A chegada de novas tecnologias têm causado grandes impactos sobre as relações de trabalho. A experiência de entregadores e motoristas de aplicativo ajuda a reforçar uma impressão, geral e difusa, de que esses impactos são basicamente negativos, uma vez que para estas categorias a mudança implicou redução de direitos e um aumento na jornada de trabalho, que não se traduziu, necessariamente, em melhor remuneração.
Não à toa, em seu discurso no dia 1o de maio, uma data simbólica para a defesa do direito dos trabalhadores, o presidente Lula prometeu regulamentar o trabalho por aplicativo e criou um grupo formado por integrantes de diferentes ministérios, sindicatos e representantes dos empregadores para discutir o tema.
A discussão sobre como aproveitar e valorizar as oportunidades de trabalho que surgem a partir das inovações tecnológicas está na ordem do dia, e para abordar esse tema o podcast Prato do Dia convidou o jornalista Carlos Juliano Barros. A proposta é entender as possibilidades que estão na mesa para que este formato de trabalho que está se criando no século 21 seja mais justo. Coordenador de jornalismo da ONG Repórter Brasil e titular de uma coluna no portal UOL, na qual tem abordado diversas questões relacionadas ao trabalho, Barros dirigiu, em 2019, o documentário “GIG, a uberização do trabalho”, em que discute o crescimento mundial do trabalho mediado por aplicativos.
Barroos entende que vivemos um período de impasse, que se reflete, no mundo do trabalho, na forma de uma série de questões ainda a serem resolvidas. Se historicamente a proteção ao trabalho foi baseada em um modelo de jornadas, hoje em dia grande parte dessas plataformas digitais praticam a remuneração por produtividade ou por metas, o que tem gerado consequências problemáticas na intensificação, precarização e insegurança no trabalho. O impasse reside na maneira de equilibrar esses dois modelos.
“A pessoas podem achar justo que quem trabalhe mais ganhe mais. Mas, por outro lado, elas também querem um pouco de estabilidade, previsibilidade e garantia. Então como equacionar essa questão de uma remuneração que pode gerar uma produtividade maior com uma remuneração que vai te dar o mínimo de estabilidade? O problema é que hoje essa equação está muito desigual”, diz o jornalista, usando como exemplo os vários riscos assumidos pelos trabalhadores de aplicativos em comparação com as poucas garantias oferecidas pelo Estado ou pelas empresas.
Na avaliação do entrevistado, o debate em torno dos empregos mediados por plataformas digitais está no momento de repactuação da relação de trabalho com as empresas. “Toda a discussão de regulamentação do trabalho, que ocorre no mundo todo e não apenas no Brasil, parte da ideia de como podemos garantir o mínimo de segurança para esses trabalhadores.”
O rápido desenvolvimento de ferramentas de Inteligência Artificial, e o receio de que a tecnologia possa absorver muitos postos de trabalho, foi outro ponto debatido no programa. Barros pensa que muitos economistas têm mostrado preocupação com o que vem sendo chamado de “polarização do mercado de trabalho”, isto é, um cenário em que a força de trabalho fique dividida entre dois grupos: uma minoria com empregos criativos, de qualidade e bem remunerados, e uma maioria esmagadora de indivíduos empregados em funções precarizadas, de baixa remuneração e pouco valorizadas. “A tecnologia vai substituir alguns postos de trabalho. Mas outros vão surgir a partir de novas demandas. A questão é: essas novas demandas serão devidamente remuneradas e protegidas como trabalhos dignos?”, questiona. A conversa ainda tratou de possíveis propostas de regulamentação que já foram sondadas e colocou o ponto de vista das plataformas sobre este processo.
A íntegra desta edição do Prato do Dia, disponível na mídia abaixo, pode ser ouvida também na plataforma Podcast Unesp, bem como nos tocadores Google Podcasts, Spotify e Deezer.