Ataque contra Cristina Kirchner é reflexo do histórico de violência política na Argentina, diz pesquisador da Unesp

Episódio é ponto culminante de conflitos registrados nas últimas semanas envolvendo acusações contra vice-presidente. Nas redes sociais do país vizinho, houve quem lamentasse fracasso de atentado.

A vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, sofreu um ataque com arma de fogo na noite de quinta-feira (1/9).  De acordo com a Polícia Federal Argentina, um homem brasileiro, identificado como Fernando André Sabag Montiel, de 35 anos, foi detido. Ele é apontado pela polícia como o autor da tentativa de disparo. A arma utilizada por ele foi encontrada a poucos metros da casa de Kirchner.

O atentado ocorreu na entrada da residência da vice-presidente de Cristina Kirchner em Buenos Aires, onde centenas de manifestantes se reúnem há dias para apoiar a vice-presidente em meio a um julgamento por corrupção. O infrator chegou a apontar na direção da cabeça da política, mas a arma falhou no momento do disparo e por muita sorte Kirchner saiu ilesa.

Segundo o jornal argentino Clarín, Fernando Andrés Sabag Montiel é réu em um caso de posse de arma branca (uma faca de 35 centímetros). Na época, ele alegou que usava a arma para defesa pessoal.

De acordo com o presidente da Argentina, Alberto Fernández, a pistola .380, tinha cinco projéteis e não disparou apesar de ter sido acionada. Fernández classificou o episódio como “o mais grave desde 1983, quando o país voltou a ser uma democracia”. Em seguida, declarou feriado nacional nesta sexta-feira (2/9), após a tentativa de assassinato.

Já o ex-presidente argentino e opositor de Kirchner, Mauricio Macri, condenou o atentado e cobrou respostas emergenciais das autoridades argentinas. “Meu absoluto repúdio ao ataque sofrido por Cristina Kirchner, que felizmente não teve consequências para a vice-presidente. Este fato gravíssimo exige um esclarecimento imediato e profundo por parte do sistema de justiça e das forças de segurança”.

Vídeos das pessoas que estavam na aglomeração ao redor da vice-presidente flagraram o episódio e viralizaram na Internet.

Matheus de Oliveira Pereira, doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (Unesp, Unicamp e PUC-SP) ligado ao Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da Unesp e membro do GEDES (Grupo de Estudo de Defesa e Segurança Internacional), diz que o atentado contra Cristina Kirchner é reflexo do histórico violento antidemocrático e acende um alerta máximo na Argentina.

Pereira explica que, há duas semanas, o Ministério Público do país pediu a condenação de Cristina Kirchner a 12 anos de prisão por denúncias de corrupção relativas ao período que ela ocupou a presidência da Argentina entre 2007 e 2015. Desde então, a vice-presidente tem se dedicado a fazer uma defesa jurídica e política contra o processo, colocando-se como objeto de uma perseguição política. Essa defesa tem envolvido a realização de mobilizações populares onde ocorreram episódios de violência, inclusive por parte da polícia.

Pereira diz que em várias redes sociais houve pessoas se manifestaram lamentando o fato de o atentado ter falhado. “A Argentina tem um histórico extenso de violência política”, diz Pereira, destacando que o período anterior ao golpe de 1976 foi de extrema confrontação. “É lamentável que coisas assim estejam voltando a acontecer”.

Ouça abaixo a íntegra da entrevista.

Foto acima: Cristina Kirchner durante visita a Paris em 2011 quando era presidente da Argentina. Crédito: Wikimmedia Commons.