preciosidades que temos em nossa cultura brasileira. Seu ecletismo, sua voz bem acentuada, a postura imponente no palco e sua lucidez na elaboração nas obras artísticas e na vida a tornam uma artista de enorme prestígio, dentro e fora do Brasil.
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