Nessa quinta-feira, 6, a Academia Sueca anunciou o nome da escritora francesa Annie Ernaux, 82, como vencedora do Prêmio Nobel de Literatura de 2022. De acordo com o anúncio oficial, a escolha por premiar Ernaux se deveu à “coragem e acuidade clínica com a qual ela descobre as raízes, estranhamentos e limitações coletivas de sua memória pessoal”. Ela é a 17ª mulher a receber a premiação.
Nascida em 1940, Annie Ernaux exerceu durante longos anos a profissão de professora de francês, mas nunca deixou de lado a escrita. Publicou a primeira obra em 1974, e desde então escreveu mais de 20 livros. Seus livros têm um público fiel dentro e fora da França, e em seu país alcançam boas vendas. Ela começou escrevendo ficção, mas logo passou a abordar temas autobiográficos. Seus livros, porém, são contados sob uma perspectiva que lhe permite também abordar a história de sua sociedade e de seu tempo.
Maria Cláudia Rodrigues Alves, que é professora do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Extadas da Unesp, câmpus de São José do Rio Preto, e especialista em língua e literatura da França, diz que Ernaux sempre fez questão de deixar claro que narrava a própria história em boa parte das suas obras. É o caso de O Acontecimento, lançado em 2000, e que foi um best-seller. A protagonista do livro relata sua experiência ao realizar um aborto na França nos anos 1960, quando o procedimento ainda não era legalizado no país, e mostra sua oscilação entre o desespero e o alívio. “Em entrevistas, ela não deixa dúvidas de que é a protagonista”, diz.
Ernaux escreve em uma prosa simples, com linguagem direta e vocabulário acessível. A docente da Unesp explica que isso a distingue dos últimos escritores franceses premiados com o Nobel de Literatura, Jean-Marie Gustave Le Clézio (2008) e o chinês exilado na França Gao Xingjian (2000), que assumiam uma vertente mais política e que vinham do movimento do Nouveau Roman, dos anos 1950, famoso por sua complexidade. Maria Cláudia Alves situa a obra de Ernaux na tradição de prosa histórica e memorialista da literatura francesa. “É para que não haja retrocesso nos direitos civis adquiridos legalmente. O que a Annie faz é um convite à reflexão a partir de sua história pessoal”, explica.
A professora também destaca a decisão da Academia Sueca de finalmente atribuir a láurea a uma mulher francesa, uma vez que a escolha de um autor francês ocorreu ainda em 1901, na primeira edição do prêmio. A partir dos anos 1990, a Academia Sueca passou a receber acusações de eurocentrismo, que se manifestaria na escolha de laureados que eram em sua maioria homens, europeus e brancos. Desde 2001, outras sete mulheres foram premiadas: Elfriede Jelinek (2004), Doris Lessing (2007), Herta Müller (2009), Alice Munro (2013),Svetlana Alexievich (2015), Olga Tokarczuk (2018), Louise Glück (2020).