Embora não esteja no topo das paradas, o rock nacional segue pulsante, e seus maiores nome continuam colhendo os frutos de um trabalho que se estende já por décadas. Um destes grandes nomes é a Banda paulista Ira!, que em 2025 vai comemorar com uma turnê especial os 20 anos de um dos trabalhos mais relevantes de sua carreira, o álbum Ira! Acústico MTV.
O trabalho, lançado em 2004, foi um dos cinco mais bem-sucedidos da série “Acústico MTV” , com vendas que bateram na casa do milhão, entre CDs e DVDs. Nesta turnê de 2025, os líderes do Ira!, Nasi (voz) e Edgard Scandurra (violão e voz), serão acompanhados por Daniel Scandurra (baixolão), Evaristo Pádua (bateria), Johnny Boy (teclados e violão), Jonas Moncaio (violoncelo) e Juba Carvalho (percussão).
O grupo vai revisitar as 19 faixas originais do álbum, e possivelmente apresentar algumas novas músicas neste formato diferenciado. Confirmados no repertório estão os hits que se tornaram clássicos do Rock BR, como Envelheço na Cidade, Dias de Luta, Flores em Você, Núcleo Base, 15 Anos e Tarde Vazia, assegurando a alegria dos antigos e novos fãs da banda, e daqueles que curtem especificamente o trabalho acústico.
Em sua primeira entrevista sobre este projeto, concedida exclusivamente ao Podcast Unesp, Marcos Valadão Ridolfi, o Nasi, explica as particularidades do novo trabalho.
“Trata-se de um dos trabalhos mais populares do Ira!. Por isso, a expectativa para esse show é grande. Nesses últimos 20 anos, em todos os lugares onde vou, pessoas me abordam e dizem que adoram o nosso acústico. Então, devem ser shows grandes, por tudo que esse álbum representa. Faremos uma turnê especial”, diz.
Nasi conta que a formação da banda que se apresentará na turnê é bem parecida com aquela que gravou o trabalho original. O virtuosismo de seus integrantes é uma garantia de que se conseguirá reproduzir uma sonoridade bem próxima à do espetáculo de duas décadas atrás, inclusive nos timbres dos violões e dos arranjos para vozes. Mas os ensaios, que vão começar logo após o carnaval, vão incluir também novos números. “O repertório deve ganhar outras canções, que já permeiam nossas mentes, que caem bem nessa roupagem”, diz Nasi.
Separação e volta
O Ira! Passou por uma separação em 2007. O retorno aos palcos aconteceu em 2014, num show histórico no Centro de São Paulo durante a Virada Cultural. Seguem na banda dois de seus integrantes originais, Nasi e Scandurra. Desde que a dupla voltou a trabalhar junta, novos álbuns da banda foram lançados, e também da carreira solo de ambos .
Algumas das músicas gravadas originalmente para o álbum acústico de 2004 ganharam seu espaço no repertório dos shows elétricos da banda, e até hoje são executadas em palcos por todo o país. “Por exemplo, a nossa versão de Train in Vain, do The Clash, foi feita especialmente para o acústico, mas se tornou uma canção importante nos shows que ocorreram na última década”, diz Nasi. A regravação teve que ser autorizada pelos representantes da banda britânica, e o ok final só chegou no último momento. “Pensa na importância dessa música pra mim!”, diz o vocalista. Outra favorita é Por Amor, de Zé Rodrix e Reynaldo Bessa. “Tenho um carinho enorme pelo Zé Rodrix. É um gênio da música brasileira, e tive a honra de poder regravar algumas de suas canções.”
A estreia da turnê está marcada para o dia 10 de maio, na casa de shows Vibra São Paulo. Os ingressos estão disponíveis na plataforma Uhuu.com, e também nas bilheterias físicas da Vibra São Paulo, do Teatro Bradesco e do Teatro Sabesp Frei Caneca. Outras cidades, incluindo capitais como Brasília, Belo Horizonte, Porto Alegre e Recife, também já têm shows confirmados.
Banda quebrou regra da MTV
O álbum Ira! Acústico MTV teve produção de Rick Bonadio saiu pelo selo Sony Music em 2004. A turnê do álbum, no entanto, se estendeu até 2005. Nasi relembra a jornada da banda até a gravação.
“Após atravessarmos uma parte dos anos 1990 de forma meio conturbada, o Ira! deu uma retomada no período entre o final daquela década e o início do novo século. Lançamos álbuns como Isso é Amor, Entre Seus Rins e MTV Ao Vivo. E todos tiveram boas repercussões”, conta. A boa acolhida destes trabalhos se deveu a vários fatores, que incluíram canções que tocaram bem nas rádios, como Bebendo Vinho, clipes bem produzidos e premiações como a de melhor artista popular pela APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte).
No começo do século 21, a MTV trabalhava com dois formatos característicos. Um era o já mencionado “ Acústico MTV”. Outro era o “Ao Vivo”, no qual as performances registradas utilizavam instrumentos elétricos. E quem gravava em um formato era automaticamente excluído do outro. O Ira!, porém, já tinha gravado um “Ao Vivo” no ano de 2000 antes que a direção da emissora quebrasse a regra não escrita e os convidasse para fazer o seu acústico.
“Vejo que esse convite veio pelo fato de que o Ira! já tinha uma boa bagagem de canções no formato de balada que se encaixavam no modelo. Por exemplo, Tolices e Mudanças de Comportamento já haviam sido gravadas nesses moldes. Então, estávamos prontos. Iniciamos os contatos com o Rick (Bonadio, o produtor) e tudo começou a se desenrolar. Mas é importante destacar também que projetos acústicos que deram certo, como o dos Titãs, do Capital Inicial, da Cássia Eller e do Ira! (os cinco mais bem-sucedidos no formato) resultaram de trajetórias artísticas consistentes, que permitiram tanto aos artistas quanto à emissora obter bons resultados”, diz.
Olhar místico para sua trajetória
Nasi completou recentemente 63 anos de idade. Muito conhecido como artista de rock e pop, sua trajetória também passou por blues, soul e até rap. “Passei por muitas coisas na carreira, boas e más. É um pouco vago dizer que é importante fazer o que a gente ama. Mas, para algumas coisas, a gente precisa contar com a sorte. Por exemplo, eu prestei Veterinária no câmpus da Unesp em Botucatu em 1980. Gostaria de ter cursado, mas, se eu tivesse entrado, o Ira! não aconteceria”, diz.
Na mesma época, ele também passou no vestibular para cursar Zootecnia em uma faculdade na cidade de Espírito Santo do Pinhal. Seus pais, porém não tinham recursos para custear sua estadia em outra cidade, nem para pagar uma faculdade particular. Nasi conta que ficou triste. Porém, foi exatamente a partir de seu retorno à capital paulista que o Ira! teve início.
“Encontrei o Edgard em um ponto de ônibus. Ele me convidou para fazer um show na PUC de São Paulo que foi considerado como a primeira apresentação da banda. Não tínhamos grandes expectativas, a gente achava que era só um barato. Não havia espaço para o rock nacional. E, de repente, estávamos gravando, fazendo shows… Se não fosse a persistência, não estaria aqui. Então, misticamente falando, creio que existe uma ‘mágica’ que vai fazer com que você esteja no lugar certo, na hora certa, com as pessoas certas. E devemos levar o que a gente acredita até as últimas consequências”, diz.
Ouça abaixo a íntegra da entrevista.
Fotos: Ana Carina Zaratin