Enquanto o Centro de Saúde Escola (CSE), ligado à Faculdade de Medicina do câmpus de Botucatu (FMB-Unesp), presta atenção primária à saúde da população de dois grandes bairros da cidade, o Centro de Assistência Toxicológica (Ceatox), do Instituto de Biociências de Botucatu (IBB-Unesp), destaca-se como referência nacional em toxicologia, atendendo a pessoas expostas a substâncias químicas de toda a região.
Os trabalhos realizados pelo Centro de Saúde Escola e pelo Ceatox, ambos localizados no câmpus de Botucatu, protagonizam esta edição da série de reportagens Unesp Cuida, que enfoca as unidades auxiliares da Universidade que prestam diversos tipos de assistências em saúde gratuitas. Cabe às unidades auxiliares dar suporte acadêmico a unidades universitárias, realizando, entre outros objetivos, atividades de prestação de serviços em prol da sociedade. Só ao longo de 2019, recorte desta série, as unidades auxiliares da Unesp foram responsáveis por cerca de 630 mil assistências ou atendimentos em saúde, em seis municípios diferentes.
Tais números representam apenas uma parcela dos serviços em saúde prestados com o apoio da Unesp — em Botucatu, por exemplo, o Hospital das Clínicas (HCFMB) tem relação umbilical com a Universidade e seus estudantes, de graduação e pós-graduação. Os números da Unesp Cuida são relativos a 2019 porque é o último ano em que há um quadro estatístico confiável para dimensionar o alcance desses serviços. Saiba mais sobre o Centro de Saúde Escola e o Ceatox nesta quarta e penúltima reportagem da série.
Modelo de sucesso na saúde pública
As duas unidades do Centro de Saúde Escola atendem, juntas, a cerca de 30% da população de Botucatu, cidade com pouco menos de 150 mil habitantes. O centro é responsável pela atenção primária aos moradores da Vila dos Lavradores e da Vila dos Ferroviários, dois grandes bairros do município.
Em 2019, ano anterior à pandemia, a Unidade da Vila dos Lavradores realizou 68.427 atendimentos e a Unidade da Vila Ferroviária realizou 33.719.
“O CSE faz toda a atenção primária, de cuidados à criança, atenção à saúde do adulto, idoso e mulher”, diz a médica Eliana Goldfarb Cyrino, supervisora da unidade e professora da Faculdade de Medicina da Unesp (FMB). “Além da atenção primária, tem uma interface com algumas atividades assistenciais mais especializadas nas áreas de saúde mental, odontologia, fisioterapia, práticas integrativas, entre outras.” A docente destaca a existência de equipes multiprofissionais e do esforço para se realizar um trabalho colaborativo envolvendo profissionais como médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, fonoaudiólogos e psicólogos.
O Centro de Saúde Escola foi criado em 1972. “Foi fruto de um movimento de horizontalização na Secretaria de Saúde do estado de São Paulo no final dos anos 1960 e começo dos 1970”, diz o médico Antonio de Padua Pithon Cyrino, que foi diretor do CSE por 12 anos.
Antonio Cyrino conta que, anteriormente, havia unidades especializadas para tratar diferentes condições de forma separada e, com o surgimento dos centros de saúde, houve a unificação da oferta de diversos tipos de tratamento. Profundo conhecedor da história da criação desta unidade, ele relata que havia uma certa resistência a esse modelo, por isso, o então secretário da Saúde, o sanitarista Walter Leser, fez uma articulação com as universidades e convidou as escolas de medicina mais tradicionais a criarem Centros de Saúde Escola, com apoio da Secretaria, para que esses modelos pudessem ser melhor testados.
“Esse serviço foi criado como uma unidade de caráter experimental para testar modelos de atenção e ser, ao mesmo tempo, um espaço de formação não só para os estudantes de graduação e pós, mas também para profissionais de saúde que já atuavam”, conta Antonio Cyrino. Ele observa que, apesar de o CSE ter surgido antes do Sistema Único de Saúde (SUS), ele já seguia uma série de princípios que depois foram adotados pelo SUS, como regionalização, hierarquização do serviço, uma abordagem mais voltada ao indivíduo, à família e à comunidade. “O CSE foi se atualizando e hoje é uma unidade auxiliar da FMB-Unesp, mas é plenamente integrado ao SUS e segue as orientações da Secretaria de Estado de Saúde, que é quem faz a gestão local do serviço.”
Durante a pandemia de covid-19, o Centro de Saúde Escola desempenhou um papel importante na resposta à emergência no município de Botucatu. “A gente mudou todo o processo de trabalho para poder atender a pacientes com sintomas respiratórios ligados à covid”, afirma Eliana. Do lado de fora das duas unidades, foram instaladas tendas para o atendimento de pacientes com sintomas respiratórios. E pacientes com outros problemas de saúde continuaram a ser atendidos do lado de dentro. Assim foi possível prevenir a exposição de pacientes de outras áreas aos que tinham suspeita de covid-19.
Também foi criado um programa de voluntariado para os alunos de medicina e enfermagem que queriam colaborar com o combate à pandemia. “Desenvolvemos com os estudantes o teleatendimento em enfermagem e medicina. Os estudantes também fizeram muitos estudos epidemiológicos. Faziam contato com pacientes covid positivos todos os dias para perguntar como estavam. Tivemos mais de 90 estagiários”, conta Eliana.
Houve um grande esforço para diminuir o número de atendimentos presenciais para que pacientes não circulassem em ambientes com risco de contaminação. “Fizemos muita orientação por telefone, espaçamos as consultas, usamos o estacionamento como espaço de vacinação”, conta a supervisora do CSE. Além do atendimento à saúde, o Centro de Saúde Escola também tem feito um trabalho de informar a comunidade sobre como se proteger do vírus, orientando profissionais sobre as precauções que devem ser tomadas no trabalho, combatendo a desinformação (fake news) e conscientizando sobre a importância da vacina.
Atendimentos pós-exposição a substâncias químicas
Criado na década de 1970, ligado ao Departamento de Farmacologia, o Centro de Assistência Toxicológica (Ceatox) se tornou uma referência nacional em toxicologia e atua na formação de estudantes, na realização de pesquisas e no atendimento à comunidade. O centro oferece atendimento clínico e ambulatorial a pacientes de Botucatu e região expostos a substâncias químicas como metais pesados, inseticidas organoclorados, organofosforados e carbamatos, piretróides, herbicidas, rodenticidas, entre outros, oferecendo tratamento médico de desintoxicação para casos de intoxicação crônica.
A equipe multiprofissional — constituída por médica, técnica em enfermagem, farmacêuticos, químicos, pesquisadores e técnicos especializados — realiza uma média anual de 900 atendimentos de triagem, que geram por volta de 350 consultas médicas e 800 coletas de sangue para exames, segundo Arielle Cristina Arena, professora do Instituto de Biociências do câmpus de Botucatu (IBB-Unesp) e atual supervisora do Ceatox.
Os pacientes chegam ao centro encaminhados por hospitais, unidades básicas de saúde, clínicas particulares, pelo Centro de Referência em Saúde do Trabalhador ou procuram a unidade espontaneamente, por indicação de conhecidos. Em 2019, o Ceatox realizou 249 atendimentos médicos gratuitos e 681 atendimentos ambulatoriais gratuitos. Entre 2018 e 2019, foram 10.646 exames realizados, dos quais 3.353 foram gratuitos. Em 2020, o Ceatox deixou de ser uma unidade auxiliar, mas segue ligado ao IBB-Unesp e prestando os mesmos atendimentos.
“Além deste acompanhamento toxicológico, há aproximadamente dois anos iniciamos uma análise do perfil nutricional destes pacientes com alunos da nutrição e docentes, e a etapa seguinte é atuar na tentativa de melhorar o aporte nutricional. Neste ano, nos estruturamos também para acompanhar os pacientes do ponto de vista farmacêutico-clínico”, afirma Arena.
O Ceatox também faz parte de uma rede de unidades que atendem o Disque-Intoxicação, serviço criado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pelo número 0800-722-6001. Este é o número que aparece nos rótulos e bulas de produtos regulados pela agência. Tanto profissionais da saúde podem ligar para saber como tratar um paciente intoxicado quanto a população geral pode ligar para pedir informações sobre qualquer tipo de intoxicação. O centro atende, em média, dez ligações por dia por meio dessa rede.