Pasta desconfigurada após a saída da presidente Dilma Rousseff em 2016, e extinta sob Jair Bolsonaro, o Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA) recebeu nesta quinta-feira, 1º de junho, o aval do Congresso Nacional para voltar à estrutura do governo federal, com a aprovação da Medida Provisória 1154 sem as emendas que extinguiriam o ministério, ou o esvaziariam. Seguem sob a gestão do MDA, entre outras instâncias, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) e a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), partes centrais da estratégia de combate à insegurança alimentar e nutricional no país, uma das principais bandeiras do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Em uma de suas primeiras agendas depois do turbilhão de negociações em Brasília, que postergaram até a data-limite a aprovação da MP que definiu a nova estrutura do governo federal, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, esteve nesta quinta no prédio da Reitoria da Unesp, na região central da capital paulista, acompanhado do secretário de abastecimento, cooperativismo e soberania alimentar do MDA, Milton José Fornazieri, e da titular do Incra em São Paulo, Sabrina Diniz, entre outros assessores.
No encontro, que contou com a presença do reitor da Unesp Pasqual Barretti, da vice-reitora Maysa Furlan, do chefe de gabinete da Reitoria Cesar Martins e de pró-reitores da Universidade, o ministro Paulo Teixeira pôs em perspectiva a construção de uma “ponte” com a Unesp no interior paulista para apoiar a mecanização das atividades agrícolas de pequenos e médios produtores rurais. O plano é unir a expertise da Unesp nas ciências agrárias para colaborar com o desenvolvimento de tipologias de máquinas agrícolas especialmente voltadas para a agricultura familiar, com financiamento da Finep e apoio da indústria do setor.
Segundo números divulgados pela Abimaq, as vendas de máquinas agrícolas caíram 30% em janeiro, primeiro mês do governo Lula, em comparação com o mesmo mês de 2022. Foi a primeira queda nas vendas neste segmento desde 2016. Para o MDA, o apoio aos pequenos e médios produtores é fundamental para o combate à insegurança alimentar no país e a aplicação do conhecimento gerado na universidade ajudará neste desafio.
“Nós viemos aqui, neste diálogo com a Unesp, a partir deste bom diálogo com o professor Pasqual Barretti, e esperamos que vocês nos ajudem a pensar. Precisamos tirar o Brasil do mapa da fome, e colocar comida farta e de qualidade na mesa do povo”, disse o ministro Paulo Teixeira ao Jornal da Unesp. “A questão alimentar é um desafio enorme e a Unesp pode nos ajudar”, afirmou.
A audiência com o ministro e os assessores do Ministério de Desenvolvimento Agrário foi realizada no auditório do Conselho Universitário. Na ocasião, Paulo Teixeira conheceu alguns projetos desenvolvidos pela Pró-reitoria de Extensão Universitária e Cultura da Unesp e ouviu detalhes de ações, programas e pesquisas voltados às ciências agrárias. Depois do encontro, o ministro respondeu a algumas questões do Jornal da Unesp.
Ministro, nesta quinta-feira, foi divulgado o PIB do primeiro trimestre do ano, de 1,9%, puxado muito pelo crescimento no setor agropecuário, que foi de 21,6%. O país bate recordes na produção, mas não tem alimentos para todos. Como obter uma maior equidade em relação ao acesso da população aos alimentos?
O nosso desafio é ampliar a produção de alimentos como arroz, feijão, mandioca, hortaliças, legumes, frutas e proteínas para o mercado interno, no sentido de expandir a oferta. E também assegurar que seja uma alimentação saudável, que consigamos fazer essa transição agroecológica para uma agricultura de baixo carbono, regenerativa, envolvendo circuitos curtos de produção para que o alimento não viaje tanto e possa estar perto do local de consumo. É uma retomada. Em 2014, conseguimos tirar o Brasil do mapa da fome e 2023 estamos com o Brasil de novo no mapa da fome. Retrocedemos.
Durante a audiência, o senhor falou sobre a questão da mecanização dos pequenos e dos médios produtores. Isso é considerado estratégico para o Ministério de Desenvolvimento Agrário? Qual seria o papel da universidade nesta questão?
Há um envelhecimento do homem do campo, e o trabalho no campo é um trabalho penoso. As máquinas que são produzidas no Brasil, em grande parte, pertencem a tipologias muito mais voltadas para a agricultura empresarial do que para a agricultura familiar. Por essa razão queremos desenvolver, aqui no Brasil, novas tipologias, mais adequadas para a agricultura familiar. Vemos isso no exterior, mas não vemos tanto aqui. E elas podem ser desenvolvidas aqui. A Unesp tem um campo de estudos envolvendo a produção de máquinas agrícolas. O que nós precisamos é aproximar essa atuação com a pesquisa apoiada pela Finep e a indústria de máquinas, que é muito forte aqui no estado de São Paulo. É isso que nós queremos fazer agora. O presidente Lula vai lançar um programa chamado Mais Alimentos que é um programa de financiamento da produção de máquinas agrícolas para a agricultura familiar.
Em termos de soberania alimentar, tem que se pensar também na questão dos fertilizantes. O Brasil importa a maior parte dos insumos agrícolas e essa dependência ficou evidente com o início da guerra na Europa. O que o senhor pensa sobre isso?
Este é um tema para o qual o Brasil requer soberania. O país precisa retomar a sua capacidade de produção de fertilizantes, porque a guerra mostrou nossa alta dependência externa. Nós tínhamos aqui muitas fábricas de fertilizantes que foram desativadas. É um tema sobre o qual o governo brasileiro, o presidente Lula e o nosso vice-presidente Geraldo Alckmin, está debruçado buscando uma solução.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário foi oficializado praticamente hoje, na data-limite para a aprovação da Medida Provisória. O senhor tem uma larga experiência no Congresso, como deputado. Como está enxergando o atual momento da relação do Executivo com o Legislativo e, nesse contexto, a CPI do MST?
Primeiro, eu sobrevivi, porque o nosso ministério estava marcado para morrer. Havia muitas emendas determinando a extinção do MDA, a retirada da Conab, do Incra, a retirada da demarcação de terras remanescentes de quilombos. Fiquei um mês lá para evitar que isso acontecesse.
O senhor participou das articulações do governo no Congresso?
Eu participei diretamente. Claro, eu não tinha como participar da articulação do governo como um todo, não era minha tarefa. Eu fui cuidar da minha área. É aquela história do passageiro de avião: quando despressuriza, primeiro põe a máscara em você e depois (na pessoa) do lado. Então, eu tentei salvar, e conseguimos salvar, o ministério. Havia uma emenda para extinguir o ministério. Nós conseguimos derrotar essa emenda, derrotamos todas as tentativas de esvaziamento do MDA. Mantivemos os órgãos vinculados, mantivemos as funções de demarcação de terras remanescentes de quilombos. Então o MDA renasceu de ontem para hoje.
Em relação à CPI do MST, eu não vejo razão. Estamos no quinto mês de governo e não há nenhum convênio com o MST, muito menos irregularidades. Então, o que vão, digamos, investigar? Ah, aconteceram ocupações. Bom, as ocupações tiveram um caráter de ocupação protesto, eles já saíram das áreas. Acho que essa iniciativa serve para alimentar a dinâmica de polarização. Não vejo virtudes. Precisamos pensar no Brasil. E pensar no Brasil é não alimentar essa polarização no nosso país.
Eu vejo muitas virtudes no MST. Eles têm muitas cooperativas de produção, cooperativas de lácteos que produz iogurte, produz manteiga, queijos. Têm cooperativas de arroz orgânico, de feijão, inúmeros tipos de feijão… Eles também têm cooperativa de soja convencional, não transgênica, já estão utilizando bioinsumos. Eles têm o propósito de ajudar o Brasil a eliminar a miséria e a fome. Então, são parceiros neste objetivo de construir uma sociedade mais justa, fraterna. Essa CPI vai dispender muita energia dos parlamentares, tendo em vista que ela não está investigando uma irregularidade. Diferentemente daquela CPI que investiga o 8 de janeiro. Aquilo aconteceu, os invasores quebraram, houve financiamento. Agora, essa CPI (do MST), na minha opinião, vai só sugar energias. Não devíamos nos debruçar sobre isso.
Imagem acima: a Vice-reitora, Maysa Furlan, o Reitor Pasqual Barretti, o Ministro Paulo Teixeira, a Diretora de desenvolvimento do Incra, Rosilene Rodrigues, e o Secretário de desenvolvimento, cooperativismo e abastecimento alimentar, Milton Fornazieri. Crédito: Roberto Rodrigues/ACI Unesp.