Dante Ozzetti: entre arranjos e canções, a elegância da harmonia

Irmão e parceiro da cantora Ná Ozzetti, ele construiu uma carreira como compositor, instrumentista, produtor musical e arranjador, sempre em colaboração com os principais nomes da cena musical paulistana dos anos 1980 para cá.

Historicamente, tanto a música popular quanto a música erudita feitas no Brasil, sempre contaram com grandes maestros, compositores e arranjadores. Durante o processo de construção de uma canção, organizar os elementos, a função de cada instrumento e a preparação de uma composição musical para a execução de vozes ou instrumentos musicais não é tarefa fácil. Ao contrário, exige percepção, sutileza, conhecimento e dedicação. Nesse caldeirão cultural brasileiro, em especial na música contemporânea, o compositor, violonista, arranjador e produtor musical Dante Ozzetti conquistou seu espaço e se tornou uma referência no quesito de criar canções valendo-se de seus exímios talentos de instrumentista e de sua musicalidade. Em sua trajetória, ele também estabeleceu parcerias com outros relevantes nomes da música brasileira como Chico César, Zeca Baleiro, Zélia Duncan, Alzira Espíndola e Zé Miguel Wisnik, entre outros.

Natural de São Paulo, Dante foi criado num ambiente bem musical, e suas irmãs Ná Ozzetti e Marta Ozzetti, também se tornaram excelentes musicistas. “Cresci numa família musical. Havia tio clarinetista, outro tocava sanfona, meus pais ouviam muita música e meu avô adorava óperas.  Inclusive teve onze filhos e deu a eles nomes de óperas. A noite meu avô juntava os filhos, ficava ouvindo ópera e contando histórias e tivemos diretamente essa influência em nossa infância. Além disso, ouvia Beatles, Jovem Guarda e Festivais de MPB. Já na adolescência, comecei a escutar Clube da Esquina, Egberto Gismonti, Hermeto Pascoal, jazz e músicas instrumentais”.
 

Já o violão, instrumento que lhe acompanha até hoje, entrou em sua vida aos 14 anos. “Tive a oportunidade de estudar com Joãozinho da Silva Sobrinho, famoso “Joãozinho Bossa Nova”, um músico de grande conhecimento, que até morou com João Gilberto, e me ensinou a tocar muito choro no violão”.
 

Pouco mais velho, cursou as faculdades de Música e de Arquitetura, e a profissionalização artística aconteceu justamente em família. “Eu tocava com a Ná, minha irmã. Enquanto ela trabalhava no grupo Rumo, a gente já fazia um trabalho paralelo, um laboratório de todo trabalho que ela veio a fazer quando saiu do Rumo”, lembra.

“Em formato de voz e violão, tocávamos no Teatro Lira Paulistana, fazíamos aquela experiência de desestruturação das músicas. Nesse sentido, me tornei profissional mesmo no primeiro disco da Ná, pela Continental. O Wilson Souto diretor da gravadora me chamou pra produzir o disco e fazer os arranjos, me permitiu usar orquestra, cordas e tal. Na verdade, a Ná e o Itamar Assumpção foram contratados para gravar um disco pela Continental e ambos utilizaram o Estúdio Transamérica em SP. Assim, os mesmos músicos tocavam nas duas bandas. A Ná gravava de dia e o Itamar a noite. Foi o primeiro trabalho que eu considero profissional e depois acabei por produzir a maioria dos discos da minha irmã.”
 

Logo nesse início, produziu e escreveu os arranjos dos dois primeiros discos de Ná (Ná Ozzetti, de 1988, e , de 1994), pelos quais foi contemplado com o Prêmio Sharp de Melhor Arranjador e Melhor Disco. Foi igualmente responsável pelos arranjos dos CDs de sua irmã Love Lee Rita (1997), pelo qual recebeu indicação ao mesmo prêmio, e Estopim (1999).

No ano 2000, venceu o III Prêmio Visa de MPB – Edição Compositores e assinou contrato com a Gravadora Eldorado para a gravar o seu primeiro álbum solo, intitulado Ultrapássaro, lançado no ano seguinte. “O prêmio permitia a gravação de um álbum. Ele contemplava o conjunto da obra, mas eu fiz muita coisa durante o processo junto com o Luiz Tatit, e a final foi com a Jazz Sinfônica. Então, eu fiz um CD recheado de sonoridades diferenciadas”. O disco contou com a participação de Kiko Moura e Swami Jr. (violões), Caíto  Marcondes (percussão), Marta Ozzetti (flauta) e Mané Silveira (sopros), além do grupo vocal feminino Vésper e das cantoras Virgínia Rosa e Ná Ozzetti. No repertório, suas composições “Terra à vista”, “A tardinha”, “Os passionais”, “Dentro e fora”, “Para dois”, “Estopim” e “Nosso amor”, todas com Luiz Tatit, “Vão”, “Assim”, “Vou voltar” (c/ Itamar Assumpção) e a faixa-título (c/ José Miguel Wisnik). Os arranjos foram assinados pelo próprio compositor. Fez show de lançamento do CD no Festival de Inverno de Campos do Jordão e, em seguida, foi convidado pela Orquestra Jazz Sinfônica do Estado de São Paulo para se apresentar no Memorial da América Latina.
 

O segundo CD, intitulado Achou, foi lançado em 2006. Outra parceria com Luiz Tatit, o qual conta também com a participação especial de Ceumar, responsável pelos vocais. Já Amazônia Órbita é o seu terceiro álbum, e o primeiro só de música instrumental. Neste trabalho, Dante mistura instrumentos acústicos de orquestra, como fagote, clarinete, flauta, tuba, piano e cordas, com o processamento eletrônico desses elementos. As composições têm como matéria prima as inflexões de ritmos da Amazônia, como o Lundu do Marajó, Lundu Indígena, Marambiré, Cacicó, Samba de Cacete, Vaqueiro do Marajó, Batuque do Curiau , Marabaixo, Carimbó e Boi de Rua. Esses ritmos foram pesquisados e trabalhados junto ao Trio Manari, grupo de percussão de Belém, PA, que também gravou a parte rítmica. Dante divide a produção do álbum com o músico Du Moreira.

“O processo de concepção deste trabalho foi muito interessante. Em 2012, fui procurado pela cantora Patrícia Bastos para produzir um álbum, pois ela conhecia os discos da Ná e gostaria de fazer uma obra com os ritmos da Amazônia, principalmente do Amapá. Peguei aquele material e fui fazer umas gravações com o Manari, grupo de exímios músicos e pesquisadores. Nesse processo de gravar o álbum Zulusa que saiu em 2013, eu tive a oportunidade de conhecer esses ritmos e viajamos 14 cidades juntos lá na região, foi um ano inteiro na Amazônia. Conforme a gente ia gravando, eles me ensinavam diferentes ritmos e histórias culturais. Então, em 2014, eu tinha um material fabuloso. Peguei elementos rítmicos e os transformei em instrumentos de orquestras, fagote, tuba, flauta e clarinete. Comecei as composições a partir desses elementos rítmicos e para complementar chamei o Du Moreira para trabalhar esses ritmos eletronicamente. Entretanto, tudo foi construído com muito respeito a essas origens musicais e culturais”, diz Dante.

Seu disco mais recente se chama Abre a Cortina (2021), produzido também ao lado de Tatit. 

Confira a entrevista completa com Dante Ozzetti ao Podcast MPB Unesp no link abaixo.

Foto acima: divulgação.