Brasil irá se tornar membro-associado do mais importante laboratório internacional da física de partículas

Declaração do Itamaraty assinala desejo de completar processo de adesão ao CERN, que se arrasta há 14 anos. Colaborador de pesquisas desenvolvidas na instituição europeia, físico Sérgio Novaes diz que caberá à comunidade científica brasileira se mobilizar para aproveitar as oportunidades que decorrem do novo status.

O Itamaraty em fins de janeiro informou à direção da Organização Europeia para Pesquisa Nuclear (CERN, na sigla em francês), sediado em Genebra, na Suíça, que o governo brasileiro irá concluir a tempo os procedimentos burocráticos necessários para que o país possa tornar-se membro-associado do laboratório. A associação começou a ser negociada ainda em 2012. Ano passado, a direção do CERN havia comunicado ao  governo brasileiro que o mês de março de 2024 constituiria a data limite para a conclusão dos procedimentos burocráticos, caso contrário a candidatura não seria mais considerada. Embora a aprovação de dois acordos internacionais necessários para efetivar a adesão tenha ocorrido no Senado e na Câmara dos Deputados ainda no fim de 2023, ainda falta a promulgação da Presidência da República.

O CERN é mundialmente famoso por abrigar o maior acelerador de partículas do mundo, o Large Hadron Collider. Desde 2006 o Brasil possui um acordo de colaboração com o laboratório, e diversos pesquisadores brasileiros colaboram com experimentos conduzidos no acelerador.

Professor do Instituto de Física Teórica da Unesp, o físico Sérgio Novaes participou da primeira comissão responsável pelo processo de adesão. Ele também está à frente do São Paulo Research and Annalysis Center (SPRACE), centro de pesquisa que conduz o processamento de parte dos dados gerados nos experimentos do LHC. Em entrevista à Rádio Unesp, ele analisou as possibilidades que podem surgir a partir da nova condição de país-membro, pela qual o governo brasileiro pagará anualmente  US$ 12 milhões.

“Diria que, do ponto de vista da pesquisa, a condição de membro associado não implicará muitas mudanças”, diz. Ele explica que todos os dados gerados pelo acelerador já são livremente compartilhados entre os pesquisadores de diversos países e instituições, “de Harvard à Unesp”, que colaboram nos experimentos. “Mas o trabalho que é feito a partir dos dados recebidos depende da competência de cada grupo”, diz.

Mas, para além da colaboração científica, o Brasil passará a ter o direito de participar das licitações para aquisição do material necessário para manter ativo o gigantesco LHC, que tem 27 km de circunferência, o que inclui a possibilidade de oferecer equipamentos, softwares etc. A participação nestas licitações  pode ajudar no desenvolvimento da indústria de alta tecnologia no Brasil, além de abrir caminhos para a transferência de expertise para nosso país.

“Por meio desses contratos de licitações, há até a possibilidade de que o Brasil recupere os US$ 12 milhões que paga pela condição de membro-associado”, diz Novaes. Esse cenário favorável, porém, só poderá vir a se concretizar se os gestores de ciência e tecnologia do país, bem como os empresários, demostrarem iniciativa. Essa proatividade é essencial para identificar quais as demandas de produtos e serviços que o CERN apresenta hoje, um quadro bastante variado que vai desde obras de engenharia civil envolvendo a construção de túneis até a produção de componentes eletrônicos. O passo a seguir envolverá facilitar a aproximação das empresas brasileiras com a Instituição europeia. “Será preciso gerenciar tudo isso. Porém, se nada for feito, o país ficará apenas como espectador, e não obterá nenhum outro benefício”, diz.

Para escutar a íntegra da entrevista com o físico Sérgio Novaes à Rádio Unesp, clique aqui.

Imagem acima: a Esplanade des Particules, no CERN, onde ficam as bandeiras dos países que são membros da organização. Crédito: Brien Maximillien, 2018, CERN.