A Real Academia de Ciências da Suécia anunciou nesta terça-feira os ganhadores do prêmio Nobel de Física de 2021. A láurea foi compartilhada entre o nipo-americano Syukuru Manabe e o alemão Klaus Hasselman, ambos pesquisadores na área de climatologia, e o italiano Giorgio Parisi, físico especializado no ramo da mecânica estatística.
No texto em que divulgou o nome dos escolhidos, a Real Academia de Ciências da Suécia afirmou que o objetivo era destacar a pesquisa envolvendo sistemas complexos. No caso de Manabe e Hasselman, a justificativa foi a “modelagem física do clima da Terra, a quantificação das variabilidades e a confiabilidade das predições para o aquecimento global”. No caso de Parisi, o texto citou a sua contribuição para o estudo de materiais desordenados e processos aleatórios. Parisi ficará com metade da premiação total de US$ 1 milhão outorgada pela Academia, e a outra metade será compartilhada por Manabe e Hasselman.
O físico espanhol Ricardo Martinez Garcia, pesquisador ligado ao Instituto de Física Teórica da Unesp, explica que a mecânica estatística procura descrever as propriedades macroscópicas da matéria, que podemos medir com facilidade, a partir do estudo do comportamento dos átomos que a compõem. “Ela faz esta ligação entre o macro e o micro”, diz.
O trabalho de Parisi focou materiais desordenados que apresentam propriedades de sistemas complexos. Nos sistemas que são classificados desta forma, a interação entre os componentes leva ao surgimento de respostas não lineares e inesperadas. Neles, não basta estudar isoladamente o comportamento de cada parte para que se possa fazer uma predição do resultado final. É preciso fazer uma análise do todo. Um bom exemplo de sistema complexo é o cérebro. Se estudarmos apenas o funcionamento de cada neurônio não poderemos explicar as capacidades que ele tem. É preciso uma abordagem holística mais abrangente”, compara.
Caótico, porém previsível
A área de estudos do clima e do tempo também lida com um sistema extremamente complexo, onde interagem diversos fatores, como a atmosfera, o oceano, as diferentes características dos ecossistemas e a ação humana — para citar apenas alguns. Manabe e Hasselman foram pioneiros em desenvolver ferramentas que permitiram lançar as bases do moderno estudo do clima, e para evidenciar a ocorrência do aquecimento global e a participação humana neste processo, explica Luana Bortolozo, meteorologista e professora do Instituto de Ciências e Tecnologia da Unesp em São José dos Campos.
“A partir dos anos 1960, Manabe criou o primeiro modelo para descrever a interação entre a irradiação solar e o transporte de massas de ar. Isso criou os fundamentos para os modelos climáticos que usamos atualmente para prever tanto o tempo, que é uma previsão de curto prazo, como o clima, que tem um horizonte de tempo maior”, diz ela.
Já Hasselman conseguiu explicar porque, embora o tempo seja algo caótico e caracterizado pela aleatoriedade – outro traço dos sistemas complexos, os modelos climáticos podem, sim, permitir previsões confiáveis”. Ele também conseguiu identificar traços característicos que permitem diferenciar os efeitos atmosféricos produzidos por fenômenos naturais, tais como grandes erupções vulcânicas, daqueles gerados pela atividade humana. Isso contribuiu para consolidar a ideia de uma origem antrópica para o aquecimento global. “Em minhas aulas, costumo apresentar um gráfico que mostra com clareza como os fatores naturais não bastam para explicar o aumento na temperatura média que observamos ao longo do século 20. E esse gráfico apresenta trabalhos dele”, conta.
Garcia se disse positivamente surpreso com o anúncio da premiação. “Não esperava isso. A área de sistemas complexos ainda é nova e está crescendo. Este Nobel vai ajudar a atrair o interesse de mais alunos para este campo, e torná-lo mais conhecido junto à população em geral”, diz.
Imagem acima: reprodução da medalha conferida aos ganhadores do Prêmio Nobel. Crédito: Nobel Foundation.