Novas diretrizes da Capes trazem avanços e desafios

Agência federal acerta ao abrir espaço para que cada programa empregue os indicadores que julgar mais adequados à sua área a fim de elaborar a classificação dos cursos de pós-graduação no período entre 2025 e 2028.

No último dia 6 de maio, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) divulgou novas diretrizes que serão adotadas para classificar os cursos de pós-graduação no Brasil no quadriênio 2025-2028. A Capes é uma fundação vinculada ao Ministério da Educação. Faz parte de sua missão avaliar a qualidade das pós-graduações stricto sensu, com impacto direto sobre os cursos: uma avaliação negativa leva à redução de bolsas para estudantes, à perda de repasses de recursos orçamentários e pode causar até o descredenciamento do curso.

A quantidade de cursos, a pluralidade de áreas e as inúmeras dimensões de uma pós-graduação (ensino, pesquisa, extensão, internacionalização, formação de pessoas etc.) tornam o trabalho de avaliação uma tarefa bastante complicada, considerando ainda que os avaliadores, normalmente, são pesquisadores que não se dedicam exclusivamente a esta atividade. Ir, portanto, além de uma avaliação apenas quantitativa e incorporar análises que consigam captar a qualidade de um programa de pós-graduação é desafiador – nessa direção, as novas diretrizes da Capes são muito boas, permitindo que cada programa utilize indicadores mais adequados à sua área.

Dentre os objetivos da Avaliação Quadrienal está a aferição da qualidade de um programa de maneira comparativa com os demais, para definir políticas públicas relacionadas à pós-graduação. A ficha de avaliação dos programas é dividida em três quesitos: programa; formação e produção intelectual; e impacto (local, regional, nacional e internacional). Cada um desses quesitos está subdividido em até quatro itens.

O quesito “programa” avalia as condições mínimas de um curso para a formação de mestres e doutores. Os produtos e resultados do programa são medidos no quesito “formação e produção intelectual”, e o terceiro quesito analisa o impacto da pós-graduação na sociedade, e seu alcance. As notas podem variar de 1 a 7: com notas 1 e 2, o curso pode ser descredenciado; nota 3 é o mínimo necessário para que uma pós-graduação seja reconhecida; 4 e 5 correspondem a cursos com bom desempenho, sendo 5 um curso com padrão de excelência nacional; 6 e 7 são os programas de excelência com reconhecimento internacional, 6 para aqueles incipientes e 7 para os consolidados. Programas apenas com mestrado, sem doutorado, podem alcançar, no máximo, a nota 5.

Escrevo com frequência sobre o uso exagerado de métricas para avaliar a qualidade das universidades e tenho que concordar que tanto a Capes quanto o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) distanciaram-se dos parâmetros puramente numéricos de produtividade, graças às modificações recentes em seus critérios de avaliação. A interrupção de adoção da classificação Qualis, um ranking de revistas indexadas, pela Capes já representa um grande avanço. Ainda que critérios numéricos sejam utilizados, uma atenção maior será dada à qualidade dos artigos publicados – artigos publicados em um mesmo periódico poderão, agora, ter classificações diferentes.

A nova avaliação, porém, desvia-se ligeiramente da aferição da qualidade dos programas ao inserir itens que não dependem de fatores internos e da excelência da pós-graduação, como o destino dos egressos, e outros que não estão relacionados diretamente à qualidade do programa, mas que se alinham às pautas da moda, como a implementação de políticas afirmativas e a aderência aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

É possível que a imensa maioria dos estudantes que ingressam em programas de pós-graduação imediatamente depois da graduação pretenda permanecer na área da pesquisa acadêmica. A ausência de oportunidades para que todos continuem nas universidades não decorre necessariamente da qualidade do programa em que foi realizada a pós-graduação, mas principalmente da quantidade de vagas disponíveis. Estabelecer uma correlação forte entre a qualidade do programa e o destino do egresso segue uma lógica equivocada, semelhante à do programa de repatriação do CNPq.

As políticas afirmativas estão relacionadas a parâmetros de justiça social e não necessariamente à qualidade dos programas. A formação em pós-graduação tem como finalidade principal a produção de conhecimento e a formação de profissionais de alto nível, nesse caso a seleção de candidatos deve basear-se exclusivamente em mérito acadêmico. A introdução de outros critérios no processo seletivo implica relativizar o critério de qualidade.

Ademais, considerando que a adoção de políticas afirmativas na graduação enfrenta o principal gargalo das desigualdades educacionais, provenientes dos ensinos fundamental e médio, a graduação deveria ser vista como um processo de equalização de condições. Assim, a concessão de diplomas idênticos a todos os formandos, atestando equivalência profissional, deveria ser justificativa suficiente para que as políticas de inclusão não se propagassem para os níveis acadêmicos superiores.

Incluir também os ODS como critério de avaliação dos programas é colocar algo que se alinha ao zeitgeist contemporâneo, mas que, na prática, não significa nada. Até atividades como jogar dominó após o almoço podem ser enquadradas dentro de algum Objetivo de Desenvolvimento Sustentável.

De um modo geral, a parte teórica da avaliação está muito bem construída e certamente é uma primeira etapa necessária para o aprimoramento das classificações dos cursos de pós-graduação no país. A atenção dada à internacionalização e às ações de disseminação do conhecimento científico para a sociedade também é digna de destaque. A implementação da nova avaliação ao longo deste quadriênio e a posterior análise das toneladas de informação representam, provavelmente, desafios muito maiores do que aquilo que está no papel. A ver.

Marcelo Yamashita é professor do Instituto de Física Teórica (IFT) da Unesp e membro do Conselho Editorial da Revista Questão de Ciência

Publicado originalmente no site Questão de Ciência