Trabalhos nas áreas de Materiais, Farmácia, Medicina e Saúde Coletiva são reconhecidos no Prêmio Capes de Tese 2022

Pesquisa em ciência e tecnologia de materiais é premiada, e outras três receberam menções honrosas.

Presente em toda a natureza, a melanina é o composto responsável pela coloração dos olhos e dos pelos do corpo humano, e desperta grande interesse na área de novos materiais.  Uma pesquisa realizada na Unesp envolvendo as propriedades e possibilidades desta classe de pigmentos foi selecionada como uma das vencedoras da edição de 2022 do Prêmio Capes de Tese, organizado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), vinculada ao Ministério da Educação.

A tese premiada na categoria Materiais foi defendida por João Vitor Paulin no Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Materiais (POSMAT) da Unesp, câmpus de Bauru, sob orientação do professor Carlos Frederico de Oliveira Graeff, e investiga aplicações bioeletrônicas da melanina. No total, a 17ª edição do Prêmio Capes de Tese apontou ganhadores em cada uma das 49 áreas de avaliação da Capes. Agora, a tese de Paulin concorre ao Grande Prêmio Capes de Tese.

Além do reconhecimento na área de Materiais, outras três teses defendidas na Unesp, nas áreas de Farmácia, Medicina e Saúde Coletiva, integram o grupo de 96 destacadas com menções honrosas.

Eumelanina sintética

Possibilidade de baratear dispositivos eletrônicos

Intitulada “Structure-property correlations of synthetic eumelanin towards bioelectronics applications”, a tese vencedora na área de materiais se debruçou sobre propriedades optoeletrônicas e paramagnéticas de uma série de derivados funcionalizados da melanina e sobre a possibilidade de aproveitá-los em um sensor de pH, escala que indica o nível de acidez de uma solução. Os materiais estudados podem ser aplicados de forma mais barata e simples em dispositivos eletrônicos.

A bioeletrônica é um campo da ciência que une a eletrônica à biologia. De acordo com Paulin, a melanina é um composto interessante e promissor nessa área pelas suas propriedades eletrônicas, além de ser um pigmento natural insolúvel, biocompatível e biodegradável.

Dando continuidade às pesquisas sobre a melanina como classe de materiais e a possibilidade de aplicações em outras áreas, João Vitor Paulin iniciou um pós-doutorado em bioeletrônica no Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano/CNPEM), com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), com vistas à aplicação dos materiais derivados da melanina em outros tipos de sensores e plataformas eletrônicas, ampliando o conhecimento dos processos envolvidos.

Cassamo Mussagy

Micróbios como fontes sustentáveis de novos produtos

Ganhador da menção honrosa na área de Farmácia, o cubano Cassamo Ussemane Mussagy cursou o doutorado pelo programa de Biociências e Biotecnologia aplicadas à Farmácia pela Unesp, campus de Araraquara. Sua tese, sob a orientação do professor Jorge Fernando Brandão Beira, intitula-se “Production of carotenoids by yeast Rhodotorula glutinis CCT-2186 and their extraction using alternative solvents”. O trabalho teve como co-orientador João A. P. Coutinho, da Universidade de Aveiro, Portugal.

O aumento na procura por produtos naturais tem motivado pesquisadores a pensarem em novas estratégias para o incremento da produção a partir de fontes microbianas e do desenvolvimento de procedimentos sustentáveis e eficientes de extração, explica Mussagy. Em sua tese, o pesquisador apresenta processos integrados que incluem o uso de líquidos iónicos e biosolventes com solventes alternativos.

Segundo o estudo, os solventes alternativos conseguem uma recuperação de carotenóides da biomassa microbiana mais simplificada e sustentável para ser aplicada na formulação de bioprodutos, como bioplásticos, por exemplo. 

Após defender sua tese, Mussagy iniciou um pós-doutorado na Universidade de São Paulo (USP). O trabalho atual é uma aplicação da tese de doutorado, na qual o pesquisador investiga a formulação de bioplásticos para além de uma fonte renovável. Por apresentar propriedades antimicrobianas e biocompatíveis, o bioplástico é uma alternativa econômica e sustentável aos plásticos convencionais usados na embalagem de alimentos e fármacos.

Priscila Rezeck Nunes

Vitamina D para combater pré-eclâmpsia

Segundo o Ministério da Saúde, a hipertensão na gravidez é a maior responsável pela mortalidade materna no Brasil. A pré-eclâmpsia, uma patologia marcada pela pressão arterial elevada, é tema da tese “Efeito imunomodulador da vitamina D sobre a ativação de inflamassomas em tecido placentário de gestantes portadoras de pré-eclâmpsia”, que recebeu a menção honrosa na categoria Medicina III. O trabalho de Priscila Rezeck Nunes foi defendido no programa de pós-graduação em tocoginecologia da Faculdade de Medicina da Unesp, campus de Botucatu, e teve como orientadora Maria Teresinha Serrão Peracolli e como co-orientadora Mariana Romão Veiga.

A pesquisa avalia os efeitos da vitamina D — uma molécula antioxidante e anti-inflamatória, sobre a ativação do inflamassoma, um complexo proteico inflamatório — nas placentas de gestantes com quadro de pré-eclâmpsia. A placenta é o órgão que libera fatores inflamatórios na circulação maternal; eles podem estimular as condições clínicas presentes na pré-eclâmpsia, que pode acometer rins, fígado, sistema nervoso, entre outros órgãos, explica Priscila.

O estudo mostrou que a Vitamina D consegue impedir a ativação dos inflamassomas, o que melhora a condição inflamatória da doença. “Mais estudos clínicos são necessários para testar as capacidades imunomodulatórias de substâncias como a VD, que na pesquisa experimental se mostrou efetiva para controlar a inflamação”, diz a pesquisadora.

Desde a iniciação científica, Nunes se dedica a estudar sobre pré-eclâmpsia. Após a defesa da tese, a pesquisadora iniciou um pós-doutorado com bolsa Fapesp sobre a patologia, mas em outro modelo experimental. Esse novo trabalho aborda a ativação e inibição do inflamassoma NLRP3 em modelo in vitro, células endoteliais (HUVEC) e as repercussões da cultura celular com plasma das gestantes na disfunção endotelial e estresse oxidativo.

dados da pesquisa sobre estudantes de medicina indígenas

Indígenas nas faculdades de Medicina

Estabelecida em 2012, a Lei de Cotas foi determinante para aumentar a presença de alunos de escolas públicas, negros, pardos e indigenas nas universidades brasileiras. Na tese “Indígenas na Escola Médica no Brasil: experiências e trajetórias nas universidades federais”, defendida no programa de pós-graduação em saúde coletiva da Faculdade de Medicina da Unesp, Willian Fernandes Luna, doutor pela Faculdade de Medicina da Unesp, câmpus de Botucatu, investiga a presença de indígenas que cursavam medicina em universidades federais brasileiras, entre os anos de 2018 a 2020. A tese foi orientada por Eliana Goldfarb, e mereceu a menção honrosa na área de saúde coletiva.

A partir de uma abordagem qualitativa, o autor identificou 43 cursos de Medicina em universidades federais com estudantes indígenas matriculados, e entrevistou 40 estudantes de 25 povos diferentes. O pesquisador quis compreender a vivência e as estratégias que viabilizaram o ingresso e a permanência dos estudantes. “Buscamos reconhecer o encontro entre as vivências histórico-culturais desses estudantes e os conhecimentos ofertados na escola médica”, diz Luna.

O estudo mostrou que, na maioria dos casos, o acesso foi resultado de ações afirmativas que garantiram a reserva de vagas específicas. Luna avalia que, embora a fundamentação biomédica das escolas exclua outras racionalidades, incluindo as indígenas, a presença dessa população promove discussões para a criação de atividades relacionadas ao tema da saúde indígena.

As entrevistas retrataram as escolas de Medicina como pouco acolhedoras para os indígenas, com relações marcadas por posturas de preconceito e intolerância, fazendo com que esses estudantes elaborem estratégias de resiliência para permanecerem no curso. “A vivência universitária provoca o movimento de se afirmarem enquanto coletivo de povos indígenas e possibilita assumirem o protagonismo em construções possíveis”, diz Luna.

Os indígenas conservam suas relações com suas comunidades de origem e pretendem exercer atividades relacionadas à saúde indígena depois da graduação. “As experiências e as trajetórias desses estudantes na escola médica revelam construções na direção de seu protagonismo e de possíveis e desejáveis autorias indígenas no sentido acadêmico, científico, político, epistemológico e para as práticas de cuidado em saúde”, ressalta Luna.

Atualmente, Luna desenvolve três pesquisas relacionadas ao tema na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Além de analisar a presença de pessoas negras na escola médica e o ingresso e experiências de pessoas que historicamente não cursavam a graduação de Medicina, o pesquisador investiga a trajetória histórica de todos os indígenas que estudam ou estudaram medicina na UFSCar. A terceira pesquisa se concentra na experiência de indígenas que, de 2011 a 2022, participaram do Programa de Educação Tutorial Ações em Saúde, que favorece a permanência estudantil.

Fotos no texto: arquivo pessoal.