O sucesso de Ainda estou aqui e as políticas voltadas para a produção cinematográfica brasileira são o tema da nova edição do podcast Prato do Dia

Cineasta e professor da Universidade Federal Fluminense, Daniel Caetano valoriza qualidades técnicas e a conexão com o público, mas também destaca o momento econômico positivo do país para explicar a bilheteria milionária da obra de Walter Salles. Políticas que estimulem a demanda, e não apenas a oferta de filmes, seriam um caminho para cristalizar a audiência das produções nacionais

Indicado a três estatuetas do Oscar neste ano, Ainda estou aqui realizou um feito que poucos filmes nacionais lograram nos últimos anos: ser um sucesso entre a crítica especializada e entre o público. Desde a sua estreia nos cinemas brasileiros, no início de novembro, até o final de 2024, o longa já havia sido visto por mais de 3 milhões de espectadores, a maior bilheteria de um filme nacional no ano, segundo a Ancine. 

A Agência Nacional de Cinema também apontou que, após o Globo de Ouro de melhor atriz de drama, vencido por Fernanda Torres, protagonista do filme, no início de janeiro, o número de salas exibindo Ainda estou aqui dobrou no país. Dessa forma, a tendência é que, após as indicações para Melhor Filme, Melhor Filme Estrangeiro e de Melhor Atriz para o Oscar de 2025, anunciados nesta quinta-feira, 23 de janeiro, os números de bilheteria continuem subindo. 

Em sua primeira edição em 2025, o podcast Prato do Dia discute as qualidades que fizeram o longa-metragem de Walter Salles recolocar uma produção cinematográfica brasileira entre as principais premiações do cinema mundial e, ao mesmo tempo, atrair milhões de brasileiros para as salas de cinema. “Explicar sucesso é sempre muito difícil porque é uma conjuntura de fatores muito grande”, afirma o professor e cineasta Daniel Caetano, convidado desta edição do podcast.

Entre esses fatores, o docente do Departamento de Artes e Estudos Culturais do Instituto de Humanidades e Saúde da Universidade Federal Fluminense (UFF) destaca a qualidade técnica e a capacidade do filme de se conectar com o público geral como questões fundamentais, mas aponta que o atual momento econômico brasileiro também precisa ser levado em conta. “Quando o país cresce em termos econômicos, é muito comum que a gente tenha um fenômeno de filme brasileiro que acontece. Encontramos isso em alguns momentos ao longo da história”, lembra o professor. “Sob o aspecto financeiro, toda essa última década foi de muita dificuldade e, de repente, agora deu para dar um respiro. Acho que isso pesa [para o sucesso de bilheteria], sim”. 

Consolidação de um público para o cinema nacional

Apesar da euforia que envolve o sucesso de Ainda estou aqui, Daniel é cético sobre a capacidade que este novo fenômeno tenha para alavancar e ajudar a consolidar uma audiência para a produção cinematográfica nacional. “O prestígio não contagia a cinematografia, infelizmente. Nisso eu sou pessimista. Se nós quisermos estruturar um modelo de cinematografia que chegue à população, não vai ser com prêmio para um ou outro filme que vamos conseguir”, afirma.

Entre os caminhos apontados pelo professor da UFF para consolidar a produção nacional junto ao público está a elaboração de políticas eficientes. Daniel entende que a cota de tela (mecanismo que determina uma quantidade mínima de filmes brasileiros a serem exibidos nos cinemas), por exemplo, serve como um elemento estabilizador que ajuda a trazer o público, mas defende que ela deva seguir a demanda que existe no mercado pelas produções nacionais. “Eu acredito muito nessa coisa de oferta e demanda e acho que o problema tanto das leis de incentivo quanto dos editais é que eles atacam o problema apenas pelo lado da oferta. Então a gente produz filmes e não tem demanda”, analisa o professor. 

O professor defende a garantia da exibição de filmes por meio de políticas como a cota de tela inclusive para outros espaços, como o streaming. “Nos últimos trinta anos a gente investiu na oferta, e eu entendo que é importante fortalecer a oferta, mas também é preciso ter política para fortalecer a demanda”, argumenta. 

Para ouvir a conversa com o professor Daniel Caetano sobre o sucesso de Ainda estou aqui e as políticas voltadas para o setor audiovisual brasileiro, clique no player abaixo ou procure pelo podcast “Prato do Dia” na sua plataforma de streaming favorita. Cabe mencionar que a conversa foi gravada antes da divulgação das três indicações de Ainda estou aqui para o Oscar.