O governo de Minas Gerais decretou, nesta última terça-feira (27), situação de emergência sanitária animal em razão do risco de disseminação da gripe aviária no estado. A decisão foi tomada após confirmação de caso de Influenza Aviária de Alta Patogenicidade (IAAP) em aves ornamentais, criadas sem o objetivo de consumo humano, na Grande BH. Em nota, a prefeitura do município afirmou que “não há motivo para pânico e que todas as medidas necessárias estão sendo rigorosamente cumpridas”.
A decisão do governo mineiro é mais uma das medidas adotadas pelas autoridades brasileiras para lidar com a gripe aviária desde o dia 15 de maio, quando foi confirmado o primeiro caso em uma granja comercial em nosso país, no Rio Grande do Sul. Desde então, diversos países suspenderam, total ou parcialmente, a importação de carne de frango produzida no Brasil.
Diante do risco de contaminação em larga escala, o Ministério da Agricultura (Mapa) decretou estado de emergência, intensificou a vigilância em rotas de aves migratórias e determinou o sacrifício de aves infectadas. No Paraná, mais de 10 milhões de ovos foram destruídos como medida preventiva, enquanto outras unidades produtoras sob suspeita tiveram seus estoques interditados.
Raphael Lucio Andreatti Filho, especialista em patologia experimental e comparada em aves e docente da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Unesp analisa o histórico do vírus H5N1 e sua chegada ao Brasil:
“O vírus, que foi detectado primeiro nos anos 1990, na Ásia, passou, com o tempo, a aparecer na Europa, na África, na América do Norte e, mais recentemente, na América do Sul. Desde o surgimento na Ásia, nossa avicultura começou a debater sobre a possibilidade de o vírus chegar ao Brasil algum dia. Primeiro, porque a avicultura brasileira é um grande player internacional. O Brasil ocupa a posição de maior exportador de carne de frango do mundo. Isso fez com que a própria indústria avícola, o setor técnico, as universidades e os órgãos oficiais discutissem esse tema. E, ao longo das últimas décadas, fomos nos preparando para a chegada desse vírus. Sempre entendemos que seria uma questão de ‘quando’ ele chegaria ao Brasil, e não de ‘se’ ele chegaria”, diz.
O protocolo para o enfrentamento
O fato de o Brasil ser o último grande produtor do setor a registrar casos de gripe aviária é um sinal do sucesso das autoridades em se articularem para retardar o problema, diz o especialista. Mas agora será o momento de testar a preparação para o enfrentamento direto à moléstia.
O protocolo de ações concebido pelas autoridades e produtores visa conter o vírus no local onde foi detectado, impedindo o surgimento de novos focos ao redor ou a uma certa distância do foco primário. Essa contenção é determinante para evitar problemas na exportação e comercialização de produtos avícolas.
Neste protocolo, explica ele, uma vez detectada a doença, os animais que restaram vivos são sacrificados e enterrados com produtos químicos, juntamente com a cama do aviário, ninhos e equipamentos correlatos, fora do núcleo de produção. Posteriormente, toda a instalação e suas cercanias são limpas e desinfetadas.
A partir do foco, é traçado um raio de dez quilômetros. No raio de até três quilômetros, os técnicos do ministério da defesa estadual animal fazem inspeções para averiguar se há qualquer indício da presença do vírus nos animais nessa área. Do terceiro ao décimo quilômetro, chamado de zona de vigilância, são vasculhadas todas as propriedades, para avaliar a possibilidade da presença do vírus. Em todo o entorno do foco, nesse raio de dez quilômetros, são instaladas barreiras para verificação de veículos, principalmente aqueles empregados para a produção animal, para assegurar que não haja transmissão e carreamento do vírus por meio dos veículos e de seres humanos.
A partir da adoção das medidas de combate, abre-se uma contagem temporal, que chega a aproximadamente 28 dias. Se, após esse período, não for detectado um novo surto, seja na área ao redor desse foco ou em outra região do Brasil, voltaremos ao status de país livre de influenza aviária.
“Nesse momento, tudo o que foi planejado ao longo desses anos, além das recomendações dos programas do Ministério da Agricultura para a prevenção e o controle de enfermidades, está sendo cumprido”, avalia Andreatti.
Risco para humanos é baixo
Os riscos para seres humanos são mínimos, afirma o docente:
“Podemos dividir os riscos que a influenza aviária apresenta para seres humanos em dois tipos. De um lado, os seres humanos que estão ligados à cadeia de produção avícola, ou que tenham contato com aves silvestres, ornamentais, migratórias. De outro, as pessoas que não têm contato com qualquer tipo de ave. Para essas, o risco é mínimo, quase nulo. Porque, para que ocorra a contaminação, é preciso que haja contato com as secreções de uma ave contaminada ou doente”, explica.
Na categoria das pessoas que lidam diretamente com aves, e que tem contato com um animal contaminado, a chance é bem maior. Mas, em geral, os humanos não são infectados, explica o docente. “As mutações ainda não deram a esse vírus grande capacidade de infectar humanos. A prova é que, desde os anos 1990, quando adentramos essa nova era do H5N1, a quantidade de pessoas contaminadas é muito pequena, considerando-se a quantidade de indivíduos envolvidos nessas ocorrências. Ao longo desses 30 anos, não chega a mil a mortalidade em seres humanos. Isso mostra que a ocorrência de casos em seres humanos é muito baixa, ainda que a letalidade do vírus [em animais] seja bem alta.”
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Imagem acima: Deposit Photos