Alunos e egressos da Unesp já abriram mais de 1.300 empresas nos últimos 30 anos, mostra pesquisa

Levantamento mostra que start-ups e spin-offs nascidas da universidade geraram milhares de empregos e têm faturamento médio anual de R$ 2,5 bilhões.

Resultado de uma troca direta de conhecimentos com a Universidade ou da iniciativa empreendedora de seus egressos, as empresas filhas da Unesp já geraram milhares de oportunidades de trabalho e alcançaram faturamento médio anual de R$ 2,5 bilhões. É o que mostra um levantamento feito pela Agência Unesp de Inovação (AUIN) e publicado em dezembro do ano passado, no formato e-book

Intitulado “Empresas Filhas, Startups e Spin-Offs da Unesp”, o levantamento é o primeiro feito pela AUIN para mapear iniciativas empreendedoras geradas, direta ou indiretamente, no âmbito da Unesp. O esforço buscou dimensionar a contribuição da Universidade para movimentar a economia brasileira, por meio de empresas criadas por alunos e ex-alunos no interior paulista, e também em outras regiões do país.  

No total, foram mapeadas 1.365 empresas filhas da Unesp criadas nos últimos 30 anos, a partir de experiências originadas ou esboçadas no ambiente universitário, tanto nos cursos de graduação e nos programas de pós-graduação quanto em iniciativas isoladas de empreendedorismo de unespianos.

Dessas 1.365, 307 responderam aos contatos feitos pela Agência Unesp de Inovação. Isso permitiu estimar em R$ 2,5 bilhões o faturamento médio anual das empresas respondentes, e em mais de 10 mil o total de pessoas envolvidas com suas atividades, entre sócios, colaboradores fixos, eventuais e estagiários.  

Como nem todas as empresas declararam o faturamento médio anual — pois, a depender do estágio da organização, esta informação é extremamente estratégica — as estimativas foram feitas de maneira criteriosa, em função do porte de cada empresa, de modo a evitar uma superestimação dos dados. Na visão do professor Marcelo Orlandi, assessor da AUIN que também examinou as informações, o cálculo que indica o faturamento médio anual de R$ 2,5 bilhões  “é até conservador”. 

O levantamento indica que as empresas nascida da Unesp pagam impostos sobre um montante bem próximo da cota-parte do ICMS (imposto que é a principal fonte de financiamento das universidades estaduais paulistas) repassada à Unesp em 2020: exatos R$ 2.583.212.185. Cabe lembrar que é sobre o faturamento das empresas que são aplicados os modelos de tributação que, grosso modo, resultam nos impostos pagos para financiar serviços públicos, como a educação. 

 

Perfil das empresas

Dentre as empresas que informaram o número de funcionários e colaboradores envolvidos em suas atividades, 80% são classificadas como microempresas (até nove empregados) e pouco menos de 20% são empresas de pequeno porte (de 10 a 49 empregados). Mas há também organizações de médio e até grande porte. É o caso da Predilecta, uma das principais indústrias de alimentos do Brasil, que gera mais de 1.300 empregos diretos e foi formalizada no início dos anos 1990. 

A análise do ano de formação das empresas mapeadas registra o avanço das iniciativas de empreendedorismo e inovação no ambiente universitário ao longo das últimas décadas. Apenas 12 organizações nasceram nos anos 1990, número que quase quadruplicou na década seguinte e atingiu o patamar de um ecossistema mais estruturado entre 2011 e 2020. 

Saulo Guerra, diretor da AUIN e professor do Departamento de Engenharia Rural e Socioeconomia na Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA) do câmpus de Botucatu, comenta o que motivou essa virada:

“Nos últimos 15 anos, o foco no empreendedorismo cresceu. Começamos uma força-tarefa para fomentá-lo entre os jovens que, às vezes, depois de se formarem, ficavam sem mercado. Eles precisavam empreender, mas não sabiam como fazer. A Unesp começou então a trabalhar nessa área para gerar oportunidades aos egressos.”  

Hoje, existem 19 NITs (Núcleos de Inovação Tecnológica) espalhados pela Universidade. É através deles que são feitas todas as ações de empreendedorismo e inovação. “Também agimos para fomentar disciplinas de graduação e pós-graduação em empreendedorismo e inovação. Nos últimos dez anos, mais de 50 disciplinas foram criadas e são oferecidas, de forma obrigatória ou optativa. Outra iniciativa são as parcerias com incubadoras e parques tecnológicos, que são portas de saída para os nossos egressos”, completa o diretor da AUIN. 

Um terço das empresas que participaram do estudo da AUIN surgiu entre 2018 e 2020, o mesmo triênio em que foi realizado o levantamento da agência. “No início, em 2018, bolsistas de graduação fizeram contatos com professores, estudantes e ex-alunos para tentar encontrar essas empresas filhas. Em 2019, abrimos uma área no nosso site e lançamos uma campanha em vídeo para que as pessoas entrassem em contato com informações sobres empresas com o DNA da Universidade. Também fizemos buscas ativas no LinkedIn, no Google e no portal PIPE (Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas) da Fapesp”, detalha a jornalista Tainah Veras, coordenadora da campanha de busca, validação e visibilidade das empresas filhas da Unesp. 

O trabalho que resultou no e-book também constatou que há empreendedores unespianos nas 24 cidades paulistas que abrigam os câmpus da Universidade, com predomínio de Bauru (mais de 20% do total), Botucatu (acima de 15%) e Jaboticabal (mais de 10%). Quanto às áreas de atuação no mercado, o perfil das empresas é bastante diversificado: as áreas de Agrárias, Tecnologia da Informação e Comunicação/Marketing são os destaques, englobando, juntas, mais de 30% das iniciativas que participaram do levantamento. 

O professor Marcelo Orlandi, assessor da AUIN, ressaltando o diferencial das empresas originadas das universidades:

“A principal vantagem destas spin-offs e startups é que elas possuem conhecimento aplicado em seus produtos. Há tecnologia e o valor agregado é muito alto. Não é fácil para outras empresas copiarem esse conhecimento.” 

Segundo o relatório, estudantes que participaram de entidades universitárias e de iniciativas de ensino e extensão conseguiram desenvolver habilidades importantes para sua atuação profissional posterior. Dentre os respondentes, 23% relataram haver colaborado com uma empresa júnior, 17% integraram grupos de pesquisa, 13% foram de alguma associação atlética e 8% participaram do Centro Acadêmico. Questionados sobre o impacto da Unesp em sua trajetória empreendedora, eles apontaram como pontos positivos a formação da rede de contatos, os conhecimentos, experiências e interações com discentes e docentes, o acesso à infraestrutura e o fortalecimento do senso crítico, do crescimento pessoal, da criatividade e da responsabilidade social.

Cases de sucesso surgidos da Unesp

Reconhecida como um caso de sucesso na área de Biotecnologia, a startup Crop foi fundada em 2019 por Aruã Prudenciati quando ele ainda estava na graduação em Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia pela Faculdade de Ciências Agronômicas (FCA) da Unesp, no câmpus de Botucatu. Principal executivo da empresa até hoje, ele revela que o foco de atuação mudou no último ano devido à pandemia do novo coronavírus. Ao ser criada, a Crop tinha como objetivo oferecer soluções tecnológicas para o tratamento de doenças crônicas, principalmente aquelas relacionadas às comorbidades provocadas pelo colesterol alto. “Com o surgimento da Covid-19, os produtos de combate ao coronavírus, como  antissépticos para as mãos, purificadores de ar, viraram nosso carro-chefe”, conta Aruã Prudenciatti.  

Nos quatro primeiros meses de atuação voltada à pandemia, a Crop faturou mais de R$ 180 mil e auxiliou o lançamento de três produtos antivirais bem-sucedidos, detalha o unespiano. Aruã define a importância da Unesp no desenvolvimento das atividades de sua empresa como “fundamental”. A Crop aluga a estrutura da universidade, em uma parceria que possibilita a produção científica e também traz retornos financeiros a ambas as organizações.  

“Construir laboratórios é muito caro, exige um custo pré-operacional grande. Os convênios que temos com a Unesp permitem que a gente use a estrutura, pague por esse serviço e desenvolva tecnologias em conjunto. Sem a estrutura da Unesp, a Crop não conseguiria rodar o seu modelo de negócios atual”, explica. 

O biotecnólogo também mencionou a influência da Universidade no início de sua trajetória empreendedora. “A Crop surgiu na minha graduação. Eu e meus sócios (Guilherme Luz e Lucas Ribeiro) éramos da mesma turma na Unesp em Botucatu. O curso de Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia é muito voltado à inovação, os professores sempre tentam trazer esse lado. Então, ao invés de provas, muitas disciplinas exigiam projetos em que os alunos tinham que propor uma solução para um problema existente, com base no que estávamos aprendendo. Isso plantou sementinhas na gente e, depois, elas foram sendo regadas à medida que fomos trilhando a nossa trajetória”, resume. 

Representante do segmento industrial, a BirminD é outra empresa filha da Unesp que vem ocupando um crescente espaço no mercado. Fundada por Diego Mariano e Raphael Costa, egressos do curso de Engenharia de Controle e Automação do câmpus de Sorocaba, a companhia já prestou serviços e construiu parcerias com gigantes como BRF, Coca Cola, Eurofarma, Hyundai e Suzano, entre outros. Seu nicho é oferecer soluções de otimização e automação industrial, propiciando a economia de recursos na atividade produtiva. 

“Somos uma empresa focada em transformar o ‘monstro’, que é a inteligência artificial, em algo que possa ser facilmente aplicado por qualquer trabalhador de fábrica. Desenvolvemos softwares que se comunicam com as máquinas e entendem o que os dados dizem delas. Por exemplo: ‘a temperatura desta máquina está acima do que deveria?’ Ou seja, usando uma metáfora, ‘se estou esquentando um forno além do que ele deveria, isso significa que estou gastando mais gás para fazer meu bolo.’ No fim das contas, o ‘bolo’ da indústria custa milhões por ano”, explica Diego Mariano, principal executivo da BirminD. 

A empresa  conta com um quadro de 23 funcionários, com previsão de expansão em um futuro próximo: em julho de 2020, a BirminD foi comprada pela multinacional brasileira WEG S.A., uma das maiores fabricantes de equipamentos elétricos do mundo, presente em mais 35 países. Além do impacto socioeconômico, as soluções da empresa também já geraram contribuições ambientais. “Em 2019, graças à instalação do nosso software no forno de uma empresa cliente, foi possível identificar e solucionar uma oscilação de consumo. O resultado foi uma diminuição de 700 toneladas de poluentes no meio ambiente”, diz o engenheiro unespiano. 

Para Marcelo Orlandi, que atua no Instituto de Química do câmpus de Araraquara, os resultados do levantamento mostram os benefícios de fazer investimentos na universidade. “Não existe país no mundo que tenha se desenvolvido sem conhecimento. Se você quiser ser um país desenvolvido no futuro, você precisa enxergar a ciência e a tecnologia como ‘investimentos’, e não como ‘gastos’. É algo que você planta hoje e vai colher frutos positivos lá na frente”, afirma o assessor da AUIN.

Crédito da imagem acima: Gorodenkoff/iStock