Prato do Dia discute a importância do design para melhorar a vida das pessoas

Jornalista, curadora e Doutora Honoris Causa pela Unesp, Adélia Borges fala ao podcast sobre como bons projetos podem impactar nosso cotidiano e comenta a valorização de uma produção identificada com a diversidade e a cultura brasileira

“Vejo o design como um instrumento para melhorar a qualidade de vida das pessoas”. Esta é a afirmação de abertura do site de Adélia Borges, jornalista e curadora especializada na área de design e que, em 2021, foi condecorada com o título de Doutora Honoris Causa pela Unesp por sua contribuição à pesquisa e a difusão do design brasileiro e do Sul Global. Apesar de estar constantemente associado à estética e ao mercado de luxo, o design possui uma grande capacidade de impactar o cotidiano da população, e a convidada desta edição do Prato do Dia tem boa parte de trajetória profissional dedicada a transmitir ao público a potência desta área do conhecimento. 

Precursora em levar o design para o grande público por meio de reportagens e colunas em grandes veículos de comunicação nos anos 80 e 90, Adélia ainda hoje desempenha um papel central em projetar o que há de novo no design brasileiro. Contudo, nas últimas décadas seu olhar de pesquisadora tem estado mais atento à produção de grupos sociais que historicamente não estiveram no centro das atenções de críticos e curadores, em uma perspectiva que, segundo a entrevistada, coloca o design como um agente capaz de valorizar e impactar positivamente essas comunidades.

Em sua participação no programa, Adélia Borges comenta sobre o impacto da exposição “Design para os outros 90%”, da curadora norte-americana Cynthia E. Smith, em sua forma de olhar o design. De forma geral, a mostra discute o fato de a maioria dos projetos de design serem pensados e destinados aos 10% da população com maior poder aquisitivo, instigando a reflexão de quais projetos poderiam ser destinados para os 90% restantes. Para Adélia, trabalhar com essa outra parcela majoritária permite debruçar-se não apenas em trabalhos voltados para essa parcela população, mas também nos projetos realizados com eles e por eles. “O design para, com e pelos outros 90%, que é quem me interessa”, destaca a jornalista.

Autora ou coautora de mais de 40 livros publicados em nove idiomas, Adélia é uma entusiasta do design, mas mantém uma reflexão crítica de que, como qualquer outra área do conhecimento, ele pode ser usado para interferir de forma positiva ou negativa na vida das pessoas. A convidada cita como exemplo um caso ocorrido em 2021, em que a prefeitura de São Paulo instalou pedras sob viadutos da Zona Leste da cidade. A ideia era afastar a população em situação de rua de se abrigar nesses locais, o que a entrevistada classificou como “design da violência”. Refletindo sobre o episódio, Adélia destaca a necessidade de uma prática ética e consciente da profissão. “Pensar em um design que possa contribuir com a sociedade, que possa não ser impositivo em relação aos segmentos da sociedade, que seja respeitoso e que seja construído numa polifonia, em várias vozes”, afirma.

Em sua participação no podcast, Adélia explica que o design está comumente associada à criações produzidas após a Revolução Industrial, com produção em larga escala, mas que não é exagero pensar que essa atividade acompanha a humanidade há milhares de anos, e que é possível imaginar que o primeiro projeto de design criado pelo homem poderia perfeitamente ser uma ferramenta de pedra e madeira, por exemplo. “Eu entendo que o design é a capacidade que nós, seres humanos, temos de transformar as coisas ao nosso redor para atender as necessidades que possuímos e aos nossos desejos”, explica. 

Neste sentido, a curadora lembra que mesmo populações em situação de vulnerabilidade encontram estratégias de sobrevivência e usam a criatividade para solucionar problemas do seu cotidiano. “Não é privilégio dos formados fazer um bom design. Se sair na rua, verá soluções mega inventivas que as pessoas fazem para o seu dia a dia. Eu gosto muito desse que é também chamado de design vernacular”, comenta.

Um dos elementos mais marcantes da trajetória profissional da entrevistada do Prato do Dia é a valorização da diversidade brasileira e das suas características territoriais. Em seu discurso de agradecimento ao receber o título concedido pela Unesp, a jornalista destacou essa característica. “Prossigo nesta jornada de valorizar os saberes e fazeres do design e do artesanato do sul global, num olhar que está no meu DNA mais profundo.”

No podcast Prato do Dia, Adélia afirma que um de seus grandes interesses no momento é se aprofundar ainda mais no que ela chama de “design do território”, o qual busca compreender espaços que muitas vezes estão distantes do olhar do senso comum, como bairros periféricos, tentando observar as suas características, carências e potencialidades. “Estou cada vez mais interessada em estudar e me aprofundar na relação do design com os campos da inovação social, do desenvolvimento dos territórios e da valorização das identidades culturais locais”, afirma Adélia. E complementa: “O design como um agente de transformação social, é isso que me move agora”.

A íntegra do Prato do Dia pode pode ser ouvida no player abaixo, no site Podcast Unesp ou nas plataformas especializadas Spotify, Deezer, Google Podcasts e Amazon Music Podcasts.