Nova edição do Prato do Dia aborda os efeitos e legados da Guerra do Vietnã

Podcast recebe o historiador Carlos Mazzeo para conversar sobre conflito que se encerrou há meio século e deixou pelo menos três milhões de mortos. Resistência vietnamita mobilizou o Ocidente e gerou impactos na sociedade dos EUA que até hoje são sentidos.

Em abril de 1975, a tomada de Saigon pelas forças do Vietnã do Norte marcou oficialmente o fim da Guerra do Vietnã. O conflito, que perdurou por cerca de duas décadas, envolveu diretamente os Estados Unidos em uma tentativa de conter o avanço do comunismo no Sudeste asiático. Para marcar os 50 anos do encerramento da guerra, o podcast Prato do Dia entrevistou Antônio Carlos Mazzeo, livre-docente em Ciência Política pela Unesp, doutor em História Econômica e autor do livro Sinfonia Inacabada: a política dos comunistas no Brasil.

Localizado no Sudeste-Asiático, o Vietnã possui uma história que remonta há mais de três mil anos.  No período moderno, o país foi colonizado pela França, tornando-se parte da chamada Indochina Francesa que englobava também Laos e Camboja. Sob o comando de Ho Chi Minh, líder do Partido Comunista da Indochina, iniciou-se um movimento independentista de tom nacionalista e socialista.

A independência foi consolidada parcialmente com a derrota dos franceses na Batalha de Dien Bien Phu, em 1954. No mesmo ano, o Vietnã foi dividido em duas zonas pelos Acordos de Genebra, e novas eleições deveriam unificar o país em 1956. Porém, um golpe de Estado, financiado pelos Estados Unidos, desencadeou um conflito antes que o processo eleitoral ocorresse, e o governo americano passou a enviar ajuda econômica e militar ao Vietnã do Sul. Com a escalada do conflito na década de 1960, os Estados Unidos aumentaram significativamente sua presença militar na região, sob justificativa de impedir o avanço do comunismo para outros países do Sudeste asiático, formulado no conceito geopolítico da Teoria do Dominó.

Mazzeo explica que o conflito pelo Vietnã opunha visões de mundo distintas, esposadas pelos blocos ocidental e socialista. “Havia, naquele momento, uma disputa de dois projetos de sociedade. Na verdade, o que não se percebia é que dois projetos competidores estavam imbricados. Tanto que, após a queda da União Soviética, o sistema imperialista dos Estados Unidos entrou em crise”, diz ele.

As baixas da Guerra do Vietnã contra França e EUA, acumuladas ao longo das duas décadas de enfrentamentos, alcançaram números exorbitantes. A ação militar americana foi marcada por extrema violência, incluindo o uso de agentes químicos, como o Agente Laranja, e ataques com bombas de napalm, inclusive sobre áreas civis. O napalm era substância incendiária conhecida por sua capacidade de grudar até na pele humana, e queimar por longos períodos. “Foi uma guerra brutal. Jogaram mais bombas do que durante toda a Segunda Guerra Mundial.”, comenta o professor. Ao final do conflito, o total de civis mortos chegou a 2 milhões e o exército do norte chegou a 1,1 milhões de baixas. Os Estados Unidos, por sua vez, contabilizaram cerca de 58 mil soldados mortos.

Internamente, a guerra provocou reações intensas na sociedade norte-americana, solicitando o encerramento da participação no conflito. Segundo Mazzeo, esse processo esteve articulado com outras lutas sociais nos EUA da época. “Você tinha duas questões centrais nos Estados Unidos naquele momento: a luta dos negros contra o Apartheid e a luta da juventude por uma nova sociedade”, diz. A resistência à guerra extrapolou o campo político e se manifestou na cultura, dando origem a um ciclo de crítica social que marcou a segunda metade dos anos 1960. Nesse período, artistas como Joan Baez faziam críticas musicais à guerra e à política externa dos Estados Unidos. Em 1967, Baez lançou a música Saigon Bride que narra a história de um soldado que abandona a sua esposa para combater na guerra. 

As críticas dos movimentos sociais da época iam além do conflito militar, desafiando as bases estruturais da sociedade americana. Segundo Mazzeo, a verdadeira independência dos Estados Unidos só se concluiu com a Guerra Civil, no século 19, mas deixou questões profundas e não resolvidas, como o racismo, que só se agravaram. “Os Estados Unidos possuem uma larga tradição autocrática. Além disso, são um país bipartidário, e nenhum dos partidos apresenta propostas inovadoras em relação ao modelo político que já existe”, diz.

Apesar da violência e do desequilíbrio de forças, os vietnamitas conseguiram resistir durante duas décadas e emergir vitoriosos do confronto. Para Mazzeo, a vitória da guerrilha vietnamita soma-se a outros episódios da história mundial que demonstram os limites do imperialismo dos EUA na segunda metade do século 20. “Ficou provado que o imperialismo, como ocorreu várias vezes. Vimos isso, por exemplo, na Guerra da Coréia, que terminou em um impasse, na derrota das ditaduras da América Latina, financiadas pelos Estados Unidos e no fim do colonialismo português na África”, diz.

Não deixe de ouvir à íntegra da entrevista de Antônio Carlos Mazzeo ao podcast Prato do Dia, disponível nas principais plataformas de áudio e no player abaixo.