Regina Machado : o voo do “Pássaro Futuro”

Professora do curso de graduação em Música Popular da Unicamp, construiu uma trajetória que combina a pesquisa e o ensino à atuação como instrumentista, compositora e cantora. Premiada por sua produção artística e por sua atuação como docente, lançou em fevereiro seu novo álbum, o sétimo da carreira.

Cantora, compositora  e violonista, Regina Machado é conhecida também por seu trabalho como professora de canto popular. Sua trajetória com a música tem se desenrolado sob estas duas esferas, a produção artística e a docência. Sua carreira de perfomer e criadora musical já acumula sete álbuns lançados: Sobre a Paixão (2000), Pulsar (2004), Agora o Céu Vai Ficando Claro (2010), Multiplicar-se Única – Canções de Tom Zé (2015), Enquanto o Tempo Para (2022), Canções Guardadas nas Dobras do Tempo (2023) e o mais recente, Pássaro Futuro, que saiu este ano. Também atuou como convidada em diversos outros trabalhos.

Na academia, ela atua como professora da graduação em Música Popular na Unicamp, bem como do Programa de Pós-graduação em Música. No campo da pesquisa, coordena o grupo Vox Mundi – grupo de estudos da voz cantada e o Centro de Memória da Música Popular, cujo acervo reúne mais de sete mil fonogramas. Um desdobramento extra-acadêmico de sua atividade como professora foi a criação da escola Canto do Brasil Produção, Criação e Ensino Musical, especializada no ensino do canto popular a partir das matrizes da voz na canção brasileira.

E já teve a oportunidade de ser reconhecida nas duas facetas de sua trajetória musical. Em 2023 recebeu o Prêmio Profissionais da Música, na  categoria Professora Universitária de Canto. E em 2024, junto com Déa Trancoso, levou para casa o Prêmio BDMG Cultural – categoria Compositora, pelo álbum Canções Guardadas nas Dobras do Tempo, cujas composições nasceram desta parceria.

Encontro com a música aos sete anos

Ela nasceu e cresceu em um lar em que havia amor à música. “Minha mãe fez canto lírico, havia tios pianistas. Me lembro das minhas irmãs e de amigos da família tocando e cantando em rodinhas de violão. E o rádio era muito presente”, lembra.  Seu aprendizado musical teve início na escola pública, onde a musicalização era parte do currículo. Tinha sete anos. “A professora de música perguntou se alguém queria aprender a tocar violão.  Levantei a mão e comecei a estudar. Ali a música entrou oficialmente na minha vida, e nunca mais saiu”, diz.

Inicialmente dedicou-se ao estudo do violão popular. Por ser um instrumento de acompanhamento, a prática violonística induziu-a a cantar. “Posteriormente estudei o chamado violão erudito ou violão clássico. Tive a oportunidade de aprender com gente bacana como César Nogueira e Paulo Porto Alegre, e de estudar em uma escola bastante renomada aqui em São Paulo, o Conservatório do Brooklin, a qual formou muita gente na cena da música erudita”, diz. No mesmo conservatório, começou a estudar canto com Caio Ferraz. Seguiram-se outros professores, e assim seu processo de formação, iniciado ainda na infância, estendeu-se até a idade adulta.

Sua profissionalização se deu naturalmente. Aos 17 anos, já cantava na banda de Tom Zé, além de formar suas primeiras bandas. “Acompanhar o Tom Zé foi muito importante, pelo desafio que isso representava naquele momento. Porém, só fui perceber os elementos que o trabalho dele possui anos depois. Tanto que, em 2015, lancei um álbum dedicado à obra dele. O Tom Zé é um erudito, com muito conhecimento, e uma dinâmica de vida diferenciada”, relata.

Regina trabalhou como musicista na noite paulistana por oito anos, antes de enveredar pela docência. Começou dando aulas particulares e trabalhou em algumas escolas. Em 1991, ela e alguns companheiros foram assistir  a um festival de verão organizado pela Manhattan School of Music, em Nova Iorque. Durante a visita, ficou empolgada com a estrutura e o conhecimento que a instituição oferecia aos seus estudantes. “Quando voltei, decidi prestar vestibular no Brasil. Entrei na universidade, no curso de Música Popular. Segui trabalhando, até que, em 2001 apareceu a oportunidade para um concurso como docente justamente na minha área de estudo. Foi então que começou para valer a minha trajetória acadêmica”, diz.

Pássaro Futuro

Lançados nas plataformas digitais de música em fevereiro passado pelo selo Belic Music, o álbum Pássaro Futuro apresenta, em suas 11 faixas, o encontro entre a poesia de Consuelo de Paula e as melodias de Regina Machado, e as duas dividem os vocais.

O trabalho que culminaria no álbum teve início espontaneamente durante o período da pandemia. Consuelo enviou uma letra para Regina. Esta, imediatamente, compôs a melodia e assim nasceu Canto de Chegança. Intuitiva, Consuelo percebeu que estava ali o início de uma nova obra, concebida em um processo dinâmico. “Foi uma espécie de surto criativo de 40 dias”, conta. “A Consuelo teve uma intuição muito acertada, porque foram mais ou menos 50 canções que a gente compôs.”

Entre os temas que perpassam as canções de Pássaro Futuro estão a insegurança e a presença da morte que pairavam naquele tempo triste, mas também a esperança de que estava ave artística possa trazer vida, fé e transformações. “Creio que fomos privilegiadas com tantas inspirações”, conta Regina.

Os arranjos são criações coletivas dirigidas por elas com a colaboração dos músicos convidados: Mário Manga (violoncelo), Guilherme Ribeiro (piano e acordeom), André Rass (percussões) e Nicolas Farias (percussões).

Para Regina Machado, “o disco representa a materialização do poder de criar, de fazer canções. Insiste em um voo que parece não ser mais percebido, que parece não mais habitar nas pessoas. Pássaro Futuro voa contra a ventania, contra o tempo do consumo, e arrisca uma musicalidade que envolve quem se deixa abraçar por ela. Esse trabalho traduz nossa espiritualidade por meio da arte, e elucida um pouco da nossa devoção à música. Tudo nele possui um certo mistério”, diz.

Confira abaixo a entrevista completa no Podcast MPB Unesp.