A matemática é uma das ciências mais antigas da humanidade e serve como instrumento para solução de problemas do dia a dia. Desde acertar o troco no mercado até o planejamento do tempo que levaremos para chegar na praia no final de semana, a disciplina dos números está presente na organização cotidiana de todas as pessoas, tenham elas consciência disso ou não. Ainda assim, o estudo da matemática é visto como algo desafiador para a grande maioria dos brasileiros em idade escolar. Dados divulgados pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), em 2022, mostram que 57,2% dos alunos brasileiros ficam nervosos resolvendo problemas de matemática e sete em cada 10 jovens de 15 anos não conseguem fazer contas simples de conversão de moedas ou comparar distâncias ao fazer percursos diferentes.
Para Marcelo Viana, diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) e vencedor do Grande Prêmio Científico Louis D., o principal desafio para o ensino de matemática na educação básica é a formação de professores e a falta de valorização da categoria. “A formação do professor, no Brasil, é deficiente de um modo geral. Além disso, somos um país com uma grande heterogeneidade, e com injustiças sociais extraordinárias, que criam uma dificuldade adicional. Dentro desse processo, a matemática leva uma surra maior do que outras matérias porque, para avançar no entendimento da matemática, é preciso compreender bem as bases anteriores. Por exemplo, para aprender multiplicação, é preciso saber somar”, diz o pesquisador. Viana participou da mais recente edição do Prato do Dia, o podcast da Assessoria de Comunicação e Imprensa da Unesp, para falar sobre o universo da matemática.
Apesar das dificuldades, o matemático se mantém otimista a respeito do cenário da popularização da matemática para as futuras gerações. Um exemplo, é o sucesso da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP), projeto realizado anualmente pelo IMPA que tem como objetivo estimular o estudo da matemática a nível nacional e contribuir para a melhoria da qualidade da educação básica. “O foco não é descobrir quem é o melhor. É falar sobre matemática, resolver os problemas, nos divertir com a matemática”, explica o diretor.
Considerada a maior olimpíada científica do país, a OBMEP registrou a participação de 18,5 milhões de estudantes do 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º do Ensino Médio em 2024. Neste ano, a Olimpíada completa 20 anos de existência e serão entregues 8.450 medalhas por todo país, além de 51 mil certificados de menção honrosa. Visando envolver os jovens estudantes no mundo da matemática, os premiados também são convidados a participar do Programa de Iniciação Científica Jr (PIC) como incentivo ao desenvolvimento acadêmico.
Apesar do gargalo no ensino, o cenário da pesquisa em matemática no Brasil segue um rumo completamente oposto. Atualmente, o país é considerado uma potência mundial na produção de conhecimento na área. Essa reputação é consequência de gerações de pesquisadores que, desde meados de 1934, com a criação da Universidade de São Paulo e, depois, em 1952, com a criação do IMPA, dedicaram esforços para construir bases sólidas de rigor científico dentro do campo. “Tínhamos essas lideranças que marcaram o caminho, que tinham a visão de onde queriam chegar e que foram absolutamente intransigentes quanto à qualidade”, conta Viana
Como resultado, em 2016, pesquisadores no Brasil chegaram a publicar 2.073 artigos, o equivalente a 2,4% da produção mundial. O país também conta com um vencedor da famosa medalha Fields, que é considerada o Nobel dos matemáticos. O responsável pelo feito foi Artur Ávila, agraciado em 2014. Dentro desse contexto de efervescência acadêmica, Viana foi um dos responsáveis por solicitar a entrada do Brasil no grupo 5 da União Matemática Internacional. Considerado o grupo de elite da matemática internacional, o Brasil entrou para a lista de selecionados em 2018 e divide a posição com países como Alemanha, China, Estados Unidos, Japão, Reino Unido, Rússia, entre outros.
Entretanto, a permanência no grupo demanda trabalho constante: “É preciso continuar, o tempo todo, justificando porque ainda somos um país do grupo 5. E isso precisa aparecer de várias formas. Não vou dizer para vocês que nós estamos ganhando de goleada em tudo, porque não estamos. As dificuldades que todos nós enfrentamos são os desafios da ciência brasileira vividos nos últimos anos”, afirma o diretor.
Ouça a entrevista completa com Marcelo Viana no podcast Prato do Dia, disponível nas principais plataformas de áudio e no player abaixo.