Tema recorrente em todas as eleições brasileiras, seja em maior ou menor grau de prioridade, a corrupção é um elemento que acompanha o processo de formação do nosso país. Ainda que a prática cause indignação na opinião pública, o seu combate costuma se amparar muito mais em uma questão moral que na demanda por um ordenamento jurídico eficiente que a coiba. Esse é um dos pontos de vista que a professora e cientista política Rita de Cássia Biason, que coordena o Centro de Estudos sobre Corrupção da Unesp, apresentou na 31a edição do podcast Prato do Dia, que abordou a corrupção na história do Brasil.
No mais recente de seus 11 livros organizados sobre o assunto, intitulado “200 Anos de Independência do Brasil – Das margens do Ipiranga à margem da sociedade”, Biason analisa aspectos da corrupção no país, desde a exploração do pau-Brasil, ainda no período colonial, até os últimos grandes escândalos nacionais.
Para a docente, uma das observações possíveis a partir dessa perspectiva histórica é que a corrupção acaba por levar a um mal funcionamento das organizações do sistema político, uma vez que o agente público que deveria responder dentro dos parâmetros estabelecidos não o faz, comprometendo a organização pública. “Como construir um sistema democrático se suas instituições estão constantemente violadas por práticas corruptas? Essa é a grande questão”, aponta.
Nessa mirada histórica, chama a atenção a presença da corrupção no processo eleitoral. Numa recente tentativa de afastar a corrupção do sistema eleitoral, optou-se pelo fim do financiamento privado e a adoção do fundo eleitoral, a um alto custo de R$ 5 bilhões. “Existe uma linha de atuação que imaina com uma única mudança você vai alterar todo o status quo. Não altera. Nas últimas eleições, em 2020, vimos laranjas que repassaram seus recursos para candidatos com maior chance de ganhar. O fundão, neste aspecto, não está cumprindo esse papel e tem um custo altissimo”, argumenta.
A ideia recorrente de que uma “bala de prata” vai conseguir eliminar a corrupção do país se manifestou com força durante o processo da Lava-Jato. Para a especialista do câmpus de Franca, a ação cometeu uma série de equívocos, que comprometem seus resultados. “Ela teve sim componente de combate à corrupção, mas cometeu erros processuais, de longevidade e acabou muito centralizada. Em certo momento ela deveria ter sido desmembrada”, aponta. Ainda assim, ela menciona como legados a introdução de medidas anticorrupção, um maior controle sobre as estatais, lei das licitações e uma mudança de cultura das empresas que lidam com setor público, que incorporaram novos procedimentos.
Entre as medidas para um combate eficaz da corrupção, a professora menciona a regulamentação da prática do lobby, comum por exemplo nos Estados Unidos, mas que no Brasil encontra-se ainda em fase de projeto de lei. Para ela, é melhor existirem escritórios e profissionais reconhecidos atuando próximo à classe política de forma transparente. “Hoje temos apenas uma suposição de que grupos que pressionam certos congressistas pela aprovação de leis que sejam do seu interesse. Eu prefiro ter isso identificado de forma clara, saber se aquele deputado defende uma causa que me interessa ou não”, diz. “Acredito que isso vai dar clareza ao nosso sistema político que hoje tem grande opacidade sobre a atuação no Congresso”.
Ouça a íntegra desta edição do Prato do Dia abaixo. A entrevista também está disponível no site do Podcast Unesp e nos principais serviços agregadores de podcasts.