Criada em 2015, a rede de universidades dos países que compõem o Brics, a Brics Network Universities (Brics-NU), passou por uma reformulação nos últimos dois anos, quando passou a incluir, além das instituições dos cinco membros que compõem o acrônimo (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), também universidades das nações que aderiram ao grupo nos últimos anos (Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã). O processo de reforma da rede também promoveu a ampliação das áreas temáticas que vão pautar as colaborações acadêmicas e científicas.
A expansão do número de instituições foi formalizada em maio, durante reunião do Conselho Internacional de Governança do Brics-NU, e por enquanto não estão previstos recursos financeiros para viabilizar as interações entre as universidades que compõem a rede.
Após a reformulação, a presença brasileira na rede aumentou de 11 para 20 universidades, seguindo a ampliação do limite de instituições por país, outra mudança proposta recentemente. O processo de adesão ao grupo foi conduzido pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e por um Comitê Coordenador Nacional, que selecionaram, por meio de edital, as instituições e as áreas temáticas em que elas vão atuar dentro da rede. [ver tabela].
Nesta nova fase da rede Brics-NU, a Unesp vai atuar em duas frentes: além de integrar o grupo temático em Ciências Naturais, a Universidade assumiu a secretaria executiva de toda a rede Brics-NU ao lado da do Instituto Técnico de Harbin, da China. A posição assumida pela Unesp, que teve o apoio da Capes e do Ministério da Educação (MEC), envolve a coordenação dos projetos e das ações das quase 200 instituições dos 11 países que compõem o bloco.
Agricultura sustentável e segurança familiar |
Universidade de São Paulo (USP) Universidade Federal de Viçosa (UFV) |
Água e poluição |
Universidade Federal do Ceará (UFC) Universidade Federal de Uberlândia (UFU) |
Ciência da computação e segurança da informação |
Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) |
Ciências da saúde |
Universidade Federal da Bahia (UFBA) Universidade Federal da Paraíba (UFPB) |
Ciências humanas e sociais |
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) |
Ciências naturais |
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Universidade Estadual Paulista (Unesp) |
Ecologia e mudanças climáticas |
Universidade Federal de Goiás (UFG) Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) |
Economia |
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) |
Energia |
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) |
Estudos do Brics |
Universidade Federal do Paraná (UFPR) Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) |
Matemática |
Universidade de Brasília (UnB) |
Desafios da coordenação de uma rede em expansão
Neste primeiro momento, entretanto, a tarefa mais urgente consiste na criação de um website que dê visibilidade à rede, facilite a busca por informações e colabore na integração e comunicação entre as instituições. “À medida que a rede ganhe engajamento, a nossa expectativa é que a secretaria possa organizar encontros entre as instituições, propor políticas e ajudar no estabelecimento de prioridades que façam com que a rede Brics-NU se mova”, afirma o professor Rui Vicente Oppermann, diretor de relações internacionais da Capes.
Oppermann explica que, embora a rede tenha sido criada em 2015, houve pouca atividade nesses últimos anos, ainda que algumas universidades tenham fortalecido suas relações mesmo fora da égide do Brics. No atual mandato do governo federal, entretanto, a rede de universidades do bloco passou a ser vista como um espaço complementar às relações firmadas pelas instituições brasileiras que, historicamente, tem contemplado universidades do Norte Global, principalmente Estados Unidos e Europa. O conceito de Norte Global e Sul Global têm sido usado por acadêmicos e organizações internacionais para categorizar os países quanto às suas características socioeconômicas e políticas, ao invés de considerar apenas características geográficas.
“Nós temos uma relação consolidada com o Norte Global, mas essa relação já está chegando a um teto em que as próprias parceiras entendem que é preciso criar uma multilateralidade que inclua também as instituições do Sul Global”, afirma Oppermann. O diretor da Capes ressalta que nem todo membro do Brics pode ser enquadrado no conceito de Sul Global, mas existe uma grande representatividade deste grupo, e que essa diversificação pode ser estratégica para o desenvolvimento da pesquisa no Brasil. “Países como China, Índia, Indonésia e África do Sul, por exemplo, apresentam um sólido desenvolvimento científico e tecnológico com o qual nós podemos cooperar”, afirma. Outro argumento a favor da rede apontado por Oppermann é que os grandes temas de pesquisa da atualidade, como as mudanças climáticas, água ou energia, demandam multilateralidade e o engajamento de diversas nações, uma vez que envolvem desafios transnacionais.
Assessor especial para assuntos internacionais do Ministério da Educação (MEC), Francisco Figueiredo de Souza lembra que tradicionalmente o Brasil não direcionou muitos esforços a esse perfil de países, mas concorda que a diversificação de parcerias é positiva. “O Brics não vem nesse caso para substituir ninguém, mas no cenário global em que nós nos encontramos atualmente, faz sentido que o Brasil e suas universidades consigam diversificar as parcerias e evitem excessivas dependências de alguns destinos”, afirma o assessor, que vê com bons olhos a iniciativa da Unesp de assumir o secretariado em um momento chave para a rede. “A secretaria executiva ganha importância neste momento de ampliação do Brics. No caso da rede de universidades é uma ampliação tripla: são novos países, novas universidades, já que ampliamos o número de universidades por país, e são novas áreas temáticas”, destaca.
Para a reitora da Unesp, professora Maysa Furlan, a confiança depositada pela Capes e pelo MEC na coordenação da Brics-NU é um reconhecimento dos resultados de ações internacionais que a Universidade tem galgado nos últimos anos, que podem ser observadas de forma concreta na melhora da posição da Universidade em rankings internacionais, no engajamento em redes de pesquisa e na participação da Unesp na discussão de grandes temas globais. “A atuação no secretariado da rede de universidades do Brics tem uma importância que transcende a Unesp. Ela representa um protagonismo inédito em uma rede de colaboração internacional e em um processo geopolítico que é novo e que desponta pela preocupação em discutir temas mundiais e desafiadores”, afirma.
Excelência reconhecida na área de Ciências Naturais
Além do secretariado, a Unesp também irá participar da Brics-NU integrando um grupo temático internacional na área de Ciências Naturais. Ao todo, participam deste grupo 26 instituições da China, Egito, África do Sul, Rússia e Irã. A Universidade de Santa Maria (UFSM), do Rio Grande do Sul, é a outra representante brasileira.
A professora Maria Valnice Boldrin, pró-reitora de pós-graduação da Unesp explica que a área de Ciências Naturais é bastante ampla, envolvendo temas de Química, Física e Biologia. “Um dos motivos que colaborou na nossa seleção é que a Unesp tem programas de pós-graduação consolidados e internacionalizados nessas três áreas, além de pesquisadores com linhas de pesquisa e projetos de grande porte”, explica Boldrin.
Na última semana, uma equipe composta por representantes da Pró-Reitoria de Pós-Graduação (ProPG), Pró-Reitoria de Pesquisa (ProPE) e pela Assessoria de Relações Externas (Arex) se reuniu com a UFSM para prospectar fortalezas e possíveis sinergias. A expectativa é que com um planejamento bem construído colabore para a captação de recursos para mobilidade, pesquisa ou eventos acadêmicos, seja nacionalmente ou no âmbito do Brics. O próximo passo é ampliar essa ação para uma reunião entre todas as universidades do grupo temático, no intuito de estabelecer ações prioritárias que fortaleçam a conexão entre as instituições.

Reitora da Unesp, professora Maysa Furlan participa do 2º Fórum de Reitores das Universidades do BRICS+, no Rio de Janeiro (Crédito: Divulgação)
Parcerias da Unesp com Sul Global antecedem a rede Brics-NU
Tendo em vista que a proposta da rede é ampliar colaborações com países do Brics+ e do Sul Global, a Unesp está muito bem posicionada. Nos últimos cinco anos, docentes e pesquisadores da Universidade desenvolveram colaborações com 683 instituições internacionais pertencentes aos países membros do BRICS+, resultando na coautoria de 2,5 mil artigos científicos. No mesmo período, a colaboração com países recentemente integrados à versão expandida do bloco envolveu 204 instituições de ensino superior e resultou em mais de 1,6 mil artigos publicados. Os dados foram divulgados pela reitora Maysa Furlan, no 2º Fórum de Reitores das Universidades do BRICS+, realizado no início de julho, no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro.
Na visão da reitora, a seleção da Unesp no grupo de temático de Ciências Naturais e o apoio recebido da Capes e do MEC para atuar na secretaria executiva da rede Brics-NU são uma forma de reconhecimento da atuação da Unesp em duas questões sensíveis ao Brics. Primeiro, a atuação acadêmica e científica ao lado de organizações e nações integrantes do Sul Global. Além dos artigos em coautoria já mencionados, a Universidade participa ativamente da AUGM, associação que envolve universidades de Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai, e é uma das instituições brasileiras que mais recebe estudantes de graduação e pós-graduação da América Latina e da África.
Outro ponto destacado por Furlan é o destaque científico da Unesp em temas de relevância global, como as mudanças climáticas, em que a Unesp abriga o Centro de Pesquisa em Dinâmica da Biodiversidade e Mudanças do Clima (CBioClima), financiado pela Fapesp. A reitora menciona ainda programas de pós-graduação de excelência da Unesp em áreas que dialogam com alguns dos grandes desafios mundiais, como a proteção ao meio-ambiente, a sustentabilidade e a produção de alimentos. “Nós nos sentimos muito confiantes com essa responsabilidade porque temos uma construção científica com esses países e com os principais temas em discussão no Brics”, avalia a reitora. “Vejo a Unesp como uma universidade que pode discutir de igual para igual com países que produzem a melhor ciência no mundo, e que vai poder contribuir tanto do ponto de vista científico quanto orientando diretrizes para atividades que podem resultar no sucesso da rede”, conclui.
Na imagem acima: sala da reunião entre ministros da educação do Brics (Crédito: José Cruz/Agência Brasil)