Nomeado por Tarcísio de Freitas por meio de decreto assinado no último dia 26, e publicado no Diário Oficial do Estado no dia seguinte, o físico, professor e pesquisador da Unesp Carlos Frederico de Oliveira Graeff, 57, assume nesta quinta-feira (28) como diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo (CTA) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), um dos postos mais importantes da fundação que é o pilar do desenvolvimento científico e tecnológico paulista nas últimas seis décadas.
Com uma trajetória que perpassa de alguma forma pelas três universidades estaduais paulistas – Unesp, Unicamp e USP – Carlos Graeff fazia parte da lista tríplice entregue ao governador paulista pelo secretário estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação, Vahan Agopyan, e cumprirá mandato de três anos, com possibilidade de reconduções, sucedendo a Carlos Américo Pacheco, que permaneceu no cargo de 2016 a 2025.
Professor da Faculdade de Ciências do câmpus de Bauru da Unesp, pró-reitor de Pesquisa da Universidade de 2017 a 2020 e coordenador de ensino superior da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo em 2023, Graeff atuava na coordenação de programas estratégicos e infraestrutura da Fapesp nos dois últimos anos. Pesquisador respeitado, graduou-se pelo Instituto de Física “Gleb Wataghin” da Unicamp, instituição em que concluiu o mestrado e o doutorado antes dos 30 anos, e obteve a livre-docência na USP, universidade na qual lecionou de 1996 a 2006, ano de ingresso na Unesp. O docente decidiu estudar física, em parte, pelo interesse na série “Cosmos”, popularizada por Carl Sagan na TV, e reconhece que a vida como cientista teve também significativa influência familiar, especialmente do pai, Frederico Guilherme Graeff, médico e reconhecido neurocientista, membro titular da Academia Brasileira de Ciências.
No documento que deu base à sua candidatura ao cargo de diretor-presidente do CTA da Fapesp, Carlos Graeff valoriza a missão institucional da fundação, indutora de cooperação científica e apoiadora de dezenas de milhares de pesquisadores que compõem o sistema paulista de ciência, tecnologia e inovação. Em sua primeira década de operação, entre 1962 e 1972, a Fapesp apoiou 7.240 projetos de pesquisa, número que saltou para 98.697 entre 2013 e 2022, um aumento de mais de 1.200%. O orçamento da Fapesp corresponde a 1% da receita tributária líquida do Estado de São Paulo, percentual previsto por lei estadual, que assegura à fundação autonomia financeira para investir em pesquisas científicas e tecnológicas. Em 2025, o valor do orçamento proposto para a Fapesp foi de R$ 2,79 bilhões, conforme a Lei de Diretrizes Orçamentárias.
“Seria muito importante que este modelo que existe em São Paulo, com uma agência com autonomia financeira e com autonomia administrativa, também houvesse em outros estados brasileiros, porque é esta independência que faz com que a Fapesp seja tão relevante no cenário nacional e internacional”, afirma o o novo diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da Fapesp.
Em conversa com o Jornal da Unesp, Carlos Graeff disse entender como um dos principais desafios postos atualmente a procura por maneiras de viabilizar uma aproximação maior da Fapesp com o governo estadual, de maneira a buscar mais efetividade em políticas públicas.
“É muito importante que possamos ampliar e melhorar as ações junto ao governo do estado, em especial para a solução dos problemas da população paulista e, se possível, com esta integração da chamada quádrupla hélice (da inovação), que envolve academia, governo, sociedade civil e o setor produtivo. Temos este desafio de incrementar mecanismos que facilitem esse tipo de relação, com maior integração visando obviamente o bem-estar da população. Cooperação é a palavra-chave: trazer as pessoas para cooperar em torno de um objetivo comum a ser atingido”, diz.
Em sua proposta de trabalho, o pesquisador listou quatro eixos estratégicos relacionados a desafios e oportunidades que se apresentam para os próximos anos da Fapesp: impulsionar a inovação e o empreendedorismo; modernizar a gestão e a infraestrutura, com a implementação de ferramentas digitais que otimizem processos e projetos; fortalecer a comunicação e a difusão do conhecimento científico; e ampliar a articulação institucional.
Como meios de implementação da proposta, o pesquisador cita que a “Fapesp já dispõe de mecanismos eficazes para induzir” a integração e o espírito de cooperação entre os vários atores envolvidos no sistema de ciência, tecnologia e inovação paulista, citando dois programas específicos: o Programa de Pesquisa em Políticas Públicas (PPPP) e os Centros de Ciência para o Desenvolvimento (CCDs). Este último abriu um canal de diálogo com as universidades estaduais paulistas que levou, em 2024, à construção conjunta de editais para um investimento total de R$ 10 milhões para pesquisas científicas voltadas à área de tecnologias assistivas no estado de São Paulo. Os CCDs buscam incentivar estudos direcionados à resolução de questões sociais conhecidas, em parcerias com instâncias governamentais e entidades da iniciativa privada e também do terceiro setor.
“Os CCDs fazem parte de experiências que a Fapesp desenvolveu nos últimos anos que vão muito nesta direção do tipo de instrumentos que acredito que sejam os ideais para esta cooperação entre vários atores”, afirma Carlos Graeff.
Em setembro 2019, quando liderava a pró-reitoria de Pesquisa da Unesp, Graeff teve uma experiência singular que reforça suas convicções atuais, ao depor na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou a gestão das universidades estaduais paulistas. O pesquisador lembra que ficou surpreso com o nível de desconhecimento que os parlamentares demonstraram na época do sistema estadual de ciência e tecnologia, do qual as universidades fazem parte, junto com a Fapesp. “Aquilo foi um sinal de alerta para mostrar que precisamos nos aproximar da classe política de maneira geral, para que percebam o quão fundamental foi a decisão da criação das (universidades) estaduais e da Fapesp para a prosperidade do estado hoje em dia” diz.
No eixo estratégico que propõe para impulsionar a inovação e o empreendedorismo tecnológico no estado, o pesquisador, que é um dos fundadores da associação civil Advanced Institute for Artificial Intelligence (AI2), cita a necessidade do enfrentamento do desafio de incorporar a inteligência artificial (IA) no dia a dia de processos e projetos. “Vamos ter que discutir muito bem onde está o limite para o uso da IA”, afirma. “O Brasil ainda não é um dos países mais desenvolvidos nessa área, mas sem dúvida cresceu muito o interesse em inteligência artificial e o número de pessoas que trabalham com o tema. Já existe uma comunidade bastante robusta, que pode ser ampliada.”
Próximo do universo de startups de base tecnológica, Carlos Graeff acredita ser necessário encorpar e interiorizar pelo território paulista o ecossistema de inovação do estado. “Precisamos trazer um pouco mais dessa cultura (da inovação) para o interior do estado de São Paulo. A cidade de São Paulo é um polo inovador, sendo considerada, principalmente na área financeira, uma das cidades mais importantes deste mundo da inovação. Agora é o momento de expandirmos essa inovação para o interior de São Paulo”, acredita.
Poliglota, o novo diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da Fapesp fez pós-doutorado na Universidade Técnica de Munique (TUM), Alemanha, nos anos 1990, área de física da matéria condensada, foi pesquisador visitante em instituições estrangeiras, de países como Suíça e China, e neste século concentrou seus principais trabalhos na área de materiais, atraído pelas interfaces da física com a química e a biologia em temas variados de ciência e engenharia dos materiais. Nesse ponto, admite que questões relacionadas à transição energética, o que inclui a exploração mais intensiva de terras raras no Brasil, bem como o ambiente geopolítico global derivado da ascensão da Ásia como novo polo econômico e tecnológico são alguns dos desafios contemporâneos que se impõem à ciência.
“Precisamos ter clareza de quais são os nossos desafios e as nossas prioridades para buscar os melhores parceiros para uma determinada questão que necessite ser resolvida. Ou seja, temos que estar preparados, como instituição de fomento à pesquisa, a trazer os melhores parceiros para cooperar nos desafios”, afirma o pesquisador, ciente da contribuição que o país pode dar ao cenário global de transição energética.
“Estamos vendo uma mudança forte no que seriam as nossas fontes de energia, saindo de uma base fóssil para uma outra base de energias renováveis. Isso obviamente vai ter implicações geopolíticas (…). O Brasil, por exemplo, tem uma base mineral de terras raras abundante, mas a exploração, do ponto de vista econômico, ainda não é viável. Então é preciso desenvolver toda uma indústria de processamento desses minerais, que é um processamento bastante complexo. Estaremos sensíveis a essas questões que vão determinar, muito possivelmente, um posicionamento do estado e do país em um futuro próximo”, diz Carlos Graeff.
De acordo com o estatuto e o regimento interno da Fapesp, o diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo possui como responsabilidades principais conduzir discussões e decisões do órgão, supervisionar as atividades administrativas e financeiras da fundação e tomar decisões finais relacionadas a tais atividades, participar da elaboração do orçamento anual e acompanhar a sua execução, coordenar acordos de cooperação técnico-científica e fornecer informações ao Conselho Superior, entre outras. O presidente do Conselho Superior da Fapesp é ocupada por Marco Antonio Zago, ex-reitor da USP.
Antes de Carlos Graeff, a Unesp já teve um pesquisador à frente do CTA da Fapesp: o também físico José Arana Varela, do Instituto de Química do câmpus de Araraquara, ocupou o cargo de 2012 a 2016, ano em que faleceu em decorrência de um câncer.
Imagem: Marcos Jorge / ACI Unesp